O melhor aluno em Bruxelas

Mário Centeno, recém-eleito presidente do Eurogrupo, teve um trajeto oposto ao de António Costa.

Costa começou muito bem, mas tem vindo a derrapar; Centeno começou mal, mas veio sempre a melhorar. 
No início, o ministro das Finanças aparecia com olheiras, expressão torturada e ar um pouco esgazeado de quem não sabia para onde se virar. 

O seu primeiro Orçamento começou por parecer um exercício impossível, com Bruxelas a rejeitar a primeira versão e a exigir ao Governo português múltiplas alterações.
Em Bruxelas, Centeno não era levado muito a sério e, no seio do Governo, era olhado pelos seus pares como o primeiro a ser ‘remodelado’.

O folhetim da CGD, cuja responsabilidade assumiu como um mártir, desresponsabilizando António Costa, também o afetou.

Ao fim do 1.º semestre de 2016 os resultados eram desastrosos, obrigando-o a meter travões a fundo: cortou para zero o investimento público, decidiu cativações a eito e criou um novo RERT para conseguir receitas extraordinárias.

As medidas foram tão radicais que, no fim, o défice não só foi respeitado como ficou aquém do previsto.

Tendo atacado o Governo anterior por ir ‘além da troika’ (o que nunca aconteceu, diga-se), os socialistas acabaram por ser os primeiros a ir além de Bruxelas.

E isto foi determinante para mudar a imagem e a vida do ministro das Finanças.

Como para Bruxelas o mais importante é o défice baixo – evitando que os países se endividem excessivamente – o cumprimento das metas levou o odiado Schäuble a chamar a Centeno ‘o Ronaldo das Finanças’.

Estávamos no rescaldo da vitória de Portugal no Europeu de futebol e o elogio não podia ser mais expressivo.

Havia outra razão que tornava muito importante para a Europa o êxito financeiro de Portugal.

Perante o fantasma do Brexit, os problemas em Itália e Espanha, sem esquecer o eterno abcesso grego, era fundamental para Bruxelas ter um caso de sucesso para apresentar.

E esse caso foi Portugal: os bons resultados mostravam que o programa imposto pela troika tinha funcionado.

Se o Governo socialista estava a ter sucesso, era porque as políticas de austeridade do Governo anterior haviam conseguido os objetivos.

O representante de Portugal no Eurogrupo tornou-se, assim, um símbolo que Bruxelas estava empenhada em apoiar.
E em Lisboa os bons resultados do défice, do crescimento do PIB e da baixa do desemprego também calaram os críticos, fazendo de Centeno uma espécie de santo milagreiro.

É certo que o PCP e o BE não partilhavam do mesmo entusiasmo, pois não concordavam com as metas europeias.

Mas também eles se renderam ao seu cumprimento, porque perceberam que o sucesso no campo financeiro era importante para o êxito da ‘geringonça’.

Se o Governo cumprisse o défice e conseguisse fazer crescer um pouco a economia, calaria a direita e daria gás à coligação de esquerda. 

Assim, comunistas e bloquistas moderaram as críticas, as reivindicações e os protestos, empenhando-se todos juntos em respeitar as imposições de Bruxelas.

Mas agora entrámos num tempo diferente.

O PCP e mesmo o BE deitaram os pauzinhos de fora e atacam abertamente o Governo.

Já perceberam que a ‘geringonça’ não vai durar muito mais e que não ganham nada em estar calados.

E, por isso, a escolha de Mário Centeno para presidente do Eurogrupo vem na altura certa.

Além de ser um motivo de orgulho patriótico, compromete mais Portugal com o projeto europeu.

De facto, não fará sentido que o presidente do grupo dos ministros das Finanças europeus não respeite as regras europeias no seu próprio país.

É por isso que o PCP e o BE veem com desconfiança e pessimismo esta eleição.

Durante algum tempo alimentaram a esperança de que o PS, impulsionado por jovens turcos como Pedro Nuno Santos ou João Galamba, se batesse em Bruxelas por uma nova política.

Acreditaram que o Governo socialista pudesse abraçar as suas causas e obrigasse os nossos parceiros europeus a aligeirar os limites do défice e os credores a aceitarem renegociar a nossa dívida.

Ora, sendo o ministro português presidente do Eurogrupo, todas essas esperanças se esfumam.

A esquerda, que acusava Cavaco de querer ser ‘bom aluno’ na Europa e Passos Coelho de ser um dócil discípulo de Merkel, vê um ministro seu ser considerado o melhor aluno em Bruxelas.