Johnny Hallyday. Morreu o “nosso Johnny”, rei do rock europeu

Os heróis da música popular do século XX estão a partir. O “Elvis Presley francês” tinha 74 anos e morreu na casa de Paris, vítima de cancro no pulmão

Se Elvis Presley era universalmente tido como o Rei do Rock, então Johnny Hallyday merece esse título não só para a sua França mas também para o espaço europeu. Foi, aliás, a balada “Loving You”, popularizada pelo ídolo nunca renegado, que o fez optar por ser quem foi: cantor.

Hallyday partiu ontem aos 74 anos na sua casa de Marnes-la-Coquette, a oeste de Paris, para onde foi transferido após ter deixado uma clínica da capital francesa onde esteve internado durante seis dias. O músico fora internado devido a um cancro no pulmão.

“Johnny Hallyday partiu. Escrevo estas palavras sem acreditar. Ele deixou-nos esta noite como venceu tudo ao longo da sua vida, com coragem e dignidade”, escreveu a mulher Laeticia. O presidente francês Emmanuel Macron também reagiu à morte de Hallyday, através do Twitter. “Existe um pouco de Johnny em cada um de nós”, acentuou.

A doença fora revelada em março mas os problemas de saúde já vinham de trás e agravados pelos excessos com álcool e drogas. Em dezembro de 2009 foi hospitalizado nos Estados Unidos, tendo-lhe sido provocado coma induzido devido a um grave problema respiratório. A 17 de novembro foi hospitalizado de urgência devido a uma insuficiência respiratória, tendo sido submetido a uma nova sessão de quimioterapia.

Jean-Philippe Léo Smet – nome real de Hallyday – nasceu em Paris, na França ocupada de 1943. Filho da modelo Huguette Clerc e do artista belga de music-hall Léon Smet, viveu em Londres com a tia e o marido desta, um artista de variedades a quem forjou o nome artístico. Começou por se apresentar em clubes noturnos e gravou o primeiro álbum na aurora da década de 60. O primeiro êxito, um disco de ouro, foi uma adaptação de “Let’s Twist Again”. Em francês “Viens danser le twist”.

De então para cá, nunca conheceu o insucesso. Nos anos dourados da canção europeia, quando o Festival da Canção servia de barómetro do acontecimento, Hallyday era uma das maiores estrelas. Deixou para a eternidade clássicos como “Rester vivant”, “O Carole” ou “Noir c’est noir”, a versão francesa de “Black is black”, de Los Bravos, e as interpretações de “Mystery Train” e “Blue Suede Shoes”. “Requiem pour un fou”, “Ma gueule”, “L’Idole des jeunes”, “Que je t’aime” e “J’ai pleuré sur ma guitare” são hinos geracionais que a França não esquece. Em 1966, o primeiro concerto de Jimi Hendrix na Europa foi uma primeira parte de Hallyday. Há alguns anos, o “USA Today” descreveu-o como “a maior estrela de rock de que nunca ninguém ouviu falar”. A carreira internacional não era uma obsessão. “É melhor ser rei no meu país que príncipe noutro lugar”, assumia.

Na América, nunca gozou da mesma popularidade. Resistência, aliás, que quase todos os que foram grandes em solo europeu enfrentaram ao atravessar o Atlântico. Em mais de 50 anos de ofício, venceu cerca de 100 milhões de discos. Em 1997, foi condecorado Cavaleiro da Legião de Honra por Jacques Chirac. “Hallyday é uma verdadeira estrela que conseguiu com seu sucesso unir duas culturas, a francesa e a norte-americana”, declarou o então presidente.Em França, era carinhosamente tratado como “o nosso Johnny”.

Acabou por deixar a pátria para viver entre a Suíça e Los Angeles, cansado dos “elevados impostos pagos em França. O reinado foi curto já que a saúde o obrigou a voltar à base. Ingloriamente, mas sem tocar com os dentes no chão. Entre junho e julho voltou aos palcos ao lado dos velhos amigos Jacques Dutronc e Eddy Mitchell para uma digressão de veteranos.

O rock não limitou altos voos e fez carreira no cinema, quer a escrever bandas sonoras, quer como ator. Participou em dezenas de filmes de realizadores conceituados como Jean-Luc Godard e Patrice Leconte. O papel de assassino que procura vingar a família no filme “Vingança”, Johnnie To, de 2009, valeu-lhe variados elogios.

Nem tudo foram rosas, no entanto. Em 1966, tentou suicidar-se e, vinte anos depois, desmaiou em palco. Foi cinco vezes casado, duas delas com a mesma mulher: Adeline Blondieau, filha de um amigo.

Em 1998, admitiu ao jornal “Le Monde” que consumia cocaína e contava os pormenores de uma infância difícil com um pai alcoólico, que abandonou pela primeira vez a família quando tinha apenas oito. meses. Os últimos vinte anos foram vividos ao lado da modelo Laeticia Boudou, 31 anos mais nova, com quem adotou duas meninas de origem vietnamita.