‘Neste Orçamento nem o ministro das Finanças toca’

O Orçamento Participativo Português é intocável, até para Mário Centeno. Quem o garante é a secretária de Estado responsável pela recolha de propostas dos cidadãos.

«Nos 5 milhões de euros do Orçamento do Estado para propostas dos cidadãos nem o ministro das Finanças pode tocar». A frase é da secretária de Estado da Modernização Administrativa, Graça Fonseca, ao i desta semana, e foi dita com boa-disposição. A governante socialista conversava com o diário do grupo editorial que também detém este semanário no 25 de Abril, celebrado esta semana.

Simbolicamente, o período de recolha de propostas para o Orçamento Participativo português – o único de foro nacional em todo o mundo – fechou no feriado da passa quarta-feira, em que as portas do palácio de São Bento abriram para celebrar a revolução dos cravos ao mesmo tempo que na Avenida Liberdade (ver na página seguinte) os partidos que apoiam o Governo deixavam alguns recados ao ministro das Finanças. Sobre Centeno, por sua vez, Graça Fonseca é menos crítica mas também não alinha em endeusamentos. No Orçamento Participativo que está a seu cargo nem Centeno «pode tocar», garantiu a secretária de Estado. Afinal, tratam-se dos cinco milhões de euros alocado para as propostas recolhidas junto dos cidadãos de todo o país. 

«Este ano foi a segunda edição, já com suporte online. Os encontros participativos acabaram por ser 40 e definimos uma rota geográfica a partir dos locais de onde os movimentos das Forças Armadas saíram. Começámos em Lagos e terminamos aqui em Lisboa, precisamente para associar o Orçamento Participativo ao 25 de Abril», explicou ao i.

«Tirando o D da descolonização, ficaram o D de Desenvolver e o D para Democratizar». O número de propostas deverá ser similar ao do ano passado (cerca de mil) com 600 a irem a votos. A parceria com as bibliotecas locais terá sido fundamental, contou também. «Todas tiveram publicidade e apoio do Orçamento Participativo». 

Sobre a celebração do 25 de Abril, Graça Fonseca considera «muito importante conhecermos o passado, não só para projetar futuro, mas fundamentalmente para sabermos o que devemos decidir», defende. «O porquê de cada decisão. É na matriz do nosso passado que estão escolhas: somos nós que temos de decidir se as queremos repetir ou não», concluiu, esta quarta-feira, ao i. 

Na avenida, menos simpatia

O SOL também esteve na tradicional marcha em nome da revolução de Abril, na avenida da Liberdade. 

Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, de calças de ganga e megafone em riste, coordenava a palavra de ordem e o ritmo da marcha. Em incentivo à corrida ou em oposição ao governo que em 2015 foi governo com o seu apoio, mas, claro, com menos simpatia que a secretária de Estado do PS. As quadras, da sua autoria e lidas do telemóvel, rimavam, bem diretas ao ministro das Finanças: «Ó meu rico Santo António, ó santo popular, diz lá ao Super Mário, que a folga é para se usar». António Costa é, de facto, um primeiro-ministro popular – ainda que não tenha sido canonizado – e Mário Centeno, seu ministro, já foi apelidado de super por alguns. Mortágua não concordará certamente com o elogio. 

Sobre essa «folga» orçamental, Jorge Falcato, veterano deputado do BE e figura histórica dos movimentos de protesto da esquerda portuguesa, explicaria depois ao SOL. «Os orçamentos que tiveram o voto do Bloco foram negociados dentro de uma meta. O que o Bloco diz agora – e diz bem – é que se a meta mudou e há uma folga esse dinheiro deve ser investido, nomeadamente na Saúde». Sobre que valor sente como mais importante desde a revolução, Falcato dá uma resposta instintiva: «A liberdade de expressão. E a concentração dos média em torno do capital é um risco».