Costa manda acalmar PCP e BE

Costa está a gerir a abertura de Rio para consensos com todas as cautelas. A reação da esquerda obrigou o PS a garantir que o PSD não é um aliado.

António Costa quer consensos com o PSD, sobretudo em temas como a descentralização, mas também sabe que é impossível aprofundar a relação com a direita sem abrir feridas à Esquerda. É este equilíbrio que o primeiro-ministro terá de gerir nos próximos tempos, mas, para já, importa acalmar os parceiros que apoiam o Governo.

O encontro «muito cortês» com Rui Rio não agradou à Esquerda. O PS viu-se obrigado a separar as águas entre o PSD, que é «apenas um interlocutor», e «os nossos aliados», que são os partidos à Esquerda. Coube a Carlos César, perante o evidente desconforto dos partidos que apoiam o Governo, deixar claro que o diálogo com Rui Rio está longe de tornar o PSD num «aliado». O líder parlamentar do PS foi mais longe e garantiu que a geringonça «é repetível» se o Bloco e PCP quiserem renovar a aliança a seguir às eleições de 2019.

António Costa tem gerido a relação com o novo PSD com todas as cautelas. «É preciso separar bem e distinguir bem o que é que está em causa. Quanto à solução de Governo, está encontrada. É uma solução que funciona bem (…) Não há nenhuma razão para mudar nada», disse, após o encontro com Rui Rio e quando foi questionado sobre se um eventual acordo com o PSD poderia enervar a Esquerda. Não deixou, porém, de insistir que são desejáveis consensos em relação aos fundos comunitários, e à descentralização. «Há sempre o tempo de semear e depois o tempo de crescer, mas vamos ver como é que as coisas correm. Foi uma conversa muito simpática, muito cortês, muito construtiva», acrescentou o primeiro-ministro, que já tinha dito que a relação entre o governo e o PSD será «melhor» com Rui Rio na liderança.

Socialistas garantem que ‘não há namoro nenhum’

Os socialistas desdramatizam as críticas do PCP e do BE. «Não há namoro nenhum», disse João Galamba, na SIC-Notícias. O deputado socialista considera que a abertura para o diálogo representa apenas «o regresso a uma certa normalidade democrática» e «não há nenhuma ameaça aos acordos à esquerda. O objetivo é incluir todos os partidos, não é esquecer que existem os acordos à esquerda e procurar novos acordos». Tiago Barbosa Ribeiro também considera que são desejáveis acordos em «áreas transversais e envolvendo todos os agentes», mas «sem excluir» os parceiros do Governo.

O deputado socialista André Pinotes Batista levanta outro problema e tem dúvidas de que seja possível dialogar com um PSD partido ao meio. «Um partido que anunciou que estava unido e entrou numa guerra civil não é um parceiro de diálogo fiável. Se não conseguem dialogar entre eles como é que vão poder dialogar seja com quem for?» . No Parlamento, a número dois do partido, Ana Catarina Mendes, também se distanciou de Rui Rio com a garantia de que «o PSD continua a ser o mesmo PSD de sempre». A geringonça esteve unida nas críticas ao congresso que consagrou Rui Rio. O líder parlamentar do PCP, João Oliveira, defendeu que o PSD está a protagonizar «uma tentativa de apagamento da memória», mas «mantém a mesma orientação».

O nervosismo da Esquerda e o ‘inimigo de classe’

Mesmo dentro do PS existem maneiras diferentes de olhar para o diálogo com o PSD. Francisco Assis, um dos principais adversários da geringonça, viu na eleição do ex-autarca do Porto o início de uma «nova fase» da vida política. Num artigo no Público, o eurodeputado socialista reafirma que «o futuro da Esquerda democrática e liberal portuguesa não passa pela manutenção dos entendimentos contranatura, que só circunstâncias excecionais tornaram possíveis».

Ao contrário de Assis, Jorge Coelho nunca foi crítico da aliança à Esquerda e acha que tem «funcionado bem», mas, na Quadratura do Círculo, na SIC, assumiu que «não há nenhuma reforma de fundo a ser desenvolvida pela atual plataforma política». O ex-ministro socialista compreende que «o PCP e o Bloco fiquem um pouco nervosos com isto, mas o país tem de ser governado e ultrapassar um conjunto de questões para potenciar o seu desenvolvimento de forma normal».

As divergências entre a Esquerda acabaram por ficar para segundo plano perante a crise que se abriu no grupo parlamentar do PSD. A Vital Moreira não passou, porém, despercebida a crítica do PCP de que «os desenvolvimentos entretanto verificados mostram que o PS e o seu Governo, no quadro da suas opções de classe ao serviço do grande capital, não perde oportunidade para convergir com o PSD e o CDS» (ver texto ao lado). O ex-eurodeputado do PS, que saiu do PCP há mais de 20 anos e se aproximou do PS, escreve, no blogue Causa Nossa, que «esta passagem do editorial do último número do jornal oficial do PCP não deixa dúvidas de que na visão comunista o PS e o Governo representam o ‘inimigo de classe’, uma das mais graves acusações políticas no jargão do PCP».