Mafalda G. Moutinho
Profissional da saúde
Na época, a justificação foi a crise financeira e a possibilidade de incorporação da Cultura noutras pastas – por ser considerada, pelos governantes daquele tempo, como ‘transversal’.
Numa empresa, quando chegam tempos de sufoco financeiro, a primeira coisa que se descarta são os gastos não prioritários, o que culmina sempre na redução de pessoal.
As pessoas deixam de ser prioritárias perante a força dos números.
Não é difícil todos percebermos que a Cultura é um pilar social mas também económico.
Os nossos artistas são os nossos embaixadores pelo mundo todo. São, em si mesmos, a boca de um povo, através dos movimentos da dança, das palavras no teatro. São as nossas cores e as nossas histórias refletidas nas telas de cinema, e a nossa personalidade através da música.
São eles que transmitem as nossas ânsias, as nossas dificuldades, as nossas alegrias, as nossas reflexões e introspeções, num mundo cada vez mais palpável e pequeno, através da viagem universal que as novas tecnologias nos permitem fazer em milésimos de segundo a todo o globo.
A Cultura é o retrato mais fiel do ADN de um povo, é o nosso património imaterial.
É, portanto, um pilar do Estado Social, sendo um bom atrativo para todos aqueles que visitam a nossa Pátria, influindo positivamente nos tão importantes números e devidos lucros.
Felizmente o Ministério da Cultura regressou, e bem, com o atual Governo. No entanto, o Orçamento do Estado voltou a deixar a desejar, contemplando muito menos do que a promessa de 1% do nosso PIB. E nesta última semana estalou o vidro, uma vez que inúmeras entidades não vão ser abrangidas pelos apoios às artes.
Nesta hipótese, milhares de artistas ficarão com as contas penduradas, porque todos sabemos que ninguém vive de ar e vento.
Fiz uma pesquisa rápida nas redes sociais dos artistas que fui conhecendo ao longo da minha vida e apercebi-me de que não existe um único que não tenha partilhado a revolta perante o fecho da torneira ou a inexistência de apoios às artes…
Muitos dirão: por que não vão eles trabalhar?
Porque os nossos artistas já têm um trabalho.
A arte é o seu trabalho e merece respeito.
Ninguém vive apenas de aplausos quando a cortina cai ou com uma palmadinha nas costas.
As contas são certas e chegam todos os meses para todos nós.
A arte é um trabalho nobre, que implica uma fórmula química extremamente exigente: uma mistura de estudo, inspiração, talento e dom, que é coisa que, felizmente, a maior parte dos trabalhos não exige. Doutra forma, a maioria da população estaria provavelmente limitada…
Aguardemos que a Cultura, que é o ADN do nosso povo, não fique presa a um Orçamento quase abaixo de zero.