Tomás Correia na corrida para último mandato no Montepio

A dona do banco vai a eleições no final do ano, mas já se começam a contar espingardas. João da Costa Pinto e Fernando Ribeiro Mendes poderão concorrer contra a lista do atual presidente.

Tomás Correia na corrida para último mandato no Montepio

A Associação Mutualista Montepio Geral vai a votos em dezembro, mas já começam a surgir movimentos a apelar para mudanças profundas na instituição liderada por Tomás Correia. 

Ao que o SOL apurou, o presidente irá recandidatar-se, pela quinta vez, para um último mandato. A ideia é apostar num mandado de transição para que seja encontrada uma alternativa para as eleições a ocorrer em 2021. Tomás Correia vai fazer 73 anos este ano e quando terminar o mandato terá 76 anos e, tudo indica, que nessa altura deverá dar lugar a um novo líder.

O que é certo é que, segundo os estatutos das Associações Mutualistas o atual conselho de administração é obrigado a apresentar uma lista de continuidade, mesmo que não tenha mantenha os mesmos administradores que estejam ainda em funções. Até 2003, houve sempre apenas uma lista a eleições, só no final desse ano é que começaram a surgir candidaturas alternativas. Nessa altura, coube a António Maldonado Gonelha, ex-ministro do Trabalho e da Saúde, para fazer face à lista de José da Silva Lopes que saiu vencedora.

A partir daí, o interesse pelas eleições no Montepio foi ganhando maior relevo e as listas também se foram multiplicando. Exemplo disso, foi o que aconteceu no último ato eleitoral: apareceram na corrida quatro candidaturas e foi possível, ao mesmo tempo, encontrar um pouco de tudo, de ex-políticos a dirigentes sindicais, contando ainda com apoios públicos, nomeadamente com figuras ligadas às artes, como a fadista Mariza e o cantor brasileiro Ivan Lins, Filipe La Féria ou o gestor Rui Nabeiro. 

A lista liderada por Tomás Correia venceu as eleições para a Associação Mutualista com 58,7% dos votos, mas envolvida em forte contestação. Uma das candidaturas derrotadas – de António Godinho, um dos rostos do projeto ‘Renovar Montepio’ – chegou a pedir a impugnação dos resultados, apontando falta de transparência, nomeadamente por não ter sido possível às listas da oposição assistir ao processo de validação dos votos por correspondência (mais de 95% dos votos não são presenciais), com o argumento de que os dados dos associados são protegidos por sigilo bancário (uma vez que a validação das assinaturas é feita por semelhança com a assinatura dos clientes na base de dados bancária), considerando que isso facilitaria eventuais falsificações de votos. Mas no ano passado o Tribunal chumbou a repetição das eleições, considerando improcedente o processo que tinha sido intentado. 

Contar espingardas

Mas enquanto ainda não é oficializada a posição de Tomás Correia, os meios da oposição à atual gestão têm-se multiplicado esta última semana para encontrar um candidato alternativo ao atual presidente. Em cima da mesa têm estado fortes críticas aos gastos do atual presidente nas vésperas de eleições. 

«De três em três anos há eleições na mutualista do Montepio. A mutualista gasta, anualmente, 1,5 milhões em publicidade, mas, de três em três anos, esta verba mais do que duplica e salta para os 3,7 milhões de euros. De três em três anos há promessas de mudança e de inovação. De três em três anos a mutualista tem vindo a afundar-se. Este ano há eleições», revela um documento a que o SOL teve acesso.

Para já, João da Costa Pinto, em entrevista ao i, admitiu que está disponível para dar o seu contributo para a reorganização da Associação Mutualista. «Como associado do Montepio e como economista que dá importância ao grupo Montepio, com certeza que estaria disponível para dar o meu contributo a um processo de reorganização do Montepio que, no essencial, respeitasse os princípios fundadores e permitisse consolidar a sua posição na sociedade portuguesa», revelou o economista, acrescentando ainda que «não faria sentido que andasse há anos a chamar a atenção para os problemas que se foram desenvolvendo no Montepio e depois me pusesse de lado relativamente a um esforço no sentido de encontrar as melhores soluções». 

Já em relação ao trabalho feito até aqui por Tomás Correia, disse apenas: «Quem cometeu os erros que cometeu – e até podem ter sido cometidos erros com as melhores intenções –, quem implementou um programa que levou à destruição de centenas de milhões de euros de capital mutualista, duvido que tenha condições para dar a confiança e para modernizar todo o grupo».

Também o atual administrador da Associação Mutualista, Fernando Ribeiro Mendes, estará a movimentar-se para avançar com com uma candidatura. «É preciso acabar com a deriva estratégica que nos tem assombrado de grandiosos sonhos que hoje sabemos que foram irrealistas», afirmou esta semana nas Jornadas de Reflexão Mutualista.

Ainda não há certezas em relação a António Godinho, que nas últimas eleições era apoiado por Braga Gonçalves – antigo homem forte da Universidade Moderna e que esteve detido durante quatro anos – e contava com nomes como o sindicalista João Proença, o ex-ministro das Finanças António Bagão Félix , o general Pinto Ramalho e Vítor Batista, que foi deputado socialista e governador civil. Godinho é um ex-trabalhador do Montepio, mas acabou por sair para se dedicar ao mundo dos negócios. Fundou o grupo Onebiz que oferece redes e serviços em sistemas de franchising. 
 
Supervisão muda de mãos

Também marcha está a alteração no diz respeito à supervisão. O Conselho de Ministros aprovou, esta semana, o novo Código das Associações Mutualistas, em que estas passaram a ser supervisionadas pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), em que o Montepio Geral é um dos visados. 

As novas regras entrarão em vigor dentro de 30 dias. Depois, Governo e regulador terão até 120 dias para definir as mutualistas que vão passar a estar sob supervisão da ASF, no âmbito do novo regime especial de supervisão. 

No entanto, as associações de maior dimensão vão beneficiar de um período de transição de 12 anos para adaptação ao novo regime. Isto significa que, o Executivo vai ter responsabilidades diretas na fiscalização das adaptações que a Associação Mutualista Montepio durante esse período. Ao mesmo tempo, está prevista a criação de uma comissão de acompanhamento do período de adaptação, com representantes do Ministério das Finanças e da Segurança social. Ao que o SOL apurou, esta foi uma das sugestões feitas pelo Montepio. 

Com esta alteração, a comercialização de modalidades de benefícios de segurança social terá de cumprir as mesmas regras a que estão sujeitas os produtos financeiros das seguradoras. Aliás, este era um dos objetivos do governo e das autoridades reguladoras de assegurar que os produtos financeiros das mutualistas passassem a ser fiscalizados por um regulador financeiro, face à ausência de supervisão que existia. Recorde-se que, atualmente, esta supervisão recai no Ministério de Vieira da Silva.

Além disso, as mutualistas com mais de 100 mil associados vão ser obrigados a ter uma assembleia de representantes, para assegurar a «adequada representação dos associados por áreas geográficas, locais de trabalho ou grupos profissionais», segundo o novo código. 

Recorde-se que, a Associação Mutualista é o topo do Grupo Montepio, tendo como principal empresa a Caixa Económica Montepio Geral, que desenvolve o negócio bancário, de qual, até meados de 2015, Tomás Correia também era presidente.

No ano passado, a Associação Mutualista apresentou nas contas individuais lucros de 587,5 milhões de euros, bem acima dos 7,4 milhões de euros de 2016. Isto depois de ter passado a estar sujeita a pagar IRC (imposto sobre os lucros das empresas), por decisão das Finanças após um «pedido de informação vinculativa» da própria associação, isto apesar de manter o estatuto de IPSS – Instituição Particular de Solidariedade Social. Com essa alteração do regime fiscal, as contas beneficiaram do impacto de ativos por impostos diferidos superiores a 800 milhões de euros.
Já o presidente do banco mutualista é Carlos Tavares (ex-ministro da Economia do Governo PSD de Durão Barroso e ex-presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários). Ainda no mês passado, reviu as contas da instituição financeira referentes a 2017 e, em vez de 30,1 milhões de euros, afinal os lucros fixaram-se em 6,5 milhões de euros. A certificação legal de contas, uma vez que ainda não tinham sido auditadas, e a revisão em alta das imparidades para crédito levaram a administração liderada por Carlos Tavares a rever as contas.

Também em cima da mesa está a possibilidade da mudança de nome, mas a marca Montepio vai manter-se no nome da instituição financeira do grupo mutualista. «Até pode mudar, mas tem de se manter Montepio», disse recentemente o presidente do banco.