Estratégia do lítio sem consultar câmaras

Obrigação de concursos públicos e benefício para criação de unidades industriais estão entre as linhas de orientação do Governo. Há mais de 30 pedidos de prospeção e exploração.

O Governo apresentou no início da semana passada, em Bruxelas, a Estratégia Nacional para o Lítio, numa reunião de alto nível com os Estados-membros da União Europeia interessados no desenvolvimento e produção de baterias, nomeadamente de lítio.

Portugal tem uma das maiores reservas de lítio da Europa, minério que é usado no fabrico de baterias a utilizar na indústria automóvel e no armazenamento de eletricidade, bem como na indústria da cerâmica e vidro. 

No mercado nacional, são nove as regiões identificadas com ocorrência de mineralizações de lítio, concentradas no centro e Norte do país: Serra de Arga, Barroso-Alvão, Seixoso-Vieiros, Almendra, Barca de Alva-Escalhão, Massueime, Guarda, Argemela e Segura.

Dessas zonas, as mais concorridas são as de Covas de Barroso, com nove pedidos de exploração, e Almendra, distrito da Guarda, com sete pedidos. A Guarda é uma das zonas de maior potencial e em comunicado o presidente da Câmara Municipal local lamentou que o Executivo tenha apresentado a estratégia «para a fileira do lítio sem ter havido nenhum diálogo com o município da Guarda».

Segundo Álvaro Almeida, o Plano Estratégico para o setor devia «ter sido assumido como um importante motor de desenvolvimento, mas assumido por todos». O autarca do PSD afirma que «um Plano Estratégico deve ser nacional, deve ser do país» e acrescenta que apresentará ao Governo este seu protesto. Almeida exige «ser ouvido» em relação a todo o desenvolvimento do plano, considerando que «está em causa a exploração de um recurso natural muito importante para a Guarda e para toda a região».

Importância europeia De acordo com o secretário-geral do Observatório Internacional de Recursos Minerais, embora Portugal «não tenha uma grande jazida, [o país] tem muitos depósitos de dimensões médias que, no seu todo, assumem importância à escala europeia». Vítor Correia, que lidera o observatório sediado em Bruxelas, afirmou à TSF que a «Europa percebeu que, se não investisse nas matérias-primas necessárias para a produção de baterias, colocaria em risco alguns setores industriais importantes, nomeadamente a indústria automóvel». 

A procura global do lítio para utilização nas baterias dos automóveis elétricos tem multiplicado os projetos, e a reunião europeia do início da semana, designada Aliança Europeia para as Baterias, teve como objetivo discutir projetos integrados, identificar e mobilizar apoios, em particular fundos comunitários, para avançar com o projeto, também já discutido com várias empresas.

Na reunião, o secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, apresentou a estratégia portuguesa para o lítio, que tem como objetivo aproveitar a crescente procura no país para desenvolver uma atividade industrial, de processamento de minério, de produção nas diversas indústrias que aproveitam o minério e de I&D.

«O que estamos a fazer é a olhar para este recurso como um recurso importante e queremos alterar a forma como são dadas as concessões nesta área», afirmou o ministro da Economia, Caldeira Cabral, quando anunciou em setembro a a preparação do plano. Seguro Sanches, acrescentou que o objetivo do Governo é «criar riqueza, […] mas fazê-lo com o melhor interesse para o Estado». 

Nas linhas de orientação estratégica para o lítio definidas pelo Governo, destaque para a «dinamização de concursos públicos para a atribuição de licenças de prospeção e de pesquisa, bem como para a respetiva exploração, sobre áreas previamente delimitadas como relevando potencial e contendo alvos promissores». Até agora, para se iniciar a prospeção do território bastava pedir uma licença. 

A resolução do Conselho de Ministros estipula que os concorrentes avaliem as oportunidades de instalar em Portugal duas unidades tecnológicas. A primeira seria uma unidade experimental minero-metalúrgica para desenvolver conhecimento e testar tecnologias para toda a cadeia de valorização dos recursos.

A segunda seria uma unidade-piloto de demonstração, «de caráter declaradamente industrial, processando minérios ou concentrados de várias origens e destinada a avaliar os custos de produção em ambiente industrial».

Na Direção-geral de Energia e Geologia há 30 pedidos de direitos de prospeção e pesquisa de lítio no país, que representam cerca de 3,8 milhões de euros de propostas de investimento nos primeiros dois a três anos, numa área total de 2.500 quilómetros quadrados. Em 2016, as reservas de lítio em Portugal estavam estimadas em 60 mil toneladas métricas.