Indústria da pasta de papel responsável pela espuma branca no Tejo

Celtejo recusa quaisquer responsabilidades. Ambientalistas apelam a sanções

A origem da poluição do rio Tejo em Vila Velha de Ródão, concelho de Abrantes, foi ontem divulgada pelo presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Nuno Lacasta vai ao encontro das denúncias dos ambientalistas e responsabiliza as indústrias de pasta de papel. 

Depois de a APA ter realizado as necessárias diligências, nomeadamente análises e monitorização da situação, o presidente da instituição afirmou que o “acumular da carga orgânica nestas localizações” teve “origem nas indústrias de pasta de papel localizadas a montante”. 

O dirigente acrescentou ainda que a elevada concentração de carga orgânica, da qual espuma espessa registada na semana passada foi o sinal mais visível, foi o resultado de vários fatores. Na próxima semana o ministério do Ambiente vai proceder à avaliação de quais as medidas necessárias para se garantir a redução de descargas provenientes da fábrica de celulose Celtejo. 

Opinião diferente tem a empresa, que rejeita quaisquer responsabilidades na poluição do rio Tejo. “A Celtejo é completamente alheia ao que tem surgido [no Tejo]. Não temos qualquer anomalia ou qualquer descarga e a produção ao longo das últimas semanas tem sido estável”, garantiu Soares Gonçalves,  diretor de Qualidade e Ambiente da Celtejo. 

O diretor referiu ainda que a nova ETAR da empresa é a mais moderna do país, utilizando tecnologia avançada de ultra filtração por membranas, a que se juntam três reatores com capacidade total de 36 mil metros cúbicos. Além da Celtejo, também a Navigator, a Paper Prime e as queijarias de Vila Velha de Ródão usufruem das instalações. 
A ETAR em questão começou a trabalhar a 29 de setembro de 2017, representando um investimento na ordem de 12 milhões de euros, segundo Soares Gonçalves. 

A Celtejo não se limitou a afastar quaisquer responsabilidades, aproveitando também a ocasião para criticar as recentes medidas do governo nesta questão. “A fábrica não pode continuar nestas condições. Deixa de ser viável se continuar assim”, disse Sofia Jorge, engenheira da fábrica, em declarações ao “Jornal de Notícias”. E deixou suspeições sobre outros possíveis responsáveis: “Não estamos aqui para acusar ninguém, mas muita coisa ao longo do rio deve ser verificada”. 

Já a Protejo, organização que denunciou o aparecimento da espuma no rio, reagiu afirmando que as declarações do presidente da APA apenas vieram confirmar o que denunciavam desde 2015. “Aquilo que foi constatado é que esse incidente foi o resultado das descargas da indústria da celulose. Veio apenas confirmar o que dizemos desde 2015”, disse Paulo Constantino, porta-voz da organização, ao i. Ainda assim, o dirigente reforçou que este incidente foi apenas mais um entre vários que aconteceram no passado, sendo que a diferença foi que, neste último, a espuma, por ser mais visível, teve maior repercussão. 

Referindo-se às declarações da engenheira da Celtejo, Constantino afirmou que “o caudal  das descargas e afluentes deve ser aquele que a empresa tem a capacidade para assegurar o devido tratamento”. Os ativistas não se opõem às descargas de afluentes pela empresa, “desde que devolvam a água com qualidade para se assegurar o bom estado ecológico do rio”. 

Os ambientalistas esperam ainda que o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, “reveja a licença que a APA concedeu à Celtejo” por “terem valores [poluentes] mais elevados do que deveriam ser”, nomeadamente o valor da carência bioquímica de oxigénio, que foi aumentado provisoriamente para o triplo. 

Os ativistas não defendem apenas medidas que resguardem o rio da poluição, mas também medidas sancionatórias para os responsáveis pela degradação do rio. “Não basta que as análises permitam dizer que os responsáveis são as empresas de celulose, é preciso identificar os responsáveis de forma a que se tomem medidas de prevenção e de reparação pelos danos ambientais causados”, afirmou Paulo Constantino, que denunciou ainda a mortandade de peixes na zona a 2 de novembro sem que nenhuma diligência tenha sido feita pelas autoridades.

Na semana passada, o Ministério Público abriu um inquérito na sequência de uma queixa crime de poluição do rio apresentada pelo Ministério do Ambiente. 

O MP está a ser auxiliado pela Polícia Judiciária de Coimbra e pela Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território. As empresas visadas são a Celtejo, a Navigator e a Paper Prime.  

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