21D. Mariano Rajoy paga as favas quase sozinho

Os espanholistas tiveram uma vitória com um sabor amargo,  Ciudadanos são o primeiro partido, Inés Arrimadas é a grande vencedora individual, mas o independentismo consegue manter a maioria absoluta e Puigdemont suplantar a ERC   

Vencedores 

Inés Arrimadas – Ciudadanos

Ciudadanos nasceram na Catalunha como reação ao catalanismo. O seu tema maior sempre foi o discurso anti-independentista. O seu crescimento é a outra face do ganho de importância das questões nacionais na Catalunha. Nestas eleições, essa estratégia teve os maiores resultados – pela primeira vez na história da região, o partido mais votado na região é não independentista. Mesmo quando os socialistas governaram a região em 2006, tiveram menos votos que a Convergência e União, e só fizeram maioria com a Esquerda Republicana da Catalunha e a Iniciativa para a Catalunha-Esquerda Unida. Apesar deste excelente resultado que concentra a esmagadora maioria do voto espanholista e conquista votantes até nos subúrbios operários do PSC, o Ciudadanos não tem maioria para governar. O novo parlamento da Catalunha não dá uma maioria aos três partidos espanholistas: PP, Ciudadanos e PSC. É como ganhar por cinco zero à equipa que ganhou o campeonato: sabe muito bem, mas não dá para mandar em nada.   

Oriol Junqueras – ERC

Era uma campanha à partida difícil para a Esquerda Republicana da Catalunha, tem o seu líder preso. Não pode contar nos debates e nas ruas com Oriol Junqueras. Para além disso, a recusa de manter a sua coligação com o partido de Carles Puigdemont poderia ser interpretado pelo eleitorado independentista com o colocar os seus cálculos eleitoralistas à frente da possibilidade de autodeterminação da Catalunha, a curto prazo. De alguma forma isso significa que a ERC perdeu a fé na possibilidade de fazer uma Declaração Unilateral de Independência e quer regularizar uma distorção política: há muito que a ERC é o partido independentista mais forte, mas apesar disso os governos independentistas eram dirigidos por gente vinda da área da Convergência e União. Apesar deste cálculo, a ERC, mesmo com a sua melhor votação de sempre, não consegue ganhar a Puigdemont. A sua única consolação é que dificilmente o novo governo poderá ser encabeçado pelo presidente atual, mas será um executivo independentista.

Carles Puigdemont – JXCAT 

A sua posição não era fácil. Decidiu não ir preso. Foi para a Bélgica, colocando em causa a justiça espanhola e contestando como ilegal a forma como foi executado o artigo 155, que suspendia a autonomia da Catalunha. Legalmente, a maioria dos juristas defende que o artigo não permitiria a demissão do governo, nem a convocação de novas eleições. Quando as eleições foram convocadas, o seu partido herdeiro da Convergência e União, o PDeCAT, tinha menos de metade das intenções de voto da ERC. Puigdemont jogou de uma forma inteligente criando uma nova candidatura à sua volta, em que colocava como seu número dois o líder preso da Assembleia Nacional da Catalunha, Jordi Sànchez. Este posicionamento permitiu-lhe recuperar a sua desvantagem em relação à ERC. Na fase final da campanha, essa recuperação foi menor, frente ao aumento esperado do Ciudadanos, que faziam da ERC o voto útil independentista. Mas no dia que contava mostrou a sua popularidade e bateu Oriol Junqueras. É um dos grandes vencedores da noite.  

Derrotados

Xavier Domènech – cATcOMÚ

Podia estar nos vencedores se os independentistas não tivessem a maioria absoluta. Tinha as chaves para o novo governo. Infelizmente, para a sua área do Podemos – que disputou a vitória na Catalunha em eleições europeias e nas nacionais e ganhou a importante Câmara Municipal de Barcelona, com a carismática Ada Colau – , nas eleições de 21 de dezembro perdeu votos e deputados, ficou bastante abaixo dos 11 eleitos que tinha. A posição da área do Podemos na questão catalã é bastante entalada: parte do seu eleitorado é independentista, mas a maioria defende a permanência numa Espanha mais confederal; e sobretudo está entalado porque tudo o que diz na Catalunha é cobrado com juros eleitorais no resto de Espanha. Apesar desta dificuldade, que têm resolvido dizendo que defendem o direito a decidir dos catalães, mas que votariam pela permanência em Espanha, perderam votos  e deputados neste duelo entre dois blocos radicalizados.

CUP – Independentistas anti-capitalistas

A CUP não é um partido como os outros. Os seus cabeça de lista e os seus porta-voz são rotativos. Toda a sua direção executiva trabalha fora da Coligação da Unidade Popular: não vivem à custa do partido e decidem as suas posições em assembleia. Por isso não foi colocada a fotografia do cabeça de lista. Para a CUP a ida às eleições não é obrigatória, normalmente só vão às locais. Só recentemente concorreram às regionais. A sua política é de confronto direto contra o Estado espanhol. Querem e batem-se por uma declaração unilateral da República. Nas anteriores eleições de 2015, a força da CUP não estava no facto de ter eleito 10 deputados, mas no facto de que os independentistas precisavam dos seus eleitos para ter a maioria absoluta. Isso permitiu-lhes vetar Artur Mas como presidente do governo autonómico, dada a sua cumplicidade nas políticas de austeridade. E só aceitaram Puigdemont em troca de um calendário de “desconexão” de Espanha e marcação de um referendo para 1 de outubro. Continuam a ser necessários para uma maioria, mas é visível que os catalães não acreditam numa República já.

Xavier Albiol – pp

Um dos grandes derrotados da noite não se devia chamar Albiol, uma espécie de caricatura de político, mas Mariano Rajoy. O seu partido arrisca-se a não formar grupo parlamentar no parlamento da Catalunha e a vitória esmagadora, no setor espanholista, do Ciudadanos, coloca questões na Catalunha e em Espanha. Na região parece que se tornaram um partido residual, no Estado espanhol pode-se estar a viver uma situação de mutação de partido dominante: tal como o PP enterrou a UCD, pode-se estar a assistir a substituição lenta do velho PP, pela nova estrela da direita espanhola, Artur Rivera e Inés Arrimadas e os seu Ciudadanos. Por ironia da história, a declaração do 155 vitimou o partido do seu autor. O outro problema é que a situação da Catalunha continua incontrolável para um executivo de Madrid, que não aceita negociar nada. Se os independentistas mantêm a maioria absoluta, o que fará o governo? Depois destas eleições, Rajoy vai aceitar o seu castigo eleitoral e pensar nele ou continuar o 155 na Catalunha?

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