De soslaio

A partir de agora tudo será bem diferente na sede do poder

Acreditem que a palavra ‘soslaio’ é porventura, nestes dias e entre nós, uma palavra triunfante.

E mesmo para lá do Guadiana, entre Madrid e Barcelona, se joga muito de uma necessária diferente Espanha… de soslaio. Ou, em Londres, o Brexit já se pensa de soslaio.

Olhamos para a vida mas, em alguns aspetos, olhamos de soslaio. De soslaio vê-se sem ser visto, sente-se sem ser sentido e guarda-se sem ser guardado.

De soslaio parece que queremos ouvir e sentir muito, e olhar outro tanto de soslaio. De soslaio olhamos para a calma e cooperação ditas institucionais que, num ápice, se desvanecem.

E aqueles múltiplos instantes em que, juntos, subiam montanhas, ou caíam quase juntos em precipícios leves, ou atravessavam juntos os curtos desertos, ou viviam momentos resplandecentes de alegria dita contagiante, ou segundos reconfortantes de chuva, mesmo que miudinha, desapareceram numa manhã de nevoeiro em Lisboa e com o anticiclone dos Açores a delimitar e controlar, na distância, as necessárias tensões pessoais. A partir de agora tudo será bem diferente. Na sede do poder.

De soslaio olhamos, ainda, para a composição formal – e informal! – de alianças autárquicas e percebemos, de Almada a Matosinhos – e outros lugares e territórios… – que as cores e as dores de ontem levam, à força de uma governabilidade efetiva, pretéritas tempestades a amainar rápida e subtilmente. Diríamos, a amainar de soslaio…

E assim muito se faz, se constrói – e se destrói… – de soslaio. De lado, de esguelha, de través, obliquamente, sorrateiramente. Como nos ensina, e bem, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa.

Olhar de soslaio, neste antecipado Verão de São Martinho, é necessário.

Mas abrimos a janela e, olhando de frente, de frente mesmo, sentimos o vento que sopra – e que quase sempre nos abraçou e consolou – e pressentimos emoção e dor, injustiças e uma vontade de vida.

Mesmo com memórias que nos perturbam e abalam.

E com tanto pedacinho fragmentado percebemos, agora, o silêncio de gritos até há bem pouco tempo amordaçados e de outros a partir de agora bem libertos. Escancaradamente libertos. E depois, quase de soslaio, somos despertados de novo para um canto de uma notícia, um toque ou uma mensagem. Ampliadas, logo, para as apetecidas redes sociais.

E de soslaio percebemos bem que a política, dura e crua, está de volta. Antes do debate do Orçamento do Estado para 2018. E com a perceção de um tempo eleitoral antecipado. Que alguns, de soslaio, aspiram com alguma urgência e outros, também de soslaio, desejam para além do Domingo de Páscoa de 2018. Que em 2018 se celebra a 1 de abril…!