Afinal a mensagem na garrafa era: Palma de Ouro para Shoplifters, do Kore-eda

No ano em que o festival ergueu a bandeira das causas, das vozes poderosas, mas invisíveis, como descreveu na abertura da cerimónia a Presidente do Júri Oficial Cate Blanchett, o japonês Kore-Eda venceu a Palma de Ouro com os crimes e escapadelas do traquina Shoplifters. 

Uma surpresa, talvez para abafar o favoritismo gerado em redor de Nadine Labaki e de Capharnaum, que se ficou pelo Prémio Especial do Júri.

O pódio completou-se com o Grande Prémio para o grito contra o racismo de Spike Lee, em BlakKklansman. Já Godard foi o penetra, mas abriu o seu Livre D'Image, combinou imagens, sons, eventos do mundo e do cinema, como se fosse um autêntico DJ numa criação febril. Obrigatório por isso o Prémio Especial do Júri. Tal como o de realização para o polaco Pawel Pawlikowski, pelo magnífico e visualmente perfeito Cold War, sobre uma belíssima história de amor que percorre duas décadas do período da guerra fria na Europa.

Há muito para dizer dos vencedores dos prémios de interpretação. O italiano pequenino e tratador de cães em Dogman, de Matteo Garrone, no seu regresso ao realismo violento de Gomorra, mas sobretudo a entrega total de Samal Yeslamova, no magnífico e angustiante Ayka, de Sergei Dvortsevoy. Filmes que teremos mesmo de ver e sofrer com eles.

Homenagem aos dois cineastas que não puderam estar presentes, ambos em prisão domiciliária nos seus países, o russo Kirill Sebrenikov e o iraniano Jafar Panahi, embora apenas com prémio de guião para o segundo, recebido pela co-argumentista Saevar Panahi. A italiana Alice Rohrwacher receberia igualmente o mesmo prémio, por Lazzaro Felice.

Girl recebeu ainda a Câmara de Ouro, para a primeira longa metragem, numa categoria que integrava também Gabriel Abrantes com Diamantino. Bem calhada para o filme sobre um bailarino de 16 anos, que a vontade de mudar de sexo. O filma cativa-nos por evitar todos os estereotipos normalmente associados a este tipo de perosnagens.

Foi um palmarés justo. Foi sobretudo um palmarés que não é atribuído por jornalistas ou críticos de cinema, portanto a optar por refletir questões talvez que superem essa dimensão puramente cinéfila. Nesse sentido, foi um palmarés justo e adequado.

No final, houve música de Sting que ao cantar Message in a Bottle no topo das escadarias e passadeira vermelha que dão acesso ao Palais dos Festivais, parecia querer dizer que a mensagem que Canes envia ao mundo é de um cinema ativista, de direitos humanos e de denúncia. Como disse Spike Lee da conferência de imprensa quando disse F*** you, Trump!

Palmarés

Palma de Ouro – Shoplifters, Hirokazo Kore-eda

Grande Prémio – BlakKklansman, de Spike Lee

Prémio Especial do Júri – Capharnaum, de Nadine Labaki

Prémio Especial – Jean-Luc Godard (Livre D'Image)

Prémio Interpretação Masculino – Marcello Fonte (Dogman)

Prémio Melhor Realização – Pavel Pawlikowski (Cold War)

Prémio de interpretação feminino – Samal Yeslyamova (Ayka)

Prémio de Melhor Guião – Alicia Rohrwacher (Lazzaro Felice) ex aequo Nader Saevar e Jafar Panahi (3 Faces)

Camâra de Ouro – Girl, Lukas Dhont