Uma guerra comercial?

Não se pode falar de risco material para a segurança nacional dos Estados Unidos.

O controverso Presidente americano voltou a fazer das suas. Desta feita disparou o primeiro tiro no que muitos consideram ser o começo de uma guerra comercial entre nações. Fê-lo ao anunciar a imposição de tarifas aduaneiras de 10 e 25% sobre o preço das importações de aço e alumínio. A Europa seguiu o guião lógico e retaliou, ameaçando com barreiras semelhantes às ‘motas e jeans americanas’, entre outros produtos. Esta sequência de eventos poderia muito bem ser o prelúdio do regresso aos tempos do protecionismo, porém existem pistas que indicam ser mais provável tratar-se de mais um espetáculo mediático com objetivos negociais e de propaganda política.

Os Estados Unidos de Trump alegam que a decisão se baseia em riscos para a segurança nacional de uma dependência excessiva em aço estrangeiro. Esta justificação é falsa. A economia americana satisfaz a maioria das suas necessidades por via de produção interna – importando apenas cerca de 30% do bolo total – sendo o setor militar integralmente fornecido por fontes domésticas. Logo, não se pode falar de risco material para a segurança nacional. Outra nuance interessante é o facto de o país que tem sido mais atacado pela retórica protecionista de Trump – a China – não ser aquele que teoricamente sofreria mais por via destas medidas. Isto porque países como o Canadá, México e Coreia do Sul – com os quais os EUA tem inclusive acordos de comércio livre – exportam significativamente mais aço para solo americano que os chineses. Das duas uma: ou Trump irá diluir significativamente o impacto desta decisão criando regimes de exceção para alguns ou irá rasgar esses acordos unilateralmente.

Considero mais provável criarem-se exceções após alguma negociação, sendo estas posteriormente vendidas à base de apoio eleitoral como uma magnífica vitória patriótica. Isto porque mesmo em termos de proteção de empregos americanos estas medidas protecionistas provavelmente gerariam mais perdas de postos do que aqueles que salvaguardam nos setores do aço e alumínio. O previsível aumento do preço do aço nessas circunstâncias – matéria prima essencial para outros setores relevantes como o automóvel e construção – causaria uma redução dos respetivos níveis de produção, sacrificando assim uma porção de postos de trabalho ao altar da proteção dos trabalhadores do aço. Seria um simples exercício de distribuição arbitrária de vencedores e perdedores e não uma ação que visasse o aumento de emprego geral. Mais, o protecionismo, com a sua dinâmica de aumento de preços é um claro inimigo das classes menos favorecidas ao atacar ferozmente o respetivo poder de compra, sendo assim irónicos os tiques protecionistas que se detetam por essa esquerda europeia fora.

Apesar de todo o alarido, a visão mercantilista que Trump tem do comércio internacional e a sua abordagem negocial agressiva não o deverão impedir de assinar novos acordos que estejam dentro da razoabilidade. As perdas para ambos os lados de uma guerra comercial aberta são tão óbvias que os incentivos ajudam ao compromisso final. Pelo caminho haverá muitas ameaças de parte a parte, medidas pouco materiais ‘para base eleitoral ver’ e surtos de nervosismo pontual.

*Gestor de portfolio multi-activo no BIG – Banco de Investimento Global