Costa a favor de novo formato para as eleições europeias

O Governo defendeu agora publicamente as listas europeias transnacionais. PCP, PSD, CDSe Bloco acreditam que vão prejudicar a representatividade de Portugal. PSD chamou MNE ao Parlamento e fala em «cedência a Macron à revelia do país». Gabinete do PM diz ao SOL que é apenas uma matéria «para estudo».

Costa a favor de novo formato para as eleições europeias

António Costa assinou na passada quarta-feira, no âmbito da Cimeira dos Países do Sul da União Europeia, que inclui França, Grécia, Itália, Espanha, Malta e a República de Chipre, uma declaração conjunta onde afirmava que a criação das «listas transnacionais dos membros do Parlamento Europeu, como forma de eleição a nível europeu, pode fortalecer a dimensão democrática da União».

As lista transnacionais foram propostas pelo Presidente francês Emmanuel Macron que pretende adjudicar ao processo eleitoral uma lista de deputados agrupados por famílias partidárias. Contactado pelo SOL, o gabinete de Costa afirma que não existe nenhum acordo e que é apenas «uma proposta para debate».

«Eu admito perfeitamente que o primeiro-ministro tenha subscrito um documento dessa natureza. Acho bem que o faça até», afirma Francisco Assis. «É natural, lógico e coerente, que quem defende esse aprofundamento também admita que, a prazo, possa haver listas transnacionais», diz o eurodeputado socialista.

No entanto, a medida não é consensual. Para Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, «o que é grave é que o primeiro-ministro português vá a uma cimeira dos países do Sul, assine uma declaração que obriga a mudar a nossa lei eleitoral sem nunca ter levado à Assembleia da República esse tema». Para o eurodeputado, «ele [Costa] está a cozinhar uma solução que ainda por cima é contrária aos interesses nacionais». O PSD chamou de urgência ao Parlamento o ministro dos Negócios Estrangeiros. «O Governo toma uma decisão de apoiar uma posição conjunta que não discutiu em Portugal. É uma cedência de António Costa a Macron, à revelia do país, sobretudo contra o interesse do país», disse ao SOL o deputado Duarte Marques. «É revoltante e pouco democrático», acrescenta.

À semelhança do PSD, o CDS, o PCP e o Bloco de Esquerda (BE) também são contra a implementação de listas transnacionais nas eleições europeias. Nuno Melo, eurodeputado centrista, chega a utilizar o adjetivo «antidemocrático»para definir a «ideia peregrina do presidente Macron». Odeputado teme que a composição destas listas caiba «não às decisões dos partidos nacionais mas ao arbítrio das direções dos partidos europeus». «Nem todos os partidos nacionais estão representados» nas ditas direções, acrescenta Melo.

João Ferreira, representante do PCP no Parlamento Europeu, afirma que «se o Governo português, por hipótese, vier a aprovar uma medida destas, está a defender algo que é prejudicial ao seu país», afirma, considerando «incompreensível» a posição de Costa na declaração conjunta.

Por outro lado, Marisa Matias, eurodeputada do BE, diz que o seu partido é contra, mas desvaloriza a situação. «Éa posição do Governo. Todos os dias o Governo português toma decisões em nome do país no âmbito do Conselho [Europeu]. Essa é a regra de funcionamento básica».

Nuno Melo acredita que esta declaração só pode significar que os elementos do PS«estejam totalmente descoordenandos». «Tanto quanto julgo saber», continua, «nenhuma das delegações portuguesas do Parlamento Europeu é a favor das listas transnacionais», acrescentando que talvez «António Costa tenha assinado sem ler».
No entanto, à semelhança de Francisco Assis, Carlos Zorrinho, eurodeputado socialista, também acredita que «o princípio é positivo mas a forma de aplicação tem de garantir que não há distorções na representação». Para Zorrinho, ainda há «um trabalho a desenvolver para verificar como é que isso se pode aplicar».

Para Francisco Assis o mais importante é que «haja um dirigente político europeu que revele um tal grau de confiança no futuro da Europa que até avança com esta ideia», afirma, acrescentando que «acha bem» a confiança de Macron no projeto europeu.

Vantagens e consequências

«A consequência dessas listas é uma e só uma», afirma João Ferreira, «aumentar a representação no Parlamento Europeu dos grandes países que hoje já lá estão mais representados». Tanto João Ferreira como Marisa Matias reforçam que nas instituições europeias os seis maiores países representam mais de metade dos lugares do parlamento e mais de 70%dos votos da Comissão Europeia. «Aqueles que estão prejudicados, sobretudo os paíeses médios, vão perder ainda mais deputados, ter um poder decisório ainda menor do que já têm», acrescenta o eurodeputado comunista.

A representatividade é, para Assis, o principal ponto que tem de ser tido em conta antes da implementação. «Se houver um avanço no sentido da integração europeia, esse problema, a prazo, deixará de se colocar», explica o socialista que acredita que, no futuro, com a evolução do projeto europeu, «o facto de ser deste ou daquele país acabará por ser menos importante na determinação do lugar que vai ocupar na lista».

Para Rangel, as listas transnacionais, apesar de serem «uma ideia romântica», são algo «muito prejudicial para o equilíbrio entre os países grandes e os países médios e pequenos na Europa, em particular para Portugal». O eurodeputado recorda que «nos lugares elegíveis, os primeiros sete ou oito [elementos] das listas europeias vai ser uma pessoas de França, uma da Alemanha, uma da Itália, porque estes é que têm os eleitores]». Portugal, enquanto país médio, perderá o peso relativo. «Vamos dar mais deputados aos grandes e os países médios e pequenos ficam numa situação pior».

A tempo das eleições de 2019

O objetivo de colocar este mecanismo em prática já nas eleições europeias de 2019 é possível «em termos teóricos, na prática é complicado por causa dos prazos» afirma Marisa Matias. «Mas não é inviável», acrescenta. A eurodeputada explica que a proposta será debatida na respetiva comissão a 23 de janeiro, passando depois para o Parlamento Europeu onde será votada pelos eurodeputados e, por fim, terá de ser aprovada por unanimidade no Conselho Europeu. Aquestão «será sempre devolvida aos parlamento nacionais», continua Marisa Matias, que afirma que a seu tempo a Assembleia vai poder pronunciar-se sobre a alteração da lei eleitoral.

«Às tantas, quando a questão tiver de ser aprovada pela Assembleia da República», prevê Paulo Rangel, «vai levar com um chumbo e vai paralisar o processo europeu».

Para além disso, certos países, como Portugal, necessitam de um ano para poderem proceder à alteração da lei eleitoral nacional, sem a qual não pode ser implementado o mecanismo.

A utilização de listas transnacionais nas eleições de 2019 não é bem vista pelos eurodeputados socialistas portugueses. Assis acredita que «Macron perceberá, a seu tempo, que não há condições nenhumas para fazer isso daqui a um ano e meio». No entanto, Zorrinho ressalva que «a questão não é a data». «Não devemos ser contra o princípio, mas temos de ter consiciência que há muito trabalho para fazer para o poder aplicar», conclui. Aproposta que irá a votação está a ser preparada por dois eurodeputados, sendo um deles o socialista português Pedro Silva Pereira. O SOLtentou contactar o eurodeputado mas sem sucesso.