Oiçam-se as ‘escutas políticas’

E ao fim deste anos todos, o PS envergonha-se de José Sócrates. Carlos César, o presidente do partido que tem a particularidade de antecipar ou ensaiar as tomadas de posição do secretário-geral dos socialistas, António Costa, veio confessar-se publicamente «enraivecido» com as pessoas que se aproveitam dos partidos políticos, desencadeando uma série de reações internas…

E ao fim deste anos todos, o PS envergonha-se de José Sócrates. Carlos César, o presidente do partido que tem a particularidade de antecipar ou ensaiar as tomadas de posição do secretário-geral dos socialistas, António Costa, veio confessar-se publicamente «enraivecido» com as pessoas que se aproveitam dos partidos políticos, desencadeando uma série de reações internas contra José Sócrates e Manuel Pinho.

E fica-se agora a saber que, afinal, João Galamba tem «vergonha» de quem o inventou no partido e que Augusto Santos Silva também se sente incomodado com as suspeitas de «crimes gravíssimos» de quem fez dele um dos barões socialistas.

Envergonham-se agora, eles, que nem longe vão os tempos em que saltavam e carregavam que nem rottweillers enraivecidos sobre quem ousava tocar-lhes no dono.

De facto, quem não se lembra das reações desembestadas de Galamba ou de Santos Silva contra os meios de comunicação social – como o SOL, o CM e a TVI – quando estes davam conta das suspeitas que recaiam sobre Sócrates em casos como o Freeport ou a Operação Marquês?

Extraordinário. Quais cataventos que mudam de posição sempre que os ventos mudam de direção.

Ana Gomes sempre reclamou que o PS discutisse e analisasse internamente o caso Sócrates, mas ficou a falar sozinha ou na companhia poética e solidária de Manuel Alegre.

Já ninguém se lembra como Costa tomou de assalto a liderança do partido derrubando António José Seguro (curiosamente, apoiado por Ana Gomes e Alegre), que ingenuamente prometia acabar com a promiscuidade entre política e negócios (leia-se entre o poder político socialista e o universo GES)?

É que dá-se a coincidência de que Costa antecipou a tomada de poder quando já o GES ruía e os seus tentáculos sangravam, mas ainda mexiam.

Como se dá a coincidência de ter sido António Costa quem apresentou Manuel Pinho a José Sócrates e o colocou na passadeira do poder socialista quando o levou para o ‘grupo da Lapa’ (espécie de conselho estratégico de Ferro Rodrigues).

E até por isso não deixa de ser estranho que Fernando Medina, também ele uma criação de Costa no PS e na Câmara de Lisboa, apareça igualmente a atacar sem pejo o silêncio do ex-ministro da Economia.

O PS de António Costa viveu e tirou partido estes anos todos do silêncio. Quis, aliás, impor esse silêncio, com a reiterada e agora mais do que estafada argumentação de que tudo se reduzia ao respeito pela separação de poderes, deixando para a Política o que é da Política e para Justiça o que da Justiça.

Tretas. De conveniência.

Agora, e antes que se faça tarde, Costa já considera uma «desonra para a democracia» – leia-se, para o PS, como é mais do que lógico – se as suspeitas que impendem sobre Sócrates e o Governo socialista de que ele fez parte vierem a confirmar-se.

E acrescenta que, se não se confirmarem, é «sinal de que o sistema de Justiça funciona». Como é que é? Para António Costa, se o ex-primeiro-ministro for absolvido, a Justiça funcionou?

Está tudo ao contrário.

Quando um ex-primeiro-ministro é detido e preso preventivamente, das duas uma: ou a acusação prova em julgamento que tinha toda a razão para ter promovido o procedimento criminal e a prisão preventiva ou então mal, muito mal vai o sistema de Justiça em Portugal que se permite perseguir um ex-primeiro-ministro durante anos e acabar com a sua carreira política sem, afinal, ter provas e meios de prova bastantes para o fazer. 

Não há meio termo.

Como não há meio termo para António Costa. Quando sente o risco, não hesita. E mesmo quando o adversário já está no chão não deixa de o esmagar sem contemplações.

Como também deixou de haver meio termo para José Sócrates, que não hesitou em entregar o cartão de militante e desfiliar-se do partido ao qual deu a única (até ver) maioria absoluta da sua história.

Ora, chegados a este ponto, razão tem Manuel Alegre quando diz que está «aberta a caixa de Pandora». E que, agora, não há qualquer hipóteses de o próximo Congresso do PS deixar de dedicar-se ao tema de Sócrates, Pinho e companhia.

Já agora, todo este discurso dos socialistas – seguidistas do líder (ou melhor, dos líderes) – acontece  muito poucos dias após o Tribunal da Relação de Lisboa ter decretado a proibição de acesso às escutas do caso Marquês que versam sobre temas políticos, designadamente as conversas envolvendo Sócrates e Costa que poderiam ajudar a esclarecer como o atual líder socialista derrubou António José Seguro.

Em nome da transparência, e seguindo outros exemplos bem recentes, o Governo prestava um serviço ao país e ao povo se solicitasse, também aqui, a quebra de infundado segredo de justiça e a divulgação pública das ditas conversas.

Sendo certo que, de uma maneira ou de outra, ficaremos esclarecidos.