Tiros nos pés

Ainda atordoado com tanta cedência governamental a uma esquerda ávida de conquistas, conforme se viu no OGE 2018 – que conduzirá a um inevitável aumento de impostos –, fui confrontado com outra inusitada decisão dos trabalhadores esquerdistas da Autoeuropa, rejeitando o novo acordo que a recém-eleita Comissão de Trabalhadores celebrou com a administração.

Talvez fartos de estarem num bom emprego, em que os meses têm 30 dias ao contrário de tantas outras empresas, os trabalhadores deram um enorme tiro nos pés, colocando em risco a produção em Portugal do modelo T-ROC, que iria gerar milhares de empregos.

Defendo que as empresas não podem explorar os seus trabalhadores, abusando das suas fraquezas (o que nem era o caso), mas também não podem ficar reféns deles, pelo que antevejo tempos difíceis para uma unidade que foi modelo durante mais de 20 anos e sem greves até este Verão.

Sei que nada vai ficar como dantes – e esta deriva esquerdista vai ter consequências graves para todos nós, a começar pelos próprios envolvidos. Futuros investimentos? Jamais! Este investimento? Veremos os próximos episódios.

Como ando um bocado com o passo trocado, sou de certeza mais um dos que desconfiam que a passagem do Infarmed para o Porto foi decidida por alguém (António Costa?) sem sopesar todas as consequências, nomeadamente nas operações do próprio Instituto – apesar de o ministro da Saúde a ter assumido, afirmando-se agora disposto a revertê-la.

A perda da Agência Europeia do Medicamento estava há muito anunciada, até por razões tão simples como ter sido inicialmente escolhida Lisboa, que tem infraestruturas invejáveis – como um aeroporto bem dentro da cidade (apesar de sobrelotado…) ou uma diversidade incomparável de escolas internacionais para os filhos dos profissionais.

Se eu quisesse ser sarcástico, diria que alguém, sabendo que a derrota de Lisboa seria quase certa face ao peso de cidades eventualmente candidatas como Amesterdão, Milão ou Barcelona, se lembrou de dar um presente envenenado a Rui Moreira para ‘carregar’ a derrota, à laia de vingança do que fez a Pizarro. Mas depois da derrota sem honra, levar o Infarmed para o Porto era dar relevância inusitada à derrota, à custa de um instituto essencial para a credibilidade do setor.

Não posso deixar de escrever sobre futebol, dado que, quando julgamos que já bateu no fundo, descobrimos que afinal não tem fundo. Os seus atores dão sucessivos pontapés na credibilidade da indústria, ignorando os impactos negativos que podem ter, como a potencial perda de patrocinadores que recusem estar mergulhados neste pântano.

Este último e lamentável episódio no ‘meu Benfica’, consubstanciado na passagem de um vídeo na BTV sobre um jogo de um adversário direto (para quê?), em que posteriormente o clube reconheceu existirem imagens com «discrepâncias», foi o maior tiro no pé que alguém que almeja credibilidade poderia dar.

Ainda bem que o reconhece agora – mais vale tarde que nunca. Mas temos de voltar aos princípios, ou seja, como foi possível no canal oficial do Benfica serem passadas imagens sem ter certezas sobre a sua origem? Aquilo lá na BTV anda ‘sem rei nem roque’? Pior ainda: como foi possível haver comentadores afetos ao Benfica que nos programas televisivos subsequentes não reconheceram o óbvio, se o próprio Benfica reconheceu que as imagens contêm discrepâncias (ou seja, são deturpadas)? Mas alguém mede o impacto disto na credibilidade do clube e até nos processos judiciais em curso? Ou acreditam que um bom resultado no Dragão apaga as vergonhas, ao estilo do ‘incha, desincha e passa’? A unicidade de pensamento a tudo obriga?

 

P.S. 1 – O BCP, querendo emitir 300 milhões em dívida cotada, viu-se confrontado com as guerras no BES, nomeadamente da passagem das Obrigações Seniores 2015 para o BES ‘mau’, mediante a qual uma série de fundos estrangeiros anunciaram previamente o boicote à emissão. Por outras palavras, estamos todos na lista negra – e isto é um claro sinal das dificuldades que se avizinham, dado o financiamento dos bancos ser um tema essencial na economia.

P.S. 2 – Uma palavra final de admiração para Belmiro de Azevedo. Conheci-o de longe e nunca privei especialmente com ele, mas para além de ser um empresário na plena aceção da palavra, era um homem de hábitos frugais, como pude constatar por diversas vezes em que o encontrei, nunca se deslumbrando como tantos pelo dinheiro ou fazendo ostentação de o possuir. Em viagens de avião na Europa ia sempre em ‘económica’, ao contrário dos nossos políticos, que andam em ‘executivas’ entre Lisboa e Bruxelas, como tantas vezes constatei (honra seja feita a Passos Coelho, que o proibiu no seu Governo). O Parlamento prestou a homenagem devida a Belmiro – e o PCP e o Bloco souberam ser coerentes na mediocridade do seu voto.