Soares só teve a terminação

Em tempos sugeri que a Avenida da Liberdade fosse rebatizada com o nome de Mário Soares. Acharam cedo para isso

Numa semana em que se celebram 44 anos sobre o 25 de Abril, fica difícil ignorar as celebrações oficiais quando tanto – e tão importante – foi dito pelas principais figuras deste país, em particular Marcelo Rebelo de Sousa e Eduardo Ferro Rodrigues. 

Como aperitivo, tivemos declarações relevantes de Vasco Lourenço e Otelo Saraiva de Carvalho, ambos muito críticos de determinados hábitos (ou melhor, vícios) enraizados na nossa sociedade, em particular as práticas de corrupção – que apontam como o cancro maior da democracia.

Marcelo, entre justos elogios à Europa, como fator de união e agregação, não podia esquecer as Forças Armadas a quem devemos a democracia atual, salientando a sua enorme importância para reforçar a identidade nacional. Mas, para mim, a declaração mais forte foi sobre a necessidade de renovação do sistema político como forma de evitar o crescimento de populismos e alimentar ideias messiânicas ou sebastianistas.

Estivesse ou não Marcelo coordenado com Lourenço e Otelo, a verdade é que estes anátemas de corrupção estão ‘colados’ à imagem do nosso país – e o povo entrevistado nas ruas ao acaso tem uma triste ideia do poder. 

Estas imagens negativas favorecem, como bem Marcelo referiu, o nascimento ou reforço de ideias populistas. A corroborar esta ideia de corrupção, um estudo recente da EY a nível pan-europeu refere que em Portugal 46% dos inquiridos (entre 50 entrevistados que são administradores de empresas) referem a existência de práticas de suborno (corrupção) a acontecer de forma abrangente. Não há volta a dar, porque temos mesmo demasiado fumo para não haver fogo.

Sobre Ferro Rodrigues e a sua intervenção no Parlamento no 25 de Abril, quero agradecer a ideia expressa de existir a necessidade de pensar (eu diria, exigir) na limitação de mandatos e na acumulação de cargos. 

Sempre defendi duas coisas: a excelência e a exigência! Tudo isto se interliga, sobretudo captar os melhores por tempos limitados. E para isso devem igualmente repensar-se, por exemplo, os montantes pagos aos deputados. Talvez assim não existissem tantos exemplos de situações menos claras nos seus recebimentos, mesmo que legalmente suportadas.

O dia 25 de Abril, Dia da Liberdade, também serviu e bem para homenagear Mário Soares, um lutador pela liberdade, como muitos recordamos, quer no chamado Verão Quente de 1975 que terminou em 25 de Novembro (salve Ramalho Eanes!), quer nas décadas posteriores. Em tempos sugeri que a Avenida da Liberdade fosse rebatizada com o nome de Mário Soares. Acharam cedo para isso – como se, infelizmente, não tivesse já falecido – e eu sou daqueles que até acham que as homenagens se fazem em vida. Para já, optaram por dar ao Jardim do Campo Grande o nome de Mário Soares. Sendo justo, sinto o travo amargo de ficarmos com a terminação quando poderíamos ter a Taluda.

P.S. – Existem deputados da Assembleia da República que, se trabalhassem numa empresa privada, seriam despedidos no próprio dia 25 de Abril. Segundo vi e posteriormente li, existiam várias cadeiras vazias quando a cerimónia oficial se iniciou. Os representantes do povo que chegam atrasados a cerimónias oficiais com o simbolismo desta não merecem representar quem os elegeu. O exemplo tem de vir de cima – e estes exemplos de laxismo não podem ficar impunes.