Rescisões e reformas: o assédio moral não é uma opção

Há cerca de 15 dias foi tornado público que o Novo Banco vai antecipar para o final do corrente ano a redução de trabalhadores prevista inicialmente até 2021, pelo que até Dezembro se prevê avançar com um processo de rescisões voluntárias e de reformas antecipadas que deverá levar à saída de mais de 400 trabalhadores…

Há cerca de 15 dias foi tornado público que o Novo Banco vai antecipar para o final do corrente ano a redução de trabalhadores prevista inicialmente até 2021, pelo que até Dezembro se prevê avançar com um processo de rescisões voluntárias e de reformas antecipadas que deverá levar à saída de mais de 400 trabalhadores e ao fecho de 73 balcões. A Caixa Geral de Depósitos (CGD), entretanto, prossegue também ao longo deste ano o seu ambicioso e duro programa de rescisões por mútuo acordo, de reformas antecipadas e de encerramento de balcões.

Num caso como no noutro, estamos a falar de programas de reconversão dos bancos que foram decididos nos corredores de Bruxelas pela burocracia comunitária, em processos de decisão opacos, sem escrutínio público e sem qualquer responsabilização. Os calendários foram definidos a regra e esquadro, doa a quem doer (trabalhadores, clientes e contribuintes) e qualquer desvio impõe duras medidas adicionais, num processo sem especial sensibilidade social ou política.

No caso da CGD, como no do Novo Banco, tem sido evidente a pressão externa para que se atinjam os objectivos negociados entre o Estado português e a Comissão Europeia para a drástica redução de trabalhadores, eles que são o elo mais fraco nesta cadeia alimentar.

É (também) por isso que em boa hora entrou em vigor, em Outubro de 2017, o quadro legislativo para a prevenção da prática de assédio moral, i.e. a exposição de um trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, de forma continuada, no exercício das suas funções.

Naturalmente, o sector da banca não está imune a este problema, antes pelo contrário, e o assédio moral é uma questão que há muito me preocupa. Tanto que assim é que, na qualidade de presidente do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), estive pessoalmente envolvido, sensibilizando e dando contributos concretos aos actores políticos relevantes no processo legislativo, para que o assédio moral fosse criminalizado.

A decisão de criminalizar o assédio moral constituiu um evidente sinal de progresso civilizacional. Será quase desnecessário dizer que assisti com muita satisfação à entrada em vigor da nova lei e à consagração de mudanças muito positivas, algumas delas com o nosso contributo, no Código do Trabalho.

Ora, numa altura em que se prepara uma nova vaga de rescisões voluntárias e de reformas antecipadas na CGD e no Novo Banco, queria deixar claro que estaremos particularmente vigilantes ao que se irá passar. Naturalmente, não temos qualquer obstáculo de princípio ou filosófico a rescisões por mútuo acordo, ou reformas antecipadas, se essa for a genuína vontade das duas partes.

No entanto, estamos perfeitamente conscientes das pressões a que as administrações dos bancos estão sujeitas e das repercussões que tal pode ter nos processos de decisão. Que fique bem claro: os trabalhadores têm o direito de decidir o seu futuro num processo livre, informado, isento de pressão e, sobretudo, imune ao assédio moral. Se tal não acontecer, cá estaremos para recorrer aos mecanismos legais que estão ao nosso alcance e que em boa hora a lei recentemente consagrou.

Paulo Gonçalves Marcos

Presidente do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB)