País enfrenta a primeira onda de frio do ano. Saiba por que deve preparar-se para a gripe

A manterem-se as previsões, várias zonas do país atravessam esta semana a primeira onda de frio deste fim de ano. A DGS recomendou a centros de saúde que contactem utentes mais vulneráveis, isolados ou em lares

Não é um frio inédito, mas é o suficiente para causar desconforto e preocupações de saúde. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera colocou nove distritos sob aviso amarelo por causa do frio. Paula Leitão, meteorologista do IPMA, explicou ao i que, a manterem-se as previsões, esta deverá ser a primeira onda de frio em várias zonas do país, incluindo Lisboa e Trás-os-Montes.

As ondas de frio só são decretadas a posteriori e implicam temperaturas seis dias consecutivos abaixo da média nos últimos 30 anos. É isso que sugerem as previsões, explicou Paula Leitão, acrescentando que o mesmo poderá verificar-se em Alcobaça, Alcácer do Sal, Évora e outros pontos do Alentejo. Em Lisboa, as mínimas deverão chegar esta quarta aos 3 oC, mas é em Trás-os-Montes que se espera mais frio, com os termómetros nos -6 oC. Porém, não são esperados recordes, diz Paula Leitão. “Não é nada de extraordinário: em Trás-os-Montes já se registaram -10 oC.”

Outra boa notícia é que esta vaga de frio, fenómeno por norma associado a mais complicações de saúde, terá uma duração curta. Os termómetros começaram a baixar no final da semana passada e os seis dias necessários para ser declarada uma onda de frio deverão ser atingidos quando o tempo começar a “melhorar”. A meteorologia atual está a ser causada por uma massa de ar frio de leste e, na quinta-feira, o vento roda e o território passa a ser bafejado por ares atlânticos que, além de serem mais quentes, vão trazer nebulosidade, explicou ao i a meteorologista. Assim, na quinta é esperada chuva fraca, que deverá alastrar a sexta. No fim de semana não chove, mas na segunda a chuva regressa e os termómetros sobem.

“Preparados para o pior”

A acompanhar de perto os avisos de frio está a Direção-Geral da Saúde, que reforçou os conselhos à população e este ano já tinha uma preocupação em mãos: no hemisfério sul, a época de gripe sazonal foi das piores de que há registo. Na Austrália, as notificações mais do que duplicaram, com o aumento das hospitalizações e vítimas mortais. O vírus da gripe dominante foi o A (H3N2), associado a épocas gripais mais agressivas e com uma estirpe que não coincidiu com a que foi usada para preparar a vacina disponibilizada este ano à escala mundial, ao ponto de as autoridades australianas apontarem para uma eficácia de 10%. 

Graça Freitas, diretora-geral da Saúde, sublinhou ao i que, para já, não há sinais concretos de que a gripe esteja mais agressiva na Europa, pois a atividade ainda é muito baixa. Mas a palavra de ordem é prevenir. “Estamos muito atentos este ano por causa dessa experiência do hemisfério sul e temos de estar preparados para o pior. É por isso que temos colocado tanta ênfase na vacinação: a população mais vulnerável deve vacinar-se, pelo menos tem alguma proteção”, reitera a responsável, sublinhando que, mesmo que a eficácia da vacina venha a revelar-se também baixa para os vírus em circulação no hemisfério norte, este é o melhor instrumento disponível para prevenir o contágio, mas também complicações da doença. “Temos dois milhões de vacinas. Mesmo que a eficácia não seja a melhor, qualquer eficácia é melhor que zero. Se vamos ter uma época má, as pessoas devem proteger-se e vacinar-se”, reforça Freitas. O frio agrava os receios: por um lado, porque doentes crónicos descompensam mais facilmente. E, depois, porque os vírus, não só da gripe como os diferentes vírus respiratórios, se dão melhor neste tempo. “Em semanas de maior frio há mais vírus em circulação e, por isso, mais infeções.”

Graça Freitas sublinha que é um mito a ideia de que apanhar frio “constipa”, mas o facto de o frio interferir com os mecanismos de termoregulação do organismo, com o sistema imunitário, descompensar as doenças de base e fazer com que as pessoas estejam mais concentradas em espaços fechados favorece as infeções respiratórias. Há também vários estudos que ligam o frio a mais ataques cardíacos, pois tende a contrair os vasos sanguíneos.

A responsável defende por isso que o conforto térmico, com várias camadas de roupa, é essencial. Doentes crónicos devem assegurar que chegam a esta altura do ano controlados e com medicação ajustada, procurando o médico. “Quem tem diabetes não deve chegar ao auge do frio e das viroses com a diabetes descompensada”, exemplifica. Já no caso da gripe, não deve haver receios na hora de fazer a vacina, o que por vezes ainda acontece por parte dos idosos, admite a responsável. É falsa a ideia de que dá sintomas e que as pessoas ficam constipadas. “O que acontece é que, na altura que as pessoas se vacinam, há outros vírus que causam constipações, ou então as pessoas vacinam-se mais tarde, quando já estavam a incubar uma gripe. A vacina é feita com vírus mortos; o que há é coincidências temporais.”

4500 mortes a mais no inverno passado. Pior este ano?

Na época gripal de 2016/2017, gripe e frio foram associados em Portugal a mais 4467 óbitos do que era esperado dada a mortalidade nos meses frios do ano, sempre superior à dos meses quentes. 

Freitas diz que é impossível dizer como vai correr o inverno, mas reconhece que o país ainda não lida bem com o frio. “Pensamos que não temos muito frio. Comparados com a Dinamarca, não temos, mas não temos condições para fazer face ao frio que os dinamarqueses têm. Nem nos vestimos como eles nem temos as casas, os escritórios e os transportes tão bem aquecidos.” No caso da vacina, importa reforçar a imunização entre doentes crónicos e profissionais de saúde: na época passada vacinaram–se 50% dos enfermeiros e pouco mais de 25% dos médicos.

Ontem, a DGS reforçou o apelo para que os centros de saúde contactem os utentes mais vulneráveis. “Cada local tem a sua dinâmica. Há locais onde há visita domiciliária, outros onde há boa relação com os lares, outros em que há uma colaboração estreita com a GNR”, diz Graça Freitas. 

Da parte do IPMA, também não há previsões certas a longo prazo. Invernos secos costumam ser mais frios; resta saber se a tendência do verão e do outono vai manter-se.