António Costa não ficará na história da democracia portuguesa, exceto pelas piores razões, depois de enfiar num descartável o passado de luta do PS contra a esquerda comunista, em nome da sua sobrevivência política, juntando-se aos adversários da véspera sem estes mudarem de sítio.
De reversão em reversão, de cedência em cedência, a democracia portuguesa tem um primeiro-ministro que não governa. Foge aos problemas ‘como o diabo da cruz’, saltita de improviso em improviso, e paga com vales de compras (e o dinheiro dos contribuintes) os focus groups na Universidade de Aveiro – com figurantes contratados para simular perguntas ao Governo, e os media à trela.
Nisso, Costa aprendeu na escola de Sócrates – de quem foi acrítico seguidor -, que explorou até ao tutano o marketing político para distrair os incautos.
Ao capitular perante as exigências dos professores – o que vai contaminar toda a administração pública, num corrupio de alto a baixo -, Costa escancarou a porta ao agravamento da despesa do Estado, reconduzindo o país à via sacra da desgraça.
Se não for travado neste desvario, cairemos noutro resgate num futuro próximo. E ver-se-á, então, como fogem todos à responsabilidade, como fugiram no estertor do Governo de Sócrates, refugiando-se onde puderam.
É vê-los agora aconchegados neste Governo, como se tivessem a folha limpa, enquanto os comunistas do Bloco e do PCP mandam ‘de fora’ – uns aliados aos media, onde dispõem de ‘passadeiras vermelhas’, e outros às tropas da CGTP, que movimentam quando é preciso.
A rua voltou a ser o palco das reivindicações corporativas. E os manifestantes, com o funcionalismo público à cabeça – apesar dos privilégios imorais de que desfruta -, já perceberam que assustam o Governo e o primeiro-ministro, os quais querem que nada mexa para chegarem às eleições em ‘paz social’.
Ao moldar-se o Orçamento à vontade do funcionalismo, deita-se dinheiro à rua para aquietar as hostes e contabilizar vantagens na caça ao voto.
Bruxelas já desconfia e começou a dar sinais, embora tenha de momento outras prioridades – desde o impasse político na Alemanha ao Brexit, à Catalunha, à Turquia, e mesmo à Grécia, de que se fala menos.
A despesa pública incha todos os dias – com ajustes diretos, mais pessoal, mais promoções, e, até, mais gastos em viagens inúteis, tão ao gosto dos quadros da administração central e local – e ‘empurra-se com a barriga’ .
O PS finge que não tem nada a ver com o descalabro dos governos de Sócrates, embora lhe siga religiosamente os passos.
O caso da anunciada mudança da sede do Infarmed para o Porto é exemplar desse espetáculo errático, e ilustra na perfeição a natureza mais genuína deste Governo, que mistura trapalhice com arrogância.
Se António Costa tivesse a noção exata de como se diminui e se desautoriza nestes ziguezagues, poupava-nos à caricatura e poupava o erário público.
A sequência dos episódios deste filme é irresistível: em Junho, o primeiro-ministro lamentava, numa carta dirigida a Rui Moreira, enquanto presidente da Câmara, «não ter sido possível candidatar» o Porto à EMA – Agência Europeia do Medicamento, o que seria uma forma de «contribuir para reforçar a crescente internacionalização da cidade».
Porém, rigorosamente um mês depois, o mesmo António Costa presidia a um Conselho de Ministros e esquecia a carta, deliberando candidatar o Porto a receber a EMA. Confuso?
Para explicar a pirueta, veio à cena Adalberto Campos Fernandes, numa conversa redonda, tentando encobrir o disparate da súbita guinada para norte.
Mas faltava, ainda, uma terceira parte à farsa: conhecida a opção de Amesterdão para receber a EMA – após uma votação em que o Porto ficou em sétimo lugar e nem passou da primeira volta -, o Governo entendeu que nada melhor como ‘prémio de consolação’ do que deslocar o Infarmed para a Invicta. Resta saber se no todo ou apenas em parte.
Com a ligeireza que o caracteriza, António Costa apressou-se a encontrar um álibi. Mas saiu-lhe mal e atabalhoado. Para ele, afinal, como se nada tivesse acontecido, a deslocalização da sede do Infarmed «não tem particular novidade».
De facto, perdeu-se a novidade no desatino em que entrou António Costa, desde que se ausentou de férias enquanto Pedrógão ardia. Os incêndios ‘queimaram-no’, Tancos foi a nódoa e o Panteão o ridículo. Sobra uma política-saltimbanco e a conversa para pategos no meio do bocejo de Aveiro…