PSD – a corrida de estafetas

Estar a discutir se o PSD é mais à esquerda ou mais à direita, é discutir o sexo dos anjos

Mário Centeno ir presidir ao Eurogrupo é a segunda etapa da existência austeritária da vida portuguesa. 

O Governo de Passos festejou em 2014 a saída da troika, depois dos sacrifícios brutais impostos aos portugueses. Dois anos de Governo da ‘geringonça’ a governar para baixar o défice, com cativações e apertando o garrote ao investimento, deram os resultados que a Europa exigia que dessem. Um défice historicamente baixo à custa de impostos altos e ausência de investimento. 

A Europa deu prémios de bom comportamento a Centeno e a Costa. Quem se revolta é condenado à fome, à miséria e ao esquecimento. Valha-nos que Costa olhou com olhos de ver para a Grécia de Tsipras – e percebeu o que nos esperava se se amotinasse. 

Na altura festejei a saída da troika, pese embora soubéssemos todos que tinha sido alcançada com sangue, suor e lágrimas. 

Em coerência, também tenho de festejar agora, embora saiba que são os hospitais e a saúde que estão a suportar a parte de leão deste esforço. 

É claro que os socialistas – que então menosprezaram a ‘saída limpa’ – estão eufóricos com a nomeação de Centeno. Quanto às lagartas na sopa e os pratos de comida semicrua atualmente servidos nas cantinas escolares, acham com certeza que são boas iniciativas para combater a obesidade das crianças e para as iniciar nos prazeres da comida crua e de paladares mais refinados…

É neste cenário que decorre a luta pela liderança do PSD entre Rui Rio e Pedro Santana Lopes. 

As disputas eleitorais nos partidos são como as corridas de estafetas: trata-se de passar o testemunho sem o deixar cair. O testemunho – o PSD – é agora passado por Passos Coelho, depois de o ter segurado durante oito anos consecutivos. 

O testemunho é o mesmo, o corredor que o leva é que é diferente. Cada um tem a sua forma de correr – e o que leva nas mãos é um partido que, nascido em 1974, já viveu três resgates e passou os últimos oito anos em pavorosa austeridade. 

Ora, estar a discutir se o PSD é mais à esquerda ou mais à direita, quando a Europa nos impõe austeridade e um défice baixo, é discutir o sexo dos anjos. 

Igualmente me parece óbvio que há um conjunto de matérias que antes dividiam esquerda e direita e que hoje estão completamente ultrapassadas e assimiladas. 

Para a minha geração, nascida nas grandes cidades e em democracia, o fascismo já não é tema, o aborto não é tema, o casamento gay não é tema, os direitos das mulheres e das etnias também não. Ou seja, se antes a chamada agenda de valores podia ser esgrimida politicamente, para diferenciar esquerda e direita, agora são valores consensuais, já fazem parte do nosso património, já não são bandeiras eleitorais.

A ideologia é a TINA (‘não há alternativa’) e a agenda de costumes já não divide ninguém. É dentro destas balizas que a liderança do PSD se pode disputar. 

sofiarocha@sol.pt