A excitação de um género de figuras frenéticas

Os médicos deveriam ter sido chamados a dizerem de sua justiça. Afinal, a emenda pode ser pior do que o soneto

Confesso que acho alguma graça a figuras irritantes. Acho-as frenéticas, polícias ao contrário – é proibido não proibir -, donas do mundo, justiceiras segundo a sua bitola, e, no fundo, as verdadeiras educadoras do povo. São essas figuras que pretendem que tudo o que defendem tenha a autoridade do Pravda, o diário da república da extinta URSS, já que não aceitam posições contrárias. Basicamente dizem-se as grandes defensoras da liberdade, mas esquecem-se de dizer que essa liberdade é determinada por elas. Apesar destas ‘qualidades’ não consigo deixar de lhes achar piada. Digamos que o meu dia fica mais divertido sempre que as vejo esganiçadas em público. 

Vem esta conversa a propósito da lei ontem aprovada no Parlamento que permite a mudança de género, leia-se alteração do sexo e nome no Cartão do Cidadão. Entre os 16 e os 18 anos os candidatos só poderão avançar com o pedido depois de devidamente autorizados pelos pais ou responsáveis pela sua educação, mas com a maioridade só precisam de se dirigir a uma loja do cidadão e fazer o pedido. Tudo isto sem o parecer de qualquer médico psiquiatra ou de outra especialidade. Posto isto, digo que me é completamente indiferente se as pessoas mudam de sexo no corpo ou no Cartão de Cidadão. Desde que sejam felizes, ótimo. Não é por alguém se chamar Maria José ou José Maria que eu me vou incomodar.

Mas vamos agora às questões práticas. Um miúdo com 16 anos não pode beber álcool, não pode tirar a carta de condução nem tão pouco votar. Sim, é certo que se pode casar, mas com 16 anos alguém tem a sua cabeça formada? Se nem sabe, na maioria das vezes, que curso quer seguir, já tem a certeza que não se quer chamar Maria José mas sim José Maria?  É que a história ainda é mais confusa pois a alteração de género, no Cartão de Cidadão não é acompanhada pela intenção de mudança de sexo. 

Por isso, não seria mais sensato esperar que o cidadão chegasse aos 18 anos e pretendesse fazer a operação para a mudança de sexo e a respetiva alteração de nome?

Ao contrário das tais figuras que gostam de ser os novos polícias de costumes – como se o mundo tivesse que ser todo da cor que gostam – não vejo grandes vantagens em dar oportunidade a quem está a formar a sua personalidade a mudança de género tão cedo. Acho mesmo estranho que a comunidade científica não se tenha pronunciado publicamente sobre o assunto. Não teria sido aconselhável levar homens como o psiquiatra José Gameiro à AR para discutirem a problemática? É que este tipo de temas não deve ficar à mercê de deputados mais eufóricos com tudo o que é transformação. 

Também curioso é o facto de haver na AR quem quisesse que esta possibilidade de mudança de género fosse ainda mais cedo, antes de completarem os 16 anos. Queriam ainda permitir aos imigrantes e requerentes de asilo a possibilidade de o fazerem também. Calculo que os serviços secretos de alguns países ficassem à beira de um ataque de nervos se tal hipótese se concretizasse. 

Isto para não falar nas brincadeiras que acabarão mal: é previsível que alguns amigos numa noite mais eufórica decidam apostar com os parceiros que vão mudar de género e que mudarão de nome. Passe o exagero e a ironia, a mudança de nome é algo muito sério que devia de ser acompanhado por quem de direito: os médicos. Mas, é como digo, para mim é-me absolutamente igual. Os outros que façam o que bem entenderem da sua vida.

vitor.rainho@sol.pt