Procuradora ficou em gestão

A semana começou em beleza para o Governo, com António Costa, qual encarnação dos Reis Magos, a anunciar as boas novas. 

Em vez de ouro, incenso e mirra, há muito em desuso, cimentou com dados reais a sua célebre frase de que 2017 foi um «ano saboroso», ou seja, trouxe os números do défice para baixo do previsto (deve ficar em 1,2%), a taxa de desemprego será a mais baixa desde há anos (cerca de 8%), tudo resultante da excelente performance da economia, e ainda anunciou alto e bom som que a dívida pública tem baixado desde outubro face ao PIB, fixando-se no final do ano em cerca de 126,2%. Acho que o país tem sinceramente boas razões para festejar estas métricas. 

No entanto, tal como há anos o PS sustentava na oposição, tem de ‘haver vida para além do défice’, e a carga fiscal que atualmente ‘afoga’ os portugueses é efetivamente brutal em todos os impostos, diretos ou indiretos. 
A receita fiscal cresceu face a anos anteriores, e os últimos valores conhecidos já no último trimestre de 2017 refletiam um aumento global de cerca de 5,7% face a 2016. O IVA e o IRC tiveram um aumento significativo, bem como o IMI (lembram-se do adicional?), IsPP, ISV, contrabalançando o IRS, que registou uma descida. Vamos ver como se comporta a economia em 2018 para sustentar esta receita fiscal, sempre incerta.

Entretanto, a ministra Francisca Van Dunen inicia o ano de forma bem ativa. Começou por elogiar o programa dos «juízos de proximidade» e deu uma entrevista em que anunciou que o mandato doe procurador geral da República é «longo e único», causando perplexidade pela inoportunidade do tema, sobretudo coincidente com pressões de Angola sobre o sistema judicial português.

Mas vamos por partes. Proclamando o sucesso dos atuais 43 juízos de proximidade, depois da abertura há exatamente um ano de 20 novos juízos, juntando aos 23 que vinham de 2014 do tempo de Paula Teixeira da Cruz, consubstanciou raciocínios e conclusões com análises agregadas do funcionamento de todos os 43 juízos, com métricas de atendimentos, julgamentos, atos e pessoas envolvidas. 

Ora, só faltou uma coisa: isolar os números dos 20 juízos que abriu. Mesmo não duvidando do sucesso, era mais transparente ter fornecido dados segregados – porque, se de alguns dos juízos abertos desde 2014 haverá queixas de ausência de ‘clientes’, certamente que nestes juízos reabertos em janeiro 2017 também existirão decisões erradas. 
Aliás, os números do 1.º semestre assim o sugeriam, com 191 julgamentos apenas num total geral de 670 nos 43 juízos, sendo de notar que, em 12 destes ora reabertos, não se efetuaram sequer 10 julgamentos. Cá ficamos todos a aguardar pelo cumprimento da promessa feita de, após cuidada análise, serem tomadas decisões sobre os juízos que merecem continuar.

Sobre a questão do procurador geral da República e do anúncio precipitado da impossibilidade jurídica da sua não-recondução, devo referir que, não sendo jurista, me admirou a afirmação por ser, no mínimo, extemporânea, como logo de seguida Costa sublinhou. Mas ficou dito!… 

Parece ser inquestionável o enorme papel que a atual procuradora Joana Marques Vidal tem tido na credibilização da Justiça. Poderão alguns não gostar, mas uma certeza eu tenho: há hoje um ambiente de melhor justiça — e creio que muito se deve à sua atuação. Juristas conceituados opinam, em resposta à ministra, que o mandato em questão não será único, acrescentando que a nomeação compete ao Presidente da República sob proposta do Governo. Ou seja, pareceria de elementar bom senso não suscitar este tema agora, até porque o mandato apenas irá cessar em outubro. A infeliz consequência parece óbvia, tornando a procuradora mais frágil porque fica objetivamente demissionária no imediato.

P.S. 1 – Há uma epidemia de gripe e vemos os bastonários das ordens dos Médicos e dos Enfermeiros a chamar a atenção para a falta de condições dos hospitais. Ao que li, existe uma morosidade nas aprovações pelas Finanças dos pedidos efetuados para melhorar a operacionalidade dos serviços, que se reflete em atrasos no recrutamento de enfermeiros. Além disso, esconder-se-ão doentes acamados quando responsáveis governamentais visitam hospitais. As gripes têm, pois, a vantagem de se discutirem duas questões de fundo e bem atuais. Primeiro, a existência de cativações na saúde – que, como são ‘de esquerda’, ‘não colocam em causa o SNS’. A outra realidade bem portuguesa é o ‘fazer de conta’.

P.S. 2 – Depois dos profissionais da comunicação terem chegado ao futebol contribuindo com ‘novas armas’ para as guerras desportivas (no sentido literal da palavra), passaram também a controlar os treinadores dos 3 grandes que se engalfinharam a dirimir argumentos que só os desprestigiam pessoalmente. Quem se segue agora? Os jogadores ou a própria bola de jogo?