Sim, senhor primeiro-ministro

António Costa tem razão no diagnóstico: o mal está no salário médio

Tem o senhor primeiro-ministro muita razão: um dos maiores problemas do país está no salário médio e não no salário mínimo. A denúncia chega com atraso… mas acerta na mouche!

Finalmente fez-se luz no gabinete de S. Bento. Pena foi que o chefe do Governo não tivesse denunciado a causa: a ‘santa aliança’ entre patrões e sindicatos, responsável pelos dois cancros que minam o mundo laboral – a precariedade e os salários baixos. 

Ambos sabem que é a massa salarial que pesa nos custos das empresas. Daí que, continuando a existir via aberta para despedimentos e rescisões apelidadas de ‘mútuo acordo’, as guerras sobre o salário mínimo são o embuste preparado para oferecer vitórias aos sindicatos, que servem para tapar o sol com a peneira. 

O mal vem depois: há salário mínimo garantido, mas emprego nem vê-lo – salvo em estágios fictícios e no abuso dos contratos a prazo. As exceções só se encontram numas poucas multinacionais, obrigadas às regras da casa-mãe, e em setores onde existem sindicatos de quadros, como é o caso da Função Pública, da aviação comercial ou da banca. 

As lágrimas provocadas pela emigração dos jovens mais qualificados são de crocodilo. O fenómeno não resulta de uma moda, mas da desistência de quem descobre que o ‘sistema’ exclui coisas básicas como a valorização, a progressão na carreira e a compensação justa. O resultado é o óbvio: sem segurança no emprego e salário compatível… não pode haver planos para o futuro.

O alarme soou no dia em que o primeiro-ministro se deu conta da quebra na receita do IRS, do rombo nas contribuições para a Segurança Social e dos aumentos de despesa no Fundo de Desemprego, mas o verdadeiro choque veio quando o PCP e o BE aumentaram as exigências de investimento público e ouviu a sentença do Ministério da Finanças: «Não há dinheiro! Se não há poupança, só pode haver investimento com mais dívida, e isso a Europa não deixa!». Há muitos anos que as famílias não poupam, porque não podem, e o Estado, pelo seu lado, arrasta défices que ninguém se dispõe a enfrentar.

António Costa tem razão no diagnóstico: o mal está no salário médio. E deveria ter acrescentado: e também na doença endémica da precariedade, que continua a alastrar sem limites que a detenham. 

Mas sobra um problema: para curar a doença, terá de levar os ‘sócios’ que o apoiam a mudarem de agulha. O êxodo dos mais preparados está a arruinar a economia – nas contas públicas, como nas privadas – mas está igualmente a causar enormes danos na ciência, na cultura, no ensino e na modernização do Estado. 

Para reverter a situação, o primeiro-ministro vai ter de usar os seus dotes de persuasão para convencer a esquerda parlamentar – a começar pelo PS – de que os ‘salários burgueses’ não são um mal mas uma condição para o desenvolvimento. Se não o conseguir, em coerência, terá de riscar da lista dos objetivos do Governo, pelo menos, aquele que promete a subida de 40 para 60% de jovens a frequentar o ensino universitário. Afinal, ir para a universidade… para quê?