DGArtes. “Este concurso está feito e tem de seguir”

Ministro foi ao parlamento esclarecer os deputados sobre a polémica em torno do novo modelo de apoio às artes. Secretário de Estado admitiu possibilidade de abertura de uma segunda fase de audiência prévia pela DGArtes

Depois de uma semana de contestação a culminar num protesto que nem dois reforços orçamentais anunciados como solução para os polémicos resultados dos concursos do apoio sustentado às artes foram capazes de travar, o ministro da Cultura regressou à Comissão Parlamentar de Cultura, numa audição pedida com caráter de urgência pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, a tentar pôr um ponto final ao que chamou de “desinformação” em torno de um modelo e de um concurso que “está feito e tem que seguir”.

Mas, ao longo das duas horas em que respondeu aos deputados das várias bancadas parlamentares, Luís Filipe Castro Mendes sublinhou, por várias vezes, que se trata de um modelo “evolutivo”.

“Como é um modelo evolutivo, tem de ser repensado. Dissemos sempre que o modelo é para ser pensado com o setor. É para pensar e reavaliar, mas sempre foi.” Ao longo de duas horas de críticas da oposição ao novo modelo de apoio sustentado às artes, de que esta tutela fez bandeira, também o secretário de Estado, Miguel Honrado, foi reafirmando que se trata de um modelo pensado em conjunto com o setor. “Com todos os elementos que possam ser corrigidos, este concurso é o corolário de um trabalho que foi feito com o setor”, sustentou o secretário de Estado, sugerindo que se comparassem os regulamentos inicialmente postos a consulta com os regulamentos finais para o novo modelo de apoio às artes.

“Desculpem, não foram escutados?”, indignava-se Honrado em resposta à deputada comunista Ana Mesquita, que na sua intervenção reafirmou aquela que tem sido a exigência do PCP desde a discussão do OE: um orçamento anual para os apoios da DGArtes não equivalente ao de 2009 (após os reforços, para 2018 o montante global para os apoios bienais e quadrienais é de 21,35 milhões de euros, contra os 21 milhões daquele ano), mas de 25 milhões. “Muitas das entidades foram escutadas e os seus contributos foram integrados”, acrescentou o secretário de Estado, sublinhando também ele, por várias vezes, que se trata de um modelo desenhado justamente de forma a poder ser mais facilmente alterado.

Nas respostas aos deputados, o ministro foi-se escudando nas 15 páginas de gráficos que levou à Assembleia da República com as linhas mestras do novo modelo, os critérios de apreciação das candidaturas e toda a evolução dos apoios às artes de 2009 ao quadriénio em discussão (2018-2021), bem como vários dados estatísticos sobre os resultados – alguns deles, como é o caso do teatro, ainda provisórios – que geraram a polémica. Sublinharam então, ministro e secretário de Estado, que, após os dois reforços anunciados, de 2 e 2,2 milhões de euros, o orçamento disponível para 2018, que ascende agora a 21,35 milhões de euros supera já os 21 milhões orçamentados em 2009 – ano que tem sido apontado como meta por corresponder ao período anterior à intervenção da troika.

A “multiplicação dos centímetros” Da oposição, viria o reparo de que supera, mas só agora. “Se tivesse aqui os vários saltinhos… Os apoios não saltaram desta coluna [14,2 milhões, em 2017] para esta [21,35 milhões para 2018, depois dos reforços anunciados depois de a 30 de março se terem conhecido os resultados do concurso para os apoios ao teatro]”, criticou João de Almeida, do CDS. A partir dos gráficos que o ministro levou à comissão, também do lado do CDS, tinha já vindo um outro reparo para gargalhada (quase) geral, quando a deputada Vânia Dias da Silva notou que as barras correspondentes aos montantes dos apoios entre os anos 2012 e 2017 vinham a uma escala menor. “Se a multiplicação do dinheiro fosse simétrica ao milagre da multiplicação dos centímetros… Os apoios não deixam de ser o dobro”, disse, referindo-se aos magros 11,8 milhões de 2012. “Não são é nove vezes maiores como pretende demonstrar esta coluna.”

De acordo com os números apresentados por Castro Mendes e Honrado, o número de estruturas apoiadas para o quadriénio 2018-2021 subiu de 151 para 184 (ainda que apenas após os reforços de 4,2 milhões; quando foram divulgados os resultados provisórios do teatro, no final de março, o número fixava-se nas 140). Uma tendência transversal a todas as áreas e regiões, exceto na área metropolitana de Lisboa, em que menos três estruturas receberam apoio, e Alentejo, em que os números se mantêm.

Viria Jorge Campos reposicionar a discussão em torno dos números. “Estes gráficos só existem porque existiu contestação, porque os agentes culturais se mobilizaram e vieram dizer-nos que há coisas que não estão bem e que carecem de ser mudadas”, afirmou o deputado do Bloco de Esquerda. “É essa a razão pela qual aqui estão estes gráficos. O financiamento continua, ainda assim, a ser insuficiente. Dir-lhe-ei que é preferível que o governo atalhe juntando novas verbas do que não fazer nada. Não nos incomoda, pelo contrário, é uma medida bem-vinda. Mas gostaríamos que não fosse pontual.”

Sobre isso, e as críticas que foram sendo feitas ao longo da semana sobre a solução encontrada para o governo para o choque com que foram recebidos os resultados provisórios dos concursos de teatro, que deixavam de fora companhias históricas como o Teatro Experimental de Cascais, o Teatro Experimental do Porto e as únicas estruturas profissionais de Coimbra e de Beja, respondeu o ministro que foi “uma surpresa verificar o número de candidaturas elegíveis que surgiram”. 242, ao todo. E que o reforço orçamental veio justamente como resposta a isso. “Dizer que são milhões atirados é ofender as entidades que irão beneficiar do reforço.”

Precariedade, ou menos 110 mil euros Servindo-se ainda dos números, desta vez nos tetos mínimos estabelecidos para os apoios pelos novos regulamentos, traduzidos num aumento médio de 20 mil euros anuais por entidade apoiada, Honrado notava como o novo modelo “combate a precariedade”, naquela que foi provavelmente a afirmação que suscitou mais protestos na sala.

Para Ana Mesquita, “inadmissível”, conforme explicaria: “Há uma série de estruturas com um historial enorme que têm cortes. Combate a precariedade um corte de 110 mil euros ao Teatro de Almada? O problema que aqui está é que de facto a situação não está tão má como no anterior governo mas, com a quantidade de problemas que aqui foram criados, até parece que está [pior], sem estar.” Responderia Miguel Honrado que “a questão das reduções incidiu muitas vezes sobre entidades encostadas ao nível de financiamento máximo destes concursos, que é de 400 mil euros”.