Em defesa de José António Saraiva

A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género quer fazer o papel da PIDE e proibir o pensamento

Quem nos conhece sabe que estamos nos antípodas no que diz respeito aos costumes. Eu defendo a legalização das drogas, da prostituição, o aborto e a eutanásia. Além disso, entendo que no sexo cada um pratica o que quer e pode, seja homens com mulheres, homens com homens ou mulheres com mulheres. Quanto ao casamento homossexual e à mudança de sexo é-me totalmente indiferente e, se as pessoas assim o decidem, que sejam muito felizes. 

Ao longo dos mais de trinta anos em que nos conhecemos – era eu estafeta do Expresso e o José António Saraiva (JAS) diretor do jornal – sempre nos demos bem e respeitámos, mas nunca deixámos de ter grandes discussões sobre alguns dos assuntos que referi. Por vezes, irritava-se com a minha ‘imoralidade’, no seu entender, mas sempre acabámos as conversas de uma forma educada e respeitadora. «O Vítor é incorrigível», dizia-me quando eu defendia a liberdade de costumes e me indignava com a moralidade vigente em relação a determinados temas. Repito: há 30 anos que temos estas diferenças e não foi por isso que não ajudámos a criar este jornal, além de termos trabalhado muitos anos no Expresso, onde foi diretor mais de 20 anos. 

JAS sempre foi um livre pensador e sempre cultivou que os outros caminhassem na mesma direção. Isto é: que pensassem pela sua própria cabeça, independentemente do que os outros julguem. Só que isso começa a ser cada vez mais difícil numa sociedade que quer determinar o que podemos ou não escrever sobre os mais variados assuntos. Saraiva entende que quem muda de sexo se torna num monstro híbrido e eu penso que cada um faz o que bem entender desde que não prejudique terceiros.

Na semana passada, escreveu um artigo com o sugestivo nome ‘E se um homem se sentir galinha?’ que indignou muito boa gente, que está no seu pleno direito de ficar desagradada. Saraiva escrevia sobre as pessoas que mudaram de sexo: «Nunca poderão ter uma vida familiar normal: não podem ter filhos e qual é o homem que se vai casar com uma mulher que já foi homem?». O José António não pesquisou muito, pois facilmente saberia que um dos transexuais mais famosos é casado há mais de trinta anos com o mesmo homem. Falo de Roberta Close, que vive na Suíça e este ano deu um ar de sua graça ao ser fotografada em biquíni. Saraiva acrescentou ainda: «Embora seja um liberal convicto, entendo que estas operações deveriam ser pura e simplesmente proibidas».

A crónica, como disse, indignou muita gente, mas não se estava à espera que a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), dependente da Presidência do Conselho de Ministros, apresentasse queixa no Ministério Público contra este jornal, alegando que a mensagem passada no texto «é susceptível de favorecer a prática de atos de violência homofóbica e transfóbica». Mas agora não  pode dizer-se o que se pensa sobre a transexualidade? Isso é incentivar à violência? Os autores da queixa dormem bem com esse seu lado pidesco? Quem achincalha a religião, por exemplo, ofendendo milhões de pessoas, também vai ao DIAP responder por queixa-crime?

E, já agora, o que disse a tal Comissão destas frases publicadas no Expresso por Gentil Martins, um ilustre cirurgião: «A homossexualidade é uma anomalia, é um desvio de personalidade. Como os sadomasoquistas ou as pessoas que se mutilam»? Ou «sou totalmente contra os homossexuais»? A CIG também apresentou queixa-crime contra o Expresso? Os fascistas não eram muito diferentes da CIG. 

{relacionados}

Veja aqui o comunicado da CIG.