Mudar Infarmed para Porto afeta 400 famílias

Desde o anúncio da transferência de parte da estrutura para a Invicta há funcionários a sair do Infarmed.

A mudança de 70% da estrutura do Infarmed para o Porto ­– como é intenção do governo – tem impacto em 400 famílias e pode ameaçar o balão de oxigénio das verbas injetadas pela autoridade do medicamento no orçamento da Saúde. E além da fuga de funcionários especializados e do risco financeiro, em última instância, esta medida pode trazer ainda “dificuldades” no acesso a medicamentos por parte dos doentes.

Estas são algumas das conclusões do relatório elaborado pela comissão de trabalhadores da autoridade do medicamento, que avalia os riscos da mudança para a Invicta – documento que foi ontem entregue ao ministro da Saúde, a quem os funcionários pedem uma reunião para discutir o impacto da medida e para pedir uma “clarificação” sobre o futuro do Infarmed.

 A saída de funcionários da autoridade do medicamento, “risco que foi agravado pelo anúncio de relocalização” do Infarmed, já está, aliás, a ter efeitos. Na última semana, desde que foi anunciada a intenção de Adalberto Campos Fernandes, o i sabe que vários funcionários do Infarmed estão a aceitar propostas de trabalho na indústria farmacêutica e a concorrer a cargos noutras entidades públicas de saúde, como é o caso da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS).

No relatório lê-se que a mudança do Infarmed para o Porto “tem um impacto direto na vida de 400 famílias estabelecidas na zona de Lisboa, perfeitamente integradas em termos de rede escolar”. A este impacto social para os funcionários ­ – para quem é necessária uma formação inicial de entre três e cinco anos – soma-se ainda uma despesa de três milhões de euros anuais para “ajudas de custo diárias”. Fora desta contabilização estão as indemnizações que serão pedidas por 91% dos trabalhadores, que já fizeram saber não estarem disponíveis para se mudarem para o Porto.

 

Impacto financeiro

Quanto ao risco financeiro, o documento salienta que o Infarmed gera resultados líquidos anuais positivos que ascendem a 30 milhões de euros e que são injetados no orçamento global da Saúde, sendo utilizados no pagamento de dívidas a fornecedores, por exemplo. Além disso, os trabalhadores do Infarmed alertam para a “ameaça de perda total” da receita de 20 milhões de euros anuais conseguida através da avaliação de processos europeus – aviso que foi também lançado pela presidente do Infarmed, Maria do Céu Machado, em entrevista ao “Público”, anunciando que o país pode perder os processos do Reino Unido e que valeriam um encaixe de milhões de euros.

Infarmed desmente governo Tanto o primeiro-ministro como o ministro da Saúde têm vindo a dizer que a decisão de transferir parte da estrutura do Infarmed para o Porto “já estava prevista” há algum tempo. No entanto, tal como o i já tinha avançado, a presidente do Infarmed confirmou ao “Público” que a decisão foi tomada na véspera do anúncio, numa reunião entre Adalberto Campos Fernandes e António Costa. Ao Infarmed, a intenção do ministro foi comunicada na manhã do próprio dia do anúncio, tal como o i noticiou, deixando Maria do Céu Machado “incrédula”. Não foi pedido qualquer parecer prévio à comissão de trabalhadores, o que torna a decisão ilegal, de acordo com advogados ouvidos pelo i. O i pediu ontem uma reação do Ministério da Saúde às revelações feitas nesta entrevista, inclusive a indicação de que a decisão, afinal, só foi tomada na semana passada. O gabinete do ministro recusou fazer comentários.

A decisão de relocalizar o Infarmed foi anunciada um dia depois de o Porto ter sido rejeitado para acolher a Agência Europeia do medicamento (EMA na sigla inglesa). De acordo com o ministro, a transferência de 70% da estrutura será feita de forma gradual, a começar em janeiro de 2019.