Rendas de energia. Regulador foi alvo de “ataques orquestrados”

Jorge Vasconcelos, ex-presidente da ERSE,  garantiu que alertou para “os impactos negativos” da substituição dos CAE pelos CMEC.

O antigo presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) Jorge Vasconcelos afirmou ontem no parlamento que o regulador foi alvo de “ataques orquestrados” por causa do parecer ao decreto-lei que criou, em 2004, os contratos designados CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual). O responsável lembrou que em várias conferências – enquanto presidente do conselho de administração da ERSE, cargo que ocupou durante dez anos, entre 1996 e 2006 – alertou para “os impactos negativos e amplamente previsíveis” da substituição dos CAE (Custos de Aquisição de Energia) pelos CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual). “Basta ler a imprensa da época para ver os ataques orquestrados à ERSE por causa deste parecer”, revelou aos deputados.

Para Jorge Vasconcelos, os relatórios anuais da ERSE permitem compreender “como sistematicamente, ano após ano, sucessivos governos aprovaram medidas que oneravam os consumidores e beneficiavam as empresas”, referindo que, em concreto, sobre os CMEC, foi ouvido na comissão de Economia em 2004, antes da publicação do decreto-lei 240/2004, de 27 de dezembro, e em 2005 e em 2006, “várias vezes”, depois da sua publicação (e ‘luz verde’ da Comissão Europeia), mas antes da aplicação do diploma, o que só veio a acontecer em julho de 2007.

Num parecer enviado ao parlamento, o regulador alertava para que o mecanismo dos CMEC iria distorcer “a concorrência no mercado grossista de energia elétrica com consequências negativas ao nível dos preços e da segurança de abastecimento”, e aumentar “a receita dos produtores vinculados e da entidade concessionária da rede nacional de transporte face à situação atualmente existente (CAE) à custa dos consumidores”.

O antigo presidente da ERSE denunciou ainda “fortes pressões” do governo de António Guterres para um contrato de aquisição de energia à central a gás do Ribatejo, considerando que se tivesse cedido “hoje a família dos CMEC contaria mais um membro”. “Em 1998 o governo tentou promover a celebração de um novo contrato de aquisição de energia [CAE], para a central a gás do Ribatejo, por ajuste direto entre a REN e a EDP”, alertou. 

Opacidade nos preços

Para o antigo presidente da ERSE, “a opacidade” dos preços da eletricidade é “tão forte”, desde 2006, que não consegue explicar como se formam as tarifas. Isto porque “em cada ano há uma forma diferente de gerir esta coisa agradável que é o aumento dos preços”, afirmou, referindo-se à tentativa de controlar a subida das tarifas da eletricidade, que levou à sua demissão em 2006, quando, por “eleitoralismo”, o governo de José Sócrates rejeitou o aumento proposto pela ERSE para o ano seguinte. Foi substituído na presidência da ERSE por Vítor Santos. 

“Avisei o senhor primeiro-ministro que considerava que não existia condições para o exercício independente da regulação. Por isso, não houve dias, houve um ano inteiro”, disse.