Alemanha. Última chamada para um acordo de governo?

Falhado o primeiro prazo definido para chegarem a um compromisso preliminar de coligação, CDU, CSU, FDP e Verdes têm até ao fim da tarde deste domingo para mostrar aos alemães que a solução ‘Jamaica’ tem pés para andar. Cenário de eleições antecipadas, em caso de insucesso nas conversas, é real

Com uma economia favorável, uma taxa de desemprego diminuta e níveis de crescimento interessantes, a Alemanha não pode ser propriamente catalogada como um caso preocupante no seio do clube europeu. Mas por estes dias o ar que ali se respira está envolto numa invulgar nuvem de ansiedade.

É que a racional e pragmática Angela Merkel, mulher de consensos, responsável máxima pela chancelaria alemã desde 2005, e única sobrevivente política do tormento da austeridade nos principais países da União Europeia, falhou o prazo estipulado para a apresentação de um acordo preliminar de governo, na sequência dos resultados das eleições federais de setembro, que não lhe deram uma maioria (32,9% dos votos) e a obrigaram a negociar com o Partido Liberal Democrata (FDP, na sigla em alemão) (10,7%) e os Verdes (8,9%) uma solução inédita.

Falhada a referida meta da passada sexta-feira, União Democrata-Cristã (CDU), União Social-Cristã (CSU) – “irmã” da CDU na Baviera –, liberais e ecologistas definiram as 18h00 (menos uma hora em Portugal Continental) deste domingo como novo prazo para o anúncio de um acordo para a formação da chamada coligação “Jamaica” – assim rotulada na Alemanha pelas semelhanças entre a combinação das cores dos partidos e a bandeira daquele país caribenho –, tendo deixado o país novamente em suspenso.

Para adensar as dúvidas, sabe-se que os obstáculos que os separam desse objetivo continuam a ser imensos – na sexta-feira Wolfgang Kubicki, do FDP, admitia mesmo, citado pelo Politico, que tinham apenas discutido dois dos 100 pontos na agenda, e tinham ficado “bloqueados no terceiro”.

Com os olhos postos nas eleições regionais na Baviera, no próximo ano, a CSU não abdica de reivindicar a redução massiva de refugiados – com receio de perder votos para a extrema-direita –, ao passo que o FDP torce o nariz ao plano alemão atual de tributação e às reformas que Merkel e Emmanuel Macron pretendem levar a cabo na zona euro, com a criação de um Fundo Monetário Europeu. Já os Verdes agarram-se com unhas e dentes ao aprofundamento dos mecanismos de solidariedade europeus e ao investimento em inovação social e tecnológica ecológica, dentro e fora da Alemanha.

Descartada a hipótese da renovação de uma coligação entre CDU/CSU e o Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) (20,5%) – Martin Schulz quer recuperar o partido, reforçando o seu papel como principal força opositora – e face à entrada em rompante dos nacionalistas da Alternativa para a Alemanha (AfD) (12,6%) no Bundestag, a solução mais evidente para Merkel é mesmo a coligação “Jamaica”. Ou isso ou governar sem maioria – algo inédito na História recente alemã.

A imprevisibilidade é, por esta altura, tão grande, que há quem comece a pensar seriamente em eleições antecipadas, caso não haja fumo branco este domingo. “O resultado eleitoral foi uma surpresa para os alemães, uma vez que estão acostumados a cenários previsíveis. E, com Merkel, estão habituados a consensos”, explica-nos a correspondente do “Die Ziet” em Berlim, Petra Pinzler. “Um cenário de novas eleições seria imprevisível, mas pode vir a ser real em caso de um não acordo”, acrescenta.

Visão semelhante é partilhada por Leon Stebe, da Inforadio RBB, que também estranha a falta de certezas em todo o processo pós-eleitoral e não toma por garantida a apresentação de um acordo entre CDU, CSU, FDP e Verdes. “Não apostaria [num acordo]. Neste momento as hipóteses de ser alcançado são inferiores a 50%”, adianta.

O cenário de novas eleições pode vir a ser problemático para qualquer um dos partidos do sistema. Não chegando a acordo, estariam a enviar aos eleitores desagradados com o establishment alemão uma mensagem clara de incapacidade de convergir ideias e encontrar uma solução útil para o país, mesmo que isso significasse terem de abdicar de algumas proposições.

A extrema-direita agradeceria seguramente.