Hylas e os Presos Políticos espanhóis

Duas obras com séculos de hiato a partilhar o mesmo véu em dois tons.

Há umas semanas, foi notícia a retirada de uma galeria em Manchester de um quadro de John William Waterhouse, pintor inglês conhecido pelo estilo pré-rafaelita, uma corrente que pregava uma arte sem a interferência da Academia. O quadro, Hylas and the Nymph [Hilas e As Ninfas] é considerado um dos expoentes desse período do final do século XIX e retrata uma cena mitológica contada na viagem de Jasão e os Argonautas. Num lago, Hylas, pintado como um jovem homem, é seduzido por sete ninfas, retratadas no corpo de mulheres muito jovens, despidas. A galeria explicou que a remoção – temporária – do quadro faz, por si só, parte de uma exposição de uma artista contemporânea e que, seguindo o rastilho dos escândalos de assédio sexual, seria usada para perceber como devem estas «fantasias vitorianas» ser apresentadas de «maneiras relevantes para o século XXI».

Na semana passada, logo no primeiro dia da Arco Madrid, a obra Presos Políticos na Espanha Contemporânea – 24 fotografias pixelizadas referentes a presos políticos cujos comentários, alinhamentos políticos e ações foram decretadas inaceitáveis pelos tribunais – da autoria do artista espanhol Santiago Sierra, foi banida sem aviso por ser considerada demasiado polémica.

O ato, amplamente criticado, teve um desenlace que pôs um sorrisinho trocista nos lábios: a obra foi adquirida por um magnata catalão que a ofereceu ao Museu de Lldeia e foi direitinha de Madrid para a Catalunha.

Duas obras com séculos de hiato a partilhar o mesmo véu em dois tons. Uma foi vítima de um livro de estilo aberto na página do assédio sexual e do politicamente correto; a outra levou com uma pedrada na tola da censura, traçando assim um quase regresso à «era medieval», disse um perplexo Santiago Sierra.