Uma Cidade Sustentável…

A problemática da sustentabilidade na qualidade ambiental e urbana das nossas cidades, apresenta-se como tarefa prioritária para todos aqueles que direta ou indiretamente, estão ligados à sua governança. No sentido de contribuírem para a construção de um território urbano mais sólido, mais integrado na malha consolidada, mais qualificado e sustentável nos usos e nas práticas…

O espaço urbano nacional aparece-nos como uma estrutura territorial fragmentada, dispersa, insólita e desajustada dos critérios da sustentabilidade social, económica e ambiental. Encontramo-nos, assim, perante um espaço fortemente estilhaçado e fragmentado, consequência de uma política urbana que promoveu a cidade extensiva, difusa e em corredor de baixa densidade bem ao gosto da especulação imobiliária e do rentismo liberal, que viu aqui uma oportunidade de negócio, para especular em cima de solo não urbano (RAN, REN) e pouco ou nada infraestruturado.

Paralelamente a cidade também passa por um fenómeno de deslocalização e de desterritorialização de equipamentos (fabricas, habitação, ensino – polos universitários, hospitais, comércio, entre outros), de bens e de pessoas que vão ocupar os espaços da cidade periférica instalada em contextos urbanos difusos e sem grandes acessibilidades ou mobilidades.

Como primeira consequência, a valorização dos solos que passam de rural para urbano, que recebem as primeiras infraestruturas públicas, abrindo caminho a um rentismo financeiro privado de capitais globalizados e fortemente especulativos, que vem condicionar e quase sempre desequilibrar a lei da oferta e da procura de solo urbano, criando uma oferta artificial e insustentável de vida para uma juventude que se queria autonomizar da casa familiar, bem como à procura do emprego que também se desloca para os territórios de baixa densidade, onde se instalam os grandes centros comerciais e as novas industrias.

A cidade histórica, densa e consolidada é substituída pela cidade nova e periférica, plantada nos não-lugares das periferias metropolitanas. Estávamos perante a cidade das redes, dos nós, dos IC’s, das conexões, das tramas, dos eixos, dos tubos, das estações, das mobilidades egoístas centradas no transporte privado economicamente insustentável e socialmente injusto porque segregou e atomizou o mundo social.

Claro que a especulação e a hipervalorização do solo conduziu a gestão do território em função das mais-valias rentistas, desvalorizando as boas práticas de uma gestão urbanística que fosse capaz de promover e defender o direito à cidade e à habitação para todos sem exceção.

Um conjunto de programas e de obras que vão transformar a cidade de forma profunda em termos de imagem e de desenho urbano, resolvendo problemas estruturais de mobilidade, requalificando o espaço público das ruas e das praças que se encontravam em estado avançado de ruína. A requalificação e a transformação da imagem da cidade do centro, veio agravar ainda mais o fosso entre a cidade de dentro e a cidade de fora, a cidade densa e qualificada e a cidade dispersa e sem infraestrutura pública.

Assistimos, nestas décadas à implementação de uma política de grandes equipamentos públicos, estruturas pesadas, que fazem a hipervalorização da cidade canónica integrada em narrativas patrimoniais com a valorização dessas zonas com a deslocalização dos moradores por causa da subida exorbitante das rendas cobradas, consequência linear da pressão da economia do turismo de alojamento local.

A transformação dos usos do solo e a respetiva mercantilização da estrutura urbana, transformou rapidamente a cidade num objeto de consumo em resultado das fórmulas urbanísticas implementadas, o que não perspetiva um futuro risonho. A construção das ‘cidades efémeras’ aparece na sequência da utopia da cidade industrial, considerada como modelo de progresso linear ao serviço de um capitalismo neoliberal financista e desregulado.

Por outro lado, a crença na deusa máquina e na industrialização ao serviço das Cidades Novas e do Homem Novo, muito à imagem da cidade moderna de raiz funcionalista conduziu a cidade para a sua fragmentação e atomização, com o aparecimento de espaços homogéneos, redutores, monofuncionais e segregadores da vida económica, social e política. Na raiz deste funcionalismo urbano moderno também vamos encontrar uma vontade explícita de inovação radical, que recusa em absoluto qualquer relação com a cidade histórica e consolidada.

Fernando Matos Rodrigues Antropólogo. Investigador no CICS. Nova e Director do Lahb)