Ex-procurador revela cartas da irmã de 2016 em que já se fala do acordo com Proença de Carvalho

Orlando Figueira diz que durante meses omitiu factos para honrar um acordo com Proença de Carvalho

Com o fim do julgamento Fizz cada vez mais próximo, a defesa de Orlando Figueira decidiu ontem tirar mais um trunfo para tentar provar que o ex-procurador do DCIAP está a falar verdade quando diz que, nos interrogatórios judiciais, omitiu os nomes do banqueiro Carlos Silva e do advogado Daniel Proença de Carvalho para honrar um “acordo de cavalheiros”, que terá feito com este último.

A versão de que foi convidado por Carlos Silva para trabalhar em Angola e que foi Proença de Carvalho que tratou da cessação do contrato de trabalho com a sociedade Primagest – que a defesa diz estar na esfera do banqueiro – surgiu no final do ano passado, imediatamente antes do início do julgamento e numa fase em que Figueira cortou relações com o advogado Paulo Sá e Cunha (que diz ter sido pago por Carlos Silva). Até aí, Orlando Figueira nunca tinha falado nesses nomes nem na conta que tinha aberto em Andorra e através da qual recebeu parte do dinheiro relativo ao seu contrato com a Primagest.

Para a acusação, o contrato com essa sociedade não passou de um esquema para que Orlando Figueira recebesse subornos do ex-presidente angolano Manuel Vicente, que tinha visto dois processos que o visavam serem arquivados pelo procurador antes de deixar o MP.

Apesar de as defesas de Orlando Figueira e do arguido Paulo Blanco – que defendeu o Estado angolano em diversos casos – terem alegado desde o início do julgamento que a Primagest não tem qualquer ligação a Manuel Vicente, mas sim a Carlos Silva, para o coletivo de juízes sempre causou alguma perplexidade que um magistrado tenha aceitado um “acordo de cavalheiros” para omitir o nome de quem o contratou quando sobre si recaíam suspeitas tão graves.
Orlando Figueira é suspeito de corrupção e branqueamento de capitais, por alegadamente ter recebido luvas de 760 mil euros. Ora o procurador diz que esse dinheiro nunca passou de honorários e agora apresenta cartas que a sua irmã trocou com Iglésias Soares, administrador do Millennium BCP (banco de que Carlos Silva é vice-presidente) e onde já se falava da existência desse acordo.

Numa das cartas que foi junta ao processo ontem e a que o i teve acesso pode mesmo ler-se: “O meu irmão honrou a sua palavra e mesmo nesse interrogatório judicial [o inicial] nunca mencionou o nome do Dr. Carlos Silva, como também nunca o fez até hoje”. A missiva, em que Maria Figueira pede uma intervenção do administrador do BCP em todo este caso, está datada de 26 de agosto 2016, altura em que o irmão estava em prisão domiciliária.

Irmã reforça ideia de que Figueira foi inocente Segundo disse ontem em tribunal Maria Figueira, foi na primeira visita que fez a Orlando Figueira ainda na prisão de Évora que ficou a saber do suposto “acordo”.

“Disse-lhe que não achava normal, porque um acordo de cavalheiros não fazia sentido. Mas o meu irmão como era um ingénuo genuíno…”, argumentou Maria Figueira, justificando assim que o antigo magistrado tenha aceitado ficar mais alguns meses preso sem abrir o jogo à justiça.

Questionada pelo coletivo sobre o porquê de não ter chamado o irmão à razão e de não o ter feito mudar de ideias, a testemunha começou a explicação dirigindo uma pergunta ao juiz: “Já alguma vez teve alguém nestas condições? Quando se tem, não há discernimento. Eu estava ali na primeira visita… eu parto do princípio de que o meu irmão é inocente, que alguma coisa correu mal e ele diz que tinha feito aquele acordo de cavalheiros.”

“Achei que ele estava a ser totó, porque estava a salvaguardar quem não fazia nada por ele”, reforçou a irmã do antigo procurador, revelando que a partir de determinada altura começou a discordar do irmão e da sua estratégia de defesa – liderada pelo advogado Paulo Sá e Cunha. Até porque considera que neste caso só havia um cavalheiro: Orlando Figueira.

Sobre o dinheiro apreendido no seu cofre, Maria Figueira disse não ser nada anormal ter guardadas grandes quantias, alegando que se os investigadores tivessem ido em outras alturas teriam encontrado mais do que os 130 mil euros apreendidos. Confirmou ainda que emprestava dinheiro ao irmão e que este lhe devolvia quando ia a Andorra levantar da conta que abrira para receber parte dos honorários da Primagest.