50 anos…

Paulo de Carvalho não soube agarrar a oportunidade – e foi substituído por Julio Iglesias  

Em boa hora, os artistas da minha idade estão a lançar discos em que reúnem o melhor das suas carreiras. Foi Paulo de Carvalho, depois Tó Zé Brito e, agora, Fernando Tordo. A estes, poderíamos juntar outros nomes daquela geração de ouro, como Carlos Mendes, Fausto ou Jorge Palma, e autores das músicas e letras que eles cantaram: Ary dos Santos, José Niza, Nuno Nazareth Fernandes, José Calvário, José Luís Tinoco e Pedro Osório, se o foco for apontado só aos homens.

Sinto, em relação a todos, uma enorme gratidão pela obra produzida neste meio século, em que passámos – eles e eu – de jovens adultos a avôs com cabelos brancos. 

Julgando os outros por mim, considero que é Portugal inteiro que lhes deve o melhor que por cá se fez na música desde os fabulosos anos 60 – na esteira de tudo o que aconteceu, um pouco por toda a parte, depois da ‘festa’ do Maio de 68.

Mais por aquilo que induziu do que pela essência da ‘revolução’, uma juventude romântica, tocada por ideais generosos, quis libertar-se de regras caducas, quebrou amarras e passou à ação, com a força de um ‘cavalo à solta’, nas belíssimas palavras que Ary ofereceu a Fernando Tordo. 

Num curtíssimo período, eclodiu entre nós uma verdadeira chuva de estrelas, que revolucionou um ‘nacional-cançonetismo’ atolado no mais triste cinzentismo. Foram os maiores, e continuam os maiores na memória de muitos – mesmo que, pelo meio, tenham aparecido talentos que não perdem na comparação com ‘estrelas’ que dão a volta ao mundo. 

Não esqueço, a propósito, uma entrevista do fazedor de campeões de vendas, Manolo Diaz, com uma singela revelação: «Quando decidi compor para os grandes e dirigir as suas carreiras, a minha primeira escolha foi Paulo de Carvalho, que era, de longe, a melhor voz da Europa. O disco gravado com a Orquestra Sinfónica de Londres era a rampa de lançamento para uma grande carreira internacional». 

Perpassava nestas palavras a tristeza de uma ‘saída em falso’, provocada pelos fervores da revolução de Abril, quando os nossos cantautores se deixaram desviar para um folclore provinciano que lhes banalizou as carreiras. No caso contado, no auge da carreira, Paulo de Carvalho não ‘foi a jogo’ – não terá sabido avaliar a oportunidade que lhe estava a ser oferecida − e Manolo teve de resignar-se com uma segunda escolha: Julio Iglesias! 

Volto a Fernando Tordo e à sinceridade com que, cantando, resumiu a sua carreira: «E o meu futuro foi aquilo que se viu». Uma sina que valeu, em sentidos opostos, para Paulo de Carvalho e para Julio Iglesias. 

A língua, a pobreza cultural e a falta de visibilidade do país foram, sempre, desculpas de mau pagador. A ideia de que os portugueses não podem triunfar ‘lá fora’ é um embuste que Amália Rodrigues e Dulce Pontes desmistificaram, evocando agora o lado feminino. Mas insiste-se no erro sempre que a preguiça triunfa sobre a ambição, como bem demonstraram os homens do futebol: os que brilharam e os que poderiam ter brilhado, se…