Debates: Santana 1, Rio 0

No primeiro debate entre os dois candidatos à sucessão de Passos Coelho na liderança do PSD, Santana Lopes marcou os temas e Rui Rio deixou-se enredar na estratégia do adversário.

O debate de quinta-feira entre Pedro Santana Lopes e Rui Rio na RTP só começou depois da atualidade noticiosa – o que diz bastante sobre a importância do mesmo. Tanto Rui Rio como Pedro Santana Lopes despacharam as polémicas recentes, como a lei do financiamento dos partidos, e o seu primeiro duelo televisivo foi depois concentrado – ou focado por Santana – em temáticas partidárias numa disputa que é, naturalmente, mais interna.

Sobre o assunto da atualidade, Rio revelou-se favorável ao reforço do financiamento público («e eu sei que ao dizer isto sou impopular»), mas não nos moldes das alterações vetadas por Marcelo Rebelo de Sousa, e Santana assumiu que não olhava para o financiamento partidário como uma «prioridade para o país». «Não é das minhas primeiras preocupações. Mas custa-me, numa altura em que as pessoas pagam tantos impostos, pedir-lhes que paguem mais para aumentar o financiamento dos partidos», disse.

Nesta discussão sobre os partidos, até as banquinhas na festa do Pontal, que marca no final do verão a rentrée política social-democrata, serviram de exemplo.

Passado o tema da atualidade chegou a vez do moderador da RTP, o jornalista Vítor Gonçalves, pedir a ambos que explicitassem  aquilo que os diferencia. Ao que Rio respondeu logo: «Não vai ser muito agradável». Para Santana ripostar com uma pergunta: «Vais pedir desculpa?».

O pedido de desculpas tinha a ver com o facto de Rio se ter referido às «trapalhadas» de Santana Lopes como primeiro-ministro, mas não só o ex-presidente da Câmara do Porto não se desculpou como reiterou. «As trapalhadas efetivamente existiram», disse Rio, para quem o então Presidente Jorge Sampaio teve «naturalmente razões» para dissolver a maioria parlamentar PSD/CDS e convocar novas eleições. Rio apenas discorda de Sampaio no «curto espaço de tempo em que o fez».

«Foste meu primeiro-vice-presidente e nunca disseste nada, nem publicamente nem privadamente», apontou Santana. E Rio defendeu-se, clamando que se manteve na direção em prol da estabilidade do «país e do partido». Mas Santana não gostou de ouvir Rio «repetir o argumentário do engenheiro Sócrates» contra si. E Rio revelou que chegou «a sugerir outros nomes» a Durão Barroso para lhe suceder em 2004, quando este foi para a Comissão Europeia.

«Eu fui responsável pela maioria absoluta de José Sócrates?», pergunta Santana, para depois atirar: «Mas um grupo de que tu foste vice-presidente, na liderança de Manuela Ferreira Leite, já com quatro anos de governação de José Sócrates, que resultado teve? 29,1%». «Melhor que o teu», devolveu Rio. «Duas décimas», ironizou Santana, recordando que essa derrota de Ferreira Leite chegou depois de Paulo Rangel ter vencido as eleições europeias, três meses antes.

Para Santana Lopes, Rui Rio tem mais facilidade «em atacar o seu partido» do que em atacar «a frente de esquerda» que atualmente governa o país, remetendo para a moção do seu adversário e a mudança «nas bases» que esta propõe.

Rio procurou virar o bico ao prego no que diz respeito à proximidade a António Costa de que Santana o acusa, dizendo que foi este quem foi nomeado provedor da Santa Casa da Misericórdia pelo atual primeiro-ministro. Ao que Santana esclareceu ter sido reconduzido no cargo e não escolhido, pois fora Passos Coelho a propor o seu nome e Costa não teria grandes alternativas, tendo em conta o «reconhecido e muito bom trabalho» que ele tinha feito. Em relação ao primeiro-ministro, Santana garantiu: «Nunca lhe passei cartão».

 A  defesa de Passos Coelho

Santana aproveitou para colar Rio a Costa com a acusação da sua falta de solidariedade para com o Governo de Pedro Passos Coelho quando Rio era presidente da Câmara do Porto. Algo que este se apressou a negar. Num verdadeiro paradoxo,  Santana surgiu a defender politicamente o legado de Passos Coelho, enquanto Rio coincide economicamente na doutrina do ainda líder do PSD. Santana confrontou Rio com o facto de a direção de Ferreira Leite, de que fazia parte, ter tirado Passos Coelho da lista de deputados, em 2009.

No que ambos coincidiram foi na sua oposição à atual solução de Governo, do PS com o PCP e o Bloco de Esquerda. Rio diz que é um arranjo sem capacidade para projetar «futuro», demasiadamente fechado «no presente». «Qualquer folga que tenha, vê logo como é que há-de distribuí-la para melhor agradar aos portugueses. Nós precisamos de um Governo completamente diferente», sustentou. Precisamos de «reformas que preparem Portugal para o seu futuro», acrescentou Rio, numa frase que poderia ter sido dita – e foi várias vezes dita – por Passos Coelho. «Um modelo de crescimento económico totalmente diferente do desta solução governativa, que só olha para a conjuntura, que degrada os serviços públicos», disse ainda, para adicionar com mais originalidade: «Esta solução governativa não consegue fugir aos ditames de Bruxelas». E depois, regressando a Passos, no crescimento económico baseado «nas exportações e no investimento».

Santana pediu um crescimento económico mais acentuado num «caminho exatamente contrário» ao do aumento de impostos. «Eu acredito na redução da carga fiscal,  num clima de confiança». Não defendendo só a redução da despesa, «mas também pelo aumento da receita» para conseguir o equilíbrio orçamental. A inovação e a investigação também foram vetores da intervenção de Santana Lopes. Sempre com a convergência europeia como referência omnipresente. E a coesão territorial como «aposta» fundamental de governo.

Críticas a Marques Vidal

Os dois candidatos à liderança do PSD não estiveram de acordo sobre o mandato da Procuradora-Geral da República. «O balanço que faço do mandato de Joana Marques Vidal não é positivo. Não vejo no MP  a eficácia que gostava de ver, não vejo no MP o recato que gostaria e que deve existir», disse Rui Rio, para quem «os julgamentos não são para serem feitos na praça pública e nas primeiras páginas dos jornais». 

«Eu estou de acordo com a inadmissibilidade dos julgamentos na praça pública», afirmou Santana Lopes. Mas acrescentou: «Estamos num tempo em que, quer se queira quer não, se há algo que não se pode dizer da justiça portuguesa e dos magistrados é que tiveram receio de enfrentar os poderosos.»