Costa dá guinada à direita

António Costa dirige-se agora para o centro, onde se ganham as eleições

Marcelo Rebelo de Sousa bem avisou que o ciclo político mudava depois das eleições autárquicas.

Mudou porque os resultados fizeram cair a liderança do PSD. Mudou, também, porque o PCP sofreu uma derrota estrondosa, pondo em causa o frágil equilíbrio da ‘geringonça’.

A derrota do PSD e a subsequente mudança de líder já era expectável. Já a derrota do PCP foi maquiavelicamente antecipada apenas por dois homens: Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa.

O jornal i, numa primeira página histórica, titulava a 9 de novembro de 2015: Perestroika no PCP; e em subtítulo: Comité Central aprova por unanimidade apoio a governo PS durante quatro anos.

O título era de uma simplicidade genial. O muro intransponível de 40 anos de oposição ao Governo caía naquele dia, mudando a história constitucional do pós-25 de abril.

Vinte e três meses depois, no dia 3 de outubro, o mesmo jornal i titulava: PCP teve o pior resultado de sempre em autárquicas; e em subtítulo: Nunca tinha tido menos de 500.000 votos. Dois anos a apoiar a austeridade do Governo do PS ditou a derrota do PCP, deixando presumivelmente os dirigentes como se tivessem apanhado com os tijolos do muro em cheio na cabeça.

Ainda por cima, as derrotas não são todas iguais. Em Almada e no Barreiro, os dois bastiões comunistas perdidos, a derrota abriu as portas ao bloco central: essas duas Câmaras são agora governadas por PS e PSD, num caso pouco noticiado.

Mais: como se adivinhava, a CGTP e a Fenprof, braços armados do PCP mas que estiveram de mãos resolutamente enfiadas nos bolsos durante dois anos, voltaram a ser rígidas e reivindicativas. As greves anunciam-se umas atrás das outras: enfermeiros, médicos e professores.

Chocou, sobretudo, o tom de António Costa na resposta aos professores.

Depois de o Presidente da República ter dito na Fundação Gulbenkian, numa conferência sobre a Educação promovida pela Associação Corações com Coroa, que «é uma ilusão» pensar que podemos regressar ao tempo antes da crise, António Costa declarou no dia seguinte: «É ilusão a ideia de que é possível tudo para todos já». Já tínhamos o grito do Ipiranga na independência do Brasil, agora temos o grito de Costa para a independência da ‘geringonça’.

O grito do primeiro-ministro já estava dado, mas, como se não fosse suficiente, Costa força a mão com o espalhafato do anúncio da decisão da mudança do Infarmed para o Porto.

As palavras duras contra os professores e a ameaça ao Infarmed visam afrontar a Função Pública, base de apoio do PS e ‘linhas vermelhas’ para PCP e Bloco de Esquerda.

O Orçamento de 2018 será o último a passar com o apoio das esquerdas (passará?), mas a guinada à direita de António Costa está dada. Dirige-se agora para o centro: o sítio onde se ganham as eleições.

sofiarocha@sol.pt