Guerra do Lítio está para lavar e durar

Lusorecursos entregou pedido de exploração ainda antes de Tribunal de Braga decidir contra a Novo Lítio em providência cautelar. Mas australianos continuam a reivindicar direitos.

As reservas de lítio em Portugal são um atrativo e há muitos projetos em curso. Dos 46 requerimentos para a atividade de prospeção e pesquisa na Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG), 30 visam o lítio como substância mineral principal. 

Entre os locais – uma área total de 2.500 quilómetros quadrados – onde há  prospeção, o mais mediático tem sido Sepeda, em Montalegre, local onde está identificada uma jazida importante. Sepeda tem também sido palco de um litígio entre duas empresas que esta semana, data do fim do prazo para entrega do pedido de exploração, conheceu desenvolvimentos jurídicos que vão manter a disputa durante o próximo ano. 

A contenda entre a Lusorecursos e a Novo Lítio, que chegou a obrigar a intervenção da GNR, foi levada às instâncias judiciais depois de a segunda ter interposto uma providência cautelar à primeira. No início da semana o Tribunal de Braga rejeitou a providência cautelar interposta pela firma australiana Novo Lítio, contra a portuguesa Lusorecursos, de Braga, por causa de uma concessão da exploração desta jazida.  

Na providência cautelar os australianos alegavam ter-lhes sido cedida a posição do contrato de prospeção e diziam que a Lusorecursos iria perder a concessão, por não ter capacidade técnica e financeira para a posterior concessão da exploração do minério. 

A Lusorecursos rejeitou a alegação, referindo que o contrato de prospeção lhe foi outorgado e renovado, o que só foi possível por ter provado capacidade. A posição foi aceite pelo tribunal.

Ainda antes da decisão, a Lusorecursos entregou na DGEG um pedido de exploração, para extrair óxido de lítio, na zona  de Sepeda, em Carvalhais, freguesia de Morgade, em Montalegre. 

A DGEG só irá decidir sobre o pedido de exploração, que a Novo Lítio decidiu também entregar, apesar da decisão do Tribunal de Braga, no próximo ano. 

Em comunicado a meio da semana, a empresa australiana revela que iria submeter à DGEG «o seu plano de exploração completo, bem como o correspondente pedido de licença de exploração de forma a proteger a empresa quanto aos seus direitos, caso a licença de exploração submetida pela Lusorecursos seja recusada pela DGEG, por falta de capacidade técnica e financeira da mesma». 

Os australianos alegavam que havia o risco de a Lusorecursos não apresentar o novo pedido de exploração antes do prazo findar – 7 de dezembro – o que, a acontecer, causaria prejuízos irreparáveis. Mas a Lusorecursos provou ao tribunal que entretanto tinha apresentado o pedido à DGEG. Assim, o tribunal considerou que a Novo Lítio já não poderia substituir-se à empresa de Braga. 

Contrato válido 

Na base da contenda está a tentativa da Novo Lítio conseguir a licença de exploração, mas a Lusorecursos é a única entidade com quem «o Estado tem um contrato devidamente válido», reconhece o Ministério da Economia.

O atual contrato de prospeção, cujo titular é a Lusorecursos, foi assinado em 7 de dezembro de 2012 e terminou cinco anos depois, esta quinta-feira. Entretanto, em junho do ano passado, a Novo Lítio  – então ainda Dakota Minerals  -,  anunciou ter acordado a compra à Lusorecursos dos direitos desta licença. Só que a transferência dos direitos para os australianos nunca aconteceu, levando a Novo Lítio a pôr a Lusorecursos em tribunal. A decisão da Lusorecursos de «não reconhecer a existência e validade do contrato celebrado com a Dakota Minerals/Novo Lítio» está também a ser contestada pela Sinergeo, empresa que esteve na génese da Lusorecursos e que admite também processar os dois sócios da firma bracarense.  

Para a exploração – o tribunal pedia provas de capacidade financeira para poder avançar -, os dois empresários notificaram o Ministério da Economia da intenção de constituir uma sociedade, a Lusorecursos Sepeda, cujo capital social – de 1,5 milhões de euros – seria repartido por três empresas dos empresários.  A acompanhar o «pedido de atribuição de concessão de exploração de depósitos minerais na sequência de prospeção» está um compromisso dos dois empresários a aumentar o capital social da empresa no primeiro ano de atividade para 5 milhões de euros.

A questão do financiamento do projeto tinha levado a Lusorecursos, em setembro de 2015, a pedir a suspensão temporária dos trabalhos por causa dos impactos da «grave crise económica». E seis meses depois revelou que tinha «excelentes perspetivas de concretização» da entrada no capital de um novo parceiro – a Dakota Minerals, o que permitiria «potenciar e acelerar o plano de investimentos previsto»

A providência cautelar da Novo Lítio contra a Lusorecursos alegava que a empresa australiana tinha – devido a um contrato assinado com a empresas de Braga – legitimidade para pedir ao Estado a transferência para si da posição contratual em Sepeda. 

Mas a Novo Lítio nunca pediu ao Ministério da Economia esta  transferência, o que, segundo o Tribunal Braga, mesmo que quisesse pedir a licença de exploração, teria uma «enorme dificuldade», dado nunca ter tido a  autorização administrativa. 

Apesar da decisão judicial lhe ter sido desfavorável, a Novo Lítio anunciou que, em resposta a esta decisão do Tribunal de Braga, «tomou de imediato as medidas necessárias para proteger os seus direitos através de uma estratégia jurídica a desenvolver em várias fases, enquanto prepara a propositura da ação principal».

Ações suspensas 

Na terça-feira as ações da Novo Lítio tinham sido suspensas em bolsa, à espera de esclarecimentos da empresa sobre a providência cautelar que acabou chumbada. 

A suspensão da negociação de ações da Novo Lítio não é novidade. Em maio, devido ao diferendo  com a Lusorecursos, tinha suspendido, com dois prolongamentos, a negociação das ações na bolsa australiana.  A ASX (bolsa australiana) considera que as suspensões voluntárias de negociação não são incomuns mas devem ser um último recurso.