Flores que não murcham

A paixão de Calouste Gulbenkian pela natureza reflete-se na sua coleção. A exposição As Flores do Imperador,  na FCG, mostra como, na arte e na botânica, Ocidente e Oriente se fecundaram mutuamente.

«No final do século XV os europeus pensavam que já conheciam todas as plantas que era necessário conhecer», começa Teresa Nobre de Carvalho, curadora da exposição As Flores do Imperador, patente até 21 de maio no Museu Gulbenkian. Por essa altura, recorria-se ainda ao que os autores da Antiguidade tinham escrito sobre a flora e as plantas, e a sua representação, em particular, eram ainda indissociáveis do simbolismo que tinham adquirido ao longo da Idade Média. «Mas o início do século XVI vai mudar radicalmente esta postura, principalmente pelas viagens de exploração à América e à Ásia», que obrigaram a «revisitar a própria natureza europeia».

A exposição da Gulbenkian «tem como ponto de partida tapetes do século XVII, da Índia Mogol, que apresentam uma decoração específica de cariz naturalista. Esta exposição é a história de como se chegou a esse tipo de decoração», esclarece Clara Serra, também curadora. Para contar esssa história,  é inevitável recordar as grandes viagens de exploração marítima dos portugueses, que, chegados a terras distantes, «se depararam com uma realidade muito diferente, uma natureza exuberante, que eles desconheciam», continua Clara Serra. «A partir dessa altura, começam a chegar aos portos europeus variados produtos até então desconhecidos, entre eles sementes de plantas e bolbos de espécies que eram desconhecidas na Europa. Essas sementes e bolbos foram desde logo aclimatados, plantados e descritos por botânicos e por estudiosos, o que deu origem aos álbuns profusamente decorados que circularam pela Europa e chegaram ao império mogol», que dominou o subcontinente indiano entre o século XVI e o início do século XVIII.

Uma vez ali integrados, os livros e gravuras europeus fecundaram o imaginário indiano, levando os artistas e tapeceiros locais a representar as flores (fosse em miniaturas, fosse em cerâmica, fosse em tapetes) de forma mais naturalista e realista do que até então.

As peças centrais da exposição são dois tapetes do século XVII, de grandes dimensões (possivelmente de Lahore, hoje Paquistão), que se encontravam no palacete de Calouste Gulbenkian em Paris – o segundo dos quais mais puído, talvez em virtude de atapetar o hall de entrada. Como explicam as curadoras, no Oriente os têxteis assumiam um papel de grande relevo nos ambientes palacianos, revestindo quase todas as superfícies à vista. E os tapetes, em particular, eram sinónimo de opulência e prestígio, ostentando na sua decoração jardins paradisíacos de flores que não murcham.