Venezuela. Oposição desconjuntada leva o Prémio Sakharov

Parlamento Europeu atribuiu o prestigiado galardão aos opositores de Maduro, numa altura em que os vários partidos que compõem a MUD acusam sinais de desgaste e ameaçam virar costas

A oposição democrática venezuelana recebeu esta quinta-feira um valoroso apoio no seu combate político a Nicolás Maduro, ao ser agraciada pelo Parlamento Europeu com o Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento 2017. Antonio Tajani, presidente daquela instituição europeia, com sede em Estrasburgo, justificou a escolha dos representantes da Mesa da Unidade Democrática (MUD) – a coligação política opositora do oficialismo e detentora da maioria na Assembleia Nacional –, e de presos políticos, como Leopoldo López, Daniel Ceballos ou Antonio Ledezma, em virtude da sua ação na “luta de uma nação pela liberdade e pela transição pacífica para a democracia, que o povo venezuelano pede desesperadamente”.

Dois anos depois de ter sido finalista do Prémio Sakharov – o vencedor da edição de 2015 foi o blogger e ativista saudita Raif Badawi –, a oposição da Venezuela foi distinguida com o prestigiado galardão por iniciativa dos grupos parlamentares do Partido Popular Europeu e da Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa. Mais do que os 50 mil euros previstos pela sua atribuição, a apetibilidade do prémio está naturalmente no amparo da União Europeia à causa da MUD. Tanto é que o Parlamento Europeu aproveitou a divulgação do galardoado desde ano, para reiterar o seu “apoio total” à oposição a Maduro, pedir a libertação dos preços políticos, apelar por um corredor humanitário para “aliviar o sofrimento da população” e reafirmar a sua posição de dissonância para com a instituição da Assembleia Constituinte (ANC), composta por apoiantes do regime, que arrebatou o poder legislativo à Assembleia Nacional – as eleições realizadas em julho para a nova instituição foram consideradas ilegais e boicotadas pela MUD.

O respaldo europeu chega, no entanto, numa altura em que a MUD atravessa um verdadeiro tumulto interno. Nas vésperas das eleições regionais do passado dia 17, os seus dirigentes garantiram que, em caso de eleição, nenhum dos governadores da oposição iria prestar juramento junto da ANC, como pretendido por Nicolás Maduro, mas as ordens da cúpula da MUD foram ignoradas por quatro dos cinco eleitos. 

Ramón Guevara, Alfredo Díaz, Antonio Barreto Sira e Laidy Gómez, todos do partido Ação Democrática (AD), tomaram posse na passada segunda-feira, depois de jurarem na ANC – Juan Pablo Guanipa recusou-se a fazê-lo e foi destituído, esta quinta-feira à tarde, do cargo para o qual foi eleito –, e espoletaram protestos dentro dos restantes partidos da coligação opositora, que estão agora dispostos a repensar a estratégia de ataque às eleições presidenciais de 2018. A Vontade Popular (VP), de Leopoldo López, acusou a AD de ter levado a cabo um ato de “traição e engano” e Henrique Capriles, do Primeiro Justiça, sugeriu a formação de uma “nova unidade”, exortando a MUD a “tomar decisões” e a “extrair o tumor”.

A AD é um dos mais antigos partidos opositores ao chavismo na Venezuela e o seu líder, Henry Ramos Allup, nunca escondeu o desejo de se apresentar às eleições do próximo ano, como candidato presidencial. Uma eventual falta de apoio do resto dos partidos a esse desejo de Ramos ou a apresentação de mais do que um candidato da oposição à liderança da Venezuela – Capriles também está de olho em 2018 –, reduziria substancialmente as hipóteses de sucesso contra Maduro. 

Para já a única certeza é a de que a revolta da AD está a fazer abanar os alicerces da MUD e nem o apoio da UE à sua causa pode ajudar a contribuir para estabilizar a coligação. “Temos que perceber que a realidade mudou e que a MUD tem de se adaptar a essa nova realidade”, constatou Freddy Guevara, da VP.