Posição do governo português sobre a Catalunha foi ditada por Madrid

Bélgica oferece asilo político a Puigdemont e o parlamento finlandês ameaça reconhecer a Catalunha

O governo espanhol enviou um formulário aos seus congéneres da União Europeia para que respondessem em determinados termos, usando a mesma argumentação que legitima a intervenção de Madrid na Catalunha. A revelação foi feita pelo correspondente em Bruxelas da televisão alemã ARD, Markus Preiss.

A nota do governo espanhol aos seus aliados, e ao governo português, diria o seguinte: 

“Enviaremos uma curta nota sobre a Declaração Unilateral de Independência, que acaba de ser aprovada por ‘70 representantes do povo’ no parlamento regional catalão, numa votação secreta, sem a presença da oposição. Uma clara tomada de posição, tão rápido quanto possível, seria muito bem-vinda e ajudaria muito. Aqui têm os pontos que pedimos que incluam num posicionamento curto e claro.

1. (Nome do país) não reconhece e não reconhecerá de nenhuma maneira a declaração unilateral e ilegal que se aprovou hoje no parlamento regional catalão.

2. Condenamos como violação flagrante do Estado de direito, da democracia e da Constituição espanhola, que é uma parte do marco legal europeu.

3. Temos confiança no governo espanhol e nas suas instituições democráticas para restaurar o Estado de direito e a ordem constitucional, para garantir as liberdade e os direitos de todos os cidadãos.”
Lendo a posição oficial do governo português, expressa em comunicado, parece que foi ditada diretamente por Madrid, com poucas alterações de vírgulas e tendo o cuidado de especificar no início, como lhe pediam, o país do governo que escreve.

“Comunicado do governo português sobre a ‘Declaração Unilateral de Independência’ no parlamento da Catalunha:
 O governo português não reconhece a declaração unilateral de independência hoje anunciada no parlamento regional da Catalunha. 

Portugal condena a quebra da ordem constitucional e o ataque ao Estado de direito em Espanha – parte integrante do quadro jurídico da União Europeia – que este ato configura. 

O governo português confia que as instituições democráticas espanholas saberão restaurar o Estado de direito e a ordem constitucional, quadro natural do diálogo democrático, a fim de preservar os direitos e liberdades de todos os seus cidadãos e garantir que seja encontrada a melhor solução para preservar a unidade de Espanha.”

Bélgica oferece asilo Por sua vez, a Bélgica, que chegou a considerar, segundo declarações do seu primeiro-ministro, Charles Michel, mediar o conflito entre o governo catalão e Madrid, ofereceu asilo político ao presidente da Generalitat, Carles Puigdemont. O ministro belga da Imigração, Theo Francken, declarou no domingo que o seu país poderia conceder asilo político ao presidente catalão, se ele assim o solicitasse, perante a perspetiva de “que não tivesse um julgamento justo” e no caso de ser detido, depois da proclamação unilateral da independência da Catalunha. “Claro que isso nos colocaria perante uma situação diplomática difícil com o governo espanhol”, referiu, mas “essa opção teria de ser seriamente examinada, caso “estivesse em causa uma pena de prisão. Nesse caso teria de ser analisado até que ponto este julgamento [a Puigdemont] tinha garantias de que seria justo”, concluiu o ministro belga.

A Bélgica não é o único país da Europa em que a frente de apoio às posições do governo de Madrid pode não reunir consenso total. Na Finlândia, o parlamento vai votar nos próximos dias uma moção, apresentada pelo deputado do Partido do Centro da Finlândia, Karna Mikko, para que o país nórdico reconheça formalmente o governo da Catalunha. 
O governo regional escocês, por seu lado, também afirmou uma posição diferente da do Reino Unido, que apoiou as decisões de Madrid. A secretária dos Assuntos Exteriores da Escócia, Fiona Hyslop, disse na sexta-feira passada que compreendia a oposição do governo espanhol à declaração de independência da Catalunha, mas que o povo catalão tinha o direito a escolher o seu próprio futuro. E criticou o governo de Mariano Rajoy por ter-se negado a inúmeros pedidos de diálogo por parte das autoridades catalãs. 

A nível internacional, para além da posição de apoio da quase generalidade dos governos dos países da União Europeia, Rajoy também pode contar com o firme apoio de Donald Trump, que disse mais uma vez que “a Catalunha faz parte de Espanha”.

A Rússia, por seu turno, sublinhou apenas a sua preocupação com o agudizar do conflito na região.

A conspiração de Moscovo

O “El País”, garantiu, há uns meses, que a Rússia conspirava para dividir a Espanha e que tinha usado meios informáticos, hackers e recursos nas redes sociais para ajudar os independentistas a organizar o referendo inconstitucional. No fim desta semana, uma estação de televisão espanhola acrescentou mais argumentos sobre essa conspiração e juntou imagens de um comentário na televisão russa Russia Today em que um alegado comentador oficial russo defendia a independência da Catalunha. Acontece que o comentador usado como prova da conspiração é um jornalista português. “Ontem, imediatamente a seguir à declaração da independência da Catalunha, comentei em direto no canal russo RT sobre a proclamação daquela república. Fiquei a saber que o canal espanhol Telecinco transmitiu parte da minha análise como prova de que a Rússia está a interferir nos assuntos internos de Espanha e a alimentar o separatismo. Agora, duas novidades bombásticas. A primeira é que não sou russo e, infelizmente, nunca estive na Rússia. E a segunda é que um canal estrangeiro que dê diferentes versões da única que a imprensa espanhola insiste em dar não significa que o seu governo esteja a imiscuir-se em coisa alguma”, comentou o jornalista Bruno Carvalho no seu mural de Facebook. 

Em atualização.