Debates há muitos

Os debates resumem-se a dois temas: futebol e política (a economia é residual). Os de futebol são, de longe, os mais populares, ocupando em todas as estações os horários nobres e preenchendo por vezes todo o serão.

Havendo hoje em Portugal 4 canais portugueses de informação emitindo 24 horas por dia – SIC Notícias, RTP 3, TVI 24 e CMTV –, a forma mais fácil, cómoda e barata de preencher as emissões é com debates. Nos debates só se paga aos comentadores residentes (os outros não recebem), o que, comparativamente com o que custa uma telenovela – com despesas em cenários, figurinistas, argumentistas, dezenas de técnicos, deslocações, refeições, filmagens em exteriores, pagamento a atores, etc. –, é uma ninharia.
Os debates resumem-se a dois temas: futebol e política (a economia é residual). Os de futebol são, de longe, os mais populares, ocupando em todas as estações os horários nobres e preenchendo por vezes todo o serão – desde a hora do jantar à meia-noite. Com frequência ultrapassam todos os limites da urbanidade e da decência. Para a política ficam os horários mais tardios. 

É preciso esclarecer que os comentadores não são pensadores: são entertainers. Uns mais apalhaçados, outros mais sérios, mas todos representam um papel. E têm de dar espetáculo para manterem as audiências.
Deixando de lado os debates sobre futebol, o mais criativo e espetacular programa de debate generalista é o Prós e Contras, moderado há muitos anos por Fátima Campos Ferreira. Tem assistência (que intervém, embora de forma programada) e os convidados mudam. Mas talvez seja demasiado ‘complicado’. As pessoas gostam de coisas mais simples. Por isso, as audiências são baixas para o esforço que o programa envolve. 
Outro programa que foge à regra é o Expresso da Meia Noite. Nasceu num almoço entre mim e Cândida Pinto, mas eu não o imaginava assim. Não era para ser ‘mais um programa de debate’, devendo ter uma componente jornalística forte. Mas evoluiu para este modelo, mais fácil de produzir.

Os programas de debate político ‘chapa um’, ou seja, com comentadores fixos de diversos quadrantes políticos, moderados por um jornalista, são inúmeros, a saber: 

Quadratura do Círculo. Afirmei em tempos que os intervenientes se tinham aproximado e diziam quase o mesmo, mas já se diferenciaram. Jorge Coelho, com o seu ar de Zé Povinho, é um espertalhão e tem a sabedoria das pessoas que continuam ligadas à terra. Pacheco Pereira intelectualiza demasiado as questões e perde amiúde o contacto com o real. Lobo Xavier representa a direita sofisticada mas pragmática. O moderador, Carlos Andrade, atira umas farpas a que os intervenientes não ligam muito. De um modo geral é um programa interessante.

Eixo do Mal. Não vejo há anos. Por uma razão ou por outra, os participantes – Clara Ferreira Alves, Daniel Oliveira, Pedro Marques Lopes e Luís Pedro Nunes – irritam-me. Gosto do moderador, Aurélio Gomes. Dizem-me que é o único programa da televisão portuguesa onde ainda se defende José Sócrates. 

Governo Sombra. De todos, é o que vejo com mais gosto – embora Carlos Vaz Marques, o moderador, me tenha feito uma das piores entrevistas que dei. E Ricardo Araújo Pereira não diga basicamente nada, pois carrega o pesado fardo de ‘ter’ de ser sempre engraçado – e não é nada fácil fazer humor constantemente. Mas Pedro Mexia fala bem e diz coisas sensatas, e João Miguel Tavares é um dos poucos comentadores sem complexos de esquerda.
Prova dos Nove. Vejo às vezes. A moderadora, Constança Cunha e Sá, torna-se cansativa pela sua constante ansiedade. E não consigo esquecer que Pedro Silva Pereira foi o braço direito de Sócrates. Quanto aos outros, Paulo Rangel é inteligente e combativo (mas às vezes também um pouco irritante) e Fernando Rosas confunde demasiado a realidade com a ideologia. 

O Outro Lado. Os intervenientes – Rui Tavares, Pedro Adão e Silva e José Eduardo Martins – dizem coisas com algum interesse, mas parecem todos ensonados, com vontade de ir para a cama. O que se compreende, dada a hora tardia do programa. O único que se mostra desperto é João Adelino Faria, o moderador, mas não consegue combater a modorra geral.
E, contagiado pela sonolência daqueles comentadores, termino esta crónica.

P.S. – Há dois analistas que funcionam sozinhos, perante um jornalista que serve de pé de microfone. Marques Mendes é o que passa melhor, escolhendo bem os temas, sendo direto, simples, incisivo, indo ao ponto, não estando com rodeios. Faz algum equilibrismo político, mas sem exagerar. José Miguel Júdice, sendo interessante, não tem condições para ser popular – pois nem sempre é direto e tem pouca empatia com a câmara.