Peço desculpa, mas ainda não há Orçamento

Por entre ruínas fumegantes e bactérias assassinas, uma boa notícia nascia para dar ânimo ao Governo. Afinal, o Orçamento tinha sido aprovado na generalidade.

Estavam afastados os fantasmas.

É certo que um dos ministros em foco havia sido obrigado a constatar o desgraçado país desequilibrado que temos e a diferença entre a presença e o abandono do Estado.

E, antes que fosse tarde, entendeu pedir desculpa aos portugueses pela falha do setor do qual é responsável.

Na memória lhe ficara a dificuldade em alguém arrancar a resposta ao mesmo pedido da parte do primeiro-ministro.

Mas, ao mesmo tempo, percebeu como tudo ficaria mais calmo depois desse grande pequeno esforço.

Afinal, a moda é uma moda educada. Os alemães pedem desculpa pelo extermínio dos judeus, os americanos pedem desculpa pelas consequências das bombas atómicas, membros de governos outros pedem desculpa pelos escândalos financeiros em que estiveram envolvidos, grandes artistas pedem desculpa pelo assédio de outros, padres pedem desculpa pelo abuso de menores.

Perdoa-me era o nome de um popular programa de televisão. É a mesma receita.

Dentro em pouco não sobra nenhum setor ou atividade.

Bastaria, talvez, que a cadeia do pedido se multiplicasse para todos estarmos em paz.

O ato de governar tornava-se muito mais simples e muito menos doloroso.

O erro apagava-se com a tolerância e a compreensão.

Mas, de repente, tudo se complicou.

Bastou que o Orçamento contivesse uma norma sobre progressões na carreira da função pública para as nuvens negras surgirem ameaçadoras.

E, mais, para recuperar a memória de outros tempos em que uma ministra tinha infligido, em nome da poupança, uma penalização sofrida a uma classe.

Ou, ainda, para descermos ao concreto, para recordar a perda da maioria absoluta do governo de Sócrates, a perda do estado de graça, o princípio do fim.

Aquele povo, ofendido, saiu à rua num dia assim e sairá sempre que lhe abram a ferida.

E agora, o ministro da Educação, que a todos surpreendeu com a declaração de compromisso reivindicativo com os professores manifestando-se como um deles, poderá sair disto com um pedido de desculpas também? Pode justificar que não pode dar o que não tem? Pode fazer uma espera ao ministro das Finanças? Pode mobilizar, de novo, a capacidade reivindicativa da mulher do Primeiro Ministro?

Não, há limites para tudo.

O ministro da Educação conclui que governar faz muito mal à saúde. Vê tudo a andar à roda. Recorre ao internamento hospitalar na véspera de um debate importante. Não é caso único na história. Muitos anos atrás, outro, da Administração Interna no caso, teve o mesmo fim.

Sucedem-se as notícias desencontradas. Uns do governo dizem que haverá faseamento, outros, do mesmo governo, recusam o seu reflexo orçamental nos anos próximos. Percebe-se. Uns são gregos e os outros troianos.

Adivinha-se neste jogo de xadrez, a jogada definitiva.

O ministro Centeno que se cuide ou ainda é obrigado a pedir desculpa.