«Diz fruta»

Esta expressão imperativa, que fotografei na Rua Maria Amália Vaz de Carvalho, em Lisboa, brinca com duas leituras possíveis: «Diz fruta», ou seja, diz a palavra fruta, e «desfruta», do verbo desfrutar, usufruir.

E a fruta é uma parte importante da alimentação. Ao mesmo tempo que fornece ao nosso corpo vitaminas e uma série de outros nutrientes importantes, também nos dá açúcar (não refinado), de que tanto precisamos. A fruta sacia, nutre e é um alimento saudável, sobretudo se for de agricultura biológica, sustentável, ou se for comprada na estação própria (se bem que já quase não podemos precisar quantas estações do ano temos…), em locais onde não está catalogada, linda, brilhante e com autocolantes irritantes, como se a fruta nascesse nas árvores já com autocolantes…

Esta frase incita-nos, pois, a dizer e, consequentemente, a comer fruta. Contribui, assim, para um estilo de vida saudável. 
E, se lermos nesta frase o conselho para que desfrutemos, também poderemos encontrar nela um conselho muito positivo – desfrutar da vida, dos amigos, do amor, da felicidade, de um trabalho de que se goste, da família, de bons momentos. Um conselho para aproveitarmos ao máximo tudo aquilo que temos ao nosso dispor e que, por vezes, por comodismo, conformismo ou inércia, acabamos por não aproveitar.

Passar umas horas a olhar para o mar, perdermo-nos a imaginar em que figuras as nuvens se transformam, aproveitar uma tarde livre a conversar com uma pessoa amiga, ler um (bom) livro, ouvir uma sinfonia completa, olhar um recém-nascido deitado no berço – são tudo exemplos de formas de nos perdermos da utilidade dos dias e de nos refugiarmos naquilo de que verdadeiramente gostamos, apreciando o que a vida tem de melhor, sem pressas, desfrutando verdadeiramente do privilégio de podermos usar o tempo como mais nos aprouver.

«Desfruta» é, pois, um conselho que deveria ser interpretado como uma ordem, como algo que deveríamos «obrigar-nos» a fazer, para que pudéssemos interiorizar esta capacidade, que, em algumas pessoas, é natural, de aproveitar bem a vida, sem nos confinarmos a um quotidiano passado entre casa e trabalho. São estas pessoas que sabem viver, que usam o tempo como se este não existisse, que fazem o que lhes dá prazer e que, assim, fazem verdadeiramente jus à palavra «viver». 

Mas outras pessoas há, e muitas são, que, enredadas nos compromissos do quotidiano, não conseguem encontrar nelas a disponibilidade para deixarem os verdadeiros momentos de prazer e liberdade tomar conta da vida e, desta forma, desfrutarem. E, se não experimentarmos, «nunca sabe[re]mos a que ilusões nos leva a nossa vontade», como diz Mário Zambujal em Dama de Espadas. Embora, para tal, baste abrir a mente, baste abrir a porta…

Maria Eugénia Leitão
Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services