Casa Branca contradiz Tillerson e rejeita diálogo direto com Pyongyang

Secretário de Estado norte-americano tinha proposto sentar-se à mesa com representantes da Coreia do Norte “sem condições prévias”, mas elementos ligados à administração Trump repeliram a oferta e argumentaram que primeiro é necessário desnuclearizar a península

Donald Trump e Rex Tillerson continuam sem chegar a acordo sobre a estratégia dos Estados Unidos para neutralizar o programa nuclear e balístico da Coreia do Norte. Dois meses depois de o presidente ter dito que o responsável máximo pela diplomacia norte-americana estava a “perder o seu tempo”, ao tentar negociar com o regime de Kim Jong-un, responsáveis da sua administração desconsideraram uma oferta pública de Tillerson, com vista a um “diálogo direto” com Pyongyang, 24 horas depois de apresentada.

Numa intervenção no think tank Atlantic Council, na terça-feira, o secretário de Estado tinha anunciado que os EUA estavam “preparados” para negociações  “imediatas” e “sem condições prévias”, mas o núcleo duro da equipa de Trump reforçou que não abdica da imposição de premissas aos norte-coreanos, ainda para mais na sequência do teste balístico, realizado há duas semanas, que Pyongyang garante ter comprovado a sua capacidade para transportar ogivas nucleares até à costa leste americana.

“Tendo em conta o mais recente teste balístico da Coreia do Norte claramente que não é a melhor altura [para negociar]. A administração está unida na insistência de que quaisquer negociações terão de aguardar até o regime melhorar fundamentalmente o seu comportamento”, afirmou um funcionário da Casa Branca à Reuters, na quarta-feira. 
Uma postura igualmente assumida por um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, que garantir à Associated Press que Trump só aceita sentar-se à mesa com os representantes de Kim se forem tomadas “ações sinceras e significativas” a favor da “desnuclearização” da Coreia do Norte.

A desautorização a Rex Tillerson ganhou eco na imprensa norte-americana, não só por se tratar da segunda sobre o mesmo tema, mas também porque oferece mais estofo aos alegados planos de Donald Trump para substituir o texano pelo atual diretor da CIA, Mike Pompeo. 

E também porque obrigou a uma reação do próprio departamento de Estado. Depois de assegurar que o organismo responsável pela execução da diplomacia norte-americana e a Casa Branca estão “em sintonia” em relação à Coreia do Norte, a porta-voz Heather Nauert retirou da mesa a proposta do seu superior hierárquico. “Mantemo-nos abertos ao diálogo quando a Coreia do Norte estiver disposta a conduzir uma conversa séria e credível sobre a sua desnuclearização pacífica, mas este não é o momento para tal”, escreveu no Twitter.

Guterres e as as sanções

Moscovo e Pequim até tinham recebido com agrado a oferta de Tillerson, mas em Washington, tal como Nauert reforçou, a estratégia para Pyongyang continuará a ser a da prossecução de uma “campanha de pressão máxima”, com o intuito de isolar diplomaticamente e economicamente o regime de Kim.

Tal plano depende, naturalmente, da execução das sanções acordadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, um gesto que António Guterres entende como essencial para a resolução da questão coreana. “As resoluções (…) devem ser totalmente implementadas, primeiramente pela Coreia do Norte, mas também por todos os outros países cujo papel é crucial (…) para a desnuclearização da península coreana”, defendeu o secretário-geral da ONU.

De visita oficial ao Japão, o antigo primeiro-ministro de Portugal alertou, porém, para a necessidade de também se dar espaço a um eventual “envolvimento diplomático” com Pyongyang, que possa evitar um cenário bélico a curto prazo. “O pior que nos poderia acontecer seria entramos sonâmbulos numa guerra que poderá ter consequências dramáticas”, lembrou Guterres.