Carlos Abreu Amorim. ‘Se não ganhar as eleições, Rio terá muita dificuldade em manter-se’

Carlos Abreu Amorim, vice-presidente do grupo parlamentar, desde 2011, critica duramente a estratégia de Rui Rio. O social-democrata teme que o PSD seja penalizado nas urnas.

Anunciou esta semana que não estava disponível para continuar na vice-presidência do grupo parlamentar. O que o fez antecipar-se e assumir essa posição? 

Eu não estou disponível para exercer qualquer cargo diretivo no partido enquanto Rui Rio mantiver esta estratégia e, por outro lado, diziam-me que uma das dificuldades para que o atual líder do grupo parlamentar permanecesse era o facto de existirem alguns vice-presidentes que não teriam a aprovação de Rui Rio. E, portanto, quis demitir-me para sair da frente e não ser um empecilho para ninguém. Quis ajudar a que a solução fosse a manutenção de Hugo Soares como líder da bancada.

Fernando Negrão anunciou esta semana que vai candidatar-se com o apoio do novo líder. Acha que Rui Rio fez mal em substituir a liderança do grupo parlamentar?

Foi um erro grave. Foi o primeiro, mas espero que seja o último. Foi um erro grave, porque Hugo Soares era consensual e tem tido um bom desempenho nos debates com António Costa. 

O que o separa da estratégia de Rui Rio para o PSD?

A estratégia de Rui Rio tem dois vetores fundamentais: em primeiro lugar, o PSD deverá ser um partido de cooperação com o PS e deve coadjuvar o governo na sua tarefa. O segundo vetor político desta estratégia é que o PSD deve, no caso de não vencer as próximas legislativas, estar em condições de viabilizar um governo do PS. O Ricardo Araújo Pereira disse com muita piada que o PS passa a ser o arroz. Os portugueses ou comem arroz com feijão ou arroz com batatas, mas o arroz está lá sempre. Ou seja, o PSD, de acordo com a moção de estratégia global e pela interpretação autêntica que foi feita pelos apoiantes mais próximos de Rui Rio, passará a ser um partido que abdica da sua missão primordial que é ser alternativa de governo. Não é a primeira vez que isto acontece no PSD. Isto já aconteceu, nos anos 70, com as Opções Inadiáveis, e, nos anos 80, com o Bloco Central. 

Em condições diferentes…

Sim, mas Sá Carneiro acabou com essas veleidades estratégicas com a criação da AD e Cavaco Silva acabou com o Bloco Central. Isto não é novo. Os militantes querem que o PSD tenha um projeto próprio, autêntico e vencedor. A segunda consequência desta estratégia é que o PSD abdica de, como prioridade primordial, vencer as próximas eleições. Isso é inaceitável. O PSD tem de vencer as próximas eleições e tem de partir, a um ano e meio de distância, com essa crença absoluta de que as vai vencer.

Rui Rio nunca disse que não as quer vencer e até falou em maioria absoluta…

Mas quando os seus apoiantes mais próximos passam a mensagem reiterada de que esta liderança tem de manter-se, mesmo perdendo as eleições, há uma admissão, à partida, de derrota a que o eleitorado não é imune. As pessoas percebem que há uma mensagem de derrota antecipada. Isso  só prejudica eleitoralmente o PSD. Nós ganhamos as duas últimas eleições legislativas. Nesta última, em 2015, contra tudo e contra todas as previsões, e temos obrigação de ganhar as próximas eleições. Largar essa prioridade absoluta, dizendo que eventualmente se não ganharmos as portas estão abertas para entendimentos com o PS é levar os eleitores flutuantes que circulam entre o PS e o PSD a escolher o PS. Esse é o sonho de António Costa.

O que acha que António Costa pretende do PSD?

Ele anexou o Bloco de Esquerda e o PCP e, se esta estratégia acabar por ir para a frente, António Costa vai fazer exatamente o mesmo ao PSD. Podemos ter um panorama aterrador no final das próximas eleições legislativas que é o PS não ganhar com maioria absoluta e ter de escolher entre o Bloco de Esquerda e um PSD menorizado. Os dois a rivalizarem quem é que vai partilhar o poder com o Partido Socialista.

O que está a dizer é que o PSD vai perder as eleições com esta estratégia?

Não estou a dizer isso. Quem indica esse caminho, quem abre essa porta, que o PSD nunca deveria abrir, é a própria moção de estratégia global de Rui Rio e aqueles que a defendem. Se partirmos com uma confissão antecipada de derrota por que razão é que o eleitorado há de votar no PSD? Não consigo compreender. O PSD não é um partido pequeno. Temo que Rui Rio vá dar uma tática ao PSD como um treinador de equipa pequena. O PSD só sobrevive se for grande. A utilidade do PSD, para o eleitor médio do partido, é ser alternativa à esquerda. A minha grande esperança para o congresso é que esta estratégia seja corrigida. 

Mas os militantes votaram a estratégia de Rui Rio nas eleições diretas…

Os militantes votaram sobretudo nas figuras. Julgo que, neste momento, é inevitável fazer, não apenas por causa desta eleições, mas por causa de todo o percurso das diretas, um juízo muito negativo deste modelo. Muito negativo. As eleições diretas foram uma grande esperança, mas têm feito brotar o pior que existe na política. O que nós fizemos foi transportar o pior do caciquismo e o caciquismo é o pior que tem a democracia que vive do voto. O caciquismo, o fenómeno das quotas pagas, tudo aquilo que tem a ver com o lado mais perverso da democracia, faz com que algumas pessoas apareçam como figuras políticas, porque têm um saco de votos nesta ou naquela freguesia. Não foi para isto que se fizeram as diretas e acho que o PSD deve refletir sinceramente se deve continuar com as diretas como modo de eleição do líder do partido. 

Rui Rio tem condições para continuar na liderança se não ganhar as legislativas?

Todo o esforço tático que está a ser feito pelos apoiantes de Rui Rio vai no sentido de passar a mensagem de que não é obrigatório que o PSD ganhe as próximas eleições. Isso é errado. A segunda mensagem é que Rui Rio deve continuar, mesmo no caso de perder as eleições. Os congressos são de dois em dois anos e o congresso será alguns meses depois das legislativas. 

Se o PSD perder aparecerá, naturalmente, outro candidato…

Tenho a certeza absoluta que se Rui Rio não cumprir a sua primeira obrigação, que é ganhar as próximas legislativas, terá muita dificuldade em manter-se como líder do PSD. Embora pareça ser essa a sua vontade. Tanto parece ser essa a sua vontade que parece ter esquecido que a sua primeira prioridade é ganhar e só depois manter-se. A sua prioridade é manter-se e só depois ganhar. Há aqui uma inversão de prioridades. Espero que o próximo congresso clarifique que o PSD está, neste momento, preparado para vencer as eleições diferenciando-se do projeto de António Costa.