O paternalismo libertário

1.NUDGE. Em português nudge pode traduzir-se por «empurrão ou cotovelada suave» (ou, na variante brasileira, sempre mais expressiva, «cutucar»). Nudge é também um conceito em ciências do comportamento que defende que  sugestões indiretas e incentivos positivos  são um meio mais eficaz para induzir determinados comportamentos do que a proibição ou instruções diretas. Enfim, a mão…

1.NUDGE. Em português nudge pode traduzir-se por «empurrão ou cotovelada suave» (ou, na variante brasileira, sempre mais expressiva, «cutucar»). Nudge é também um conceito em ciências do comportamento que defende que  sugestões indiretas e incentivos positivos  são um meio mais eficaz para induzir determinados comportamentos do que a proibição ou instruções diretas. Enfim, a mão leve e subtil é melhor do que a mão pesada do «comando e controlo». Este conceito foi desenvolvido e aplicado ao desenho de políticas públicas pelo mais recente Nobel da Economia, Richard Thaler (e popularizado num livro do mesmo nome).

2.LIBERDADE DE ESCOLHA. As políticas públicas com vista a induzir comportamentos considerados meritórios ou prevenir outros considerados prejudiciais entram sempre em conflito com a liberdade de escolha individual. Exemplos clássicos são a obrigatoriedade do uso de cintos de segurança, de capacetes ou a proibição de fumar em espaços públicos fechados. O exemplo mais recente foi a proibição de oferecer nos bares e restaurantes dos hospitais «alguns produtos menos saudáveis». A meu ver existem dois tipos de questões, a saber: se e quando restrições à liberdade de escolha individual se justificam e, por outro lado, qual o melhor modo de implementar essas restrições. A resposta tradicional à primeira questão reflete-se no dictum «a minha liberdade acaba onde a tua começa». Mas, no mundo de hoje, temos uma interpretação muito mais extensiva destes limites para incluir também externalidades que ocorrem por via, por exemplo, dos sistemas de solidariedade social. Dietas abusivas em açucares e gorduras, não obstante porem apenas em risco a saúde individual (e portanto serem do foro da decisão individual estrita), acabam por impactar terceiros via despesa do serviço nacional de saúde. A resposta à questão «do como» é mais difícil mas de grande importância prática. A solução do legislador português sobre a comida em cantinas hospitalares é paradigmática da mão mesada, híper pormenorizada e proibitiva. Como com piada escreveu Francisco José Viegas, só faltou incluir na lista «o salpicão ou a feijoada de búzios». Uma abordagem alternativa seria baseada no conceito de nudge. No caso das cantinas, Richard Thaler estudou experiências que passavam por colocar os produtos «de mérito» (frutas, sopa, sumos naturais e quejandos) em zonas dos balcões que induzissem a sua escolha. No fundo, usar os conhecimentos que todos os hípermercados têm sobre a melhor maneira de dispor os produtos para induzir a compra deste em desfavor daquele. Aqui, o Estado é ainda paternalista (no sentido em que «sabe melhor») mas desenha intervenções que limitem o menos possível as escolhas individuais.  Aquilo a que Thaler chama o «paternalismo libertário».