O Belenenses do meu avô

Entre maio e julho de cada ano faço os meus interregnos desportivos. Leia-se: dedico muito pouca ou nula atenção ao desporto, seja futebol ou outras modalidades.  De dois em dois anos – e como Portugal se vai qualificando para o Mundial ou o Europeu -, visto (literalmente) a camisola da Seleção para ver os jogos,…

Entre maio e julho de cada ano faço os meus interregnos desportivos. Leia-se: dedico muito pouca ou nula atenção ao desporto, seja futebol ou outras modalidades. 

De dois em dois anos – e como Portugal se vai qualificando para o Mundial ou o Europeu -, visto (literalmente) a camisola da Seleção para ver os jogos, se não os puder ver in loco, vibro com os nossos feitos durante a partida, e assim que esta termina desligo e mudo de canal, sem qualquer paciência para ouvir banalidades ou rebuscadas teorias explicativas de vitórias, empates ou derrotas. 

Neste Verão não iria ser diferente – caso vários amigos não me tivessem chamado a atenção para momentos excecionais como foram as finais ‘à maior de 5 jogos’ de futsal ou voleibol, rigorosamente cumpridos até ao fim, com jogos decisivos entre os velhos rivais de Lisboa a decidirem títulos nacionais. Ganhou o Sporting como poderia ter ganho o Benfica, venceram ambos no momento da celebração do título, tal o fair play dos dois lados.

Mas algo também me despertou a atenção: esta zanga inexplicável e inconcebível entre a SAD de um Clube e o próprio Clube, ambos designados de Belenenses. Este Clube histórico que foi também fundado pelo meu avô Virgílio Paula e do qual sou sócio há quase 25 anos por óbvia homenagem ao pai de minha mãe – que soube agregar, dada a sua condição de médico em Belém, um conjunto de dissidentes do Benfica que, além de serem seus amigos, tinham sido também antigos colegas de equipa. E este Clube que nasceu assim será centenário em 2019.

Nesta divisão todos perdem, uns mais do que outros, na minha opinião mais a SAD que o Clube. A SAD de Rui Pedro Soares – homem portista desde sempre, que ninguém entende porque comprou esta SAD. Mas comprou, e logo a maioria. Desde há uns tempos o conflito agudizou-se e agora estalou. Provavelmente o bom senso nunca imperou, cada um convencido, mais que das suas razões, das suas certezas. Resultado? SAD no Jamor, Clube nos campeonatos distritais. 

Clube de bairro hoje (depois de na década de 40 pedir meças aos outros ‘grandes’), remediado, tendo ido por vezes até parar à 2.ª divisão, adivinhem para que lado se irão virar os ‘velhos do Restelo’? Não tenho muitas dúvidas… Para quem jogar no seu velhinho estádio de sempre. O Jamor terá muito público nos jogos com os três grandes, quase todos adeptos dos adversários, e apenas umas escassas claques azuis, angariadas entre as camadas jovens. Na maioria dos restantes jogos misturar-se-á o apito do árbitro com o chilrear dos passarinhos…

Poderia ser diferente? Podia, se prevalecesse o bom senso. Podia, se a equipa profissional jogasse de modo a entusiasmar os seus adeptos (que até organizariam excursões de fim de semana ao Jamor, tipo piqueniques da Taça de Portugal). Podia, se o acionista principal fosse um magnata internacional. Mas infelizmente para a SAD, o seu acionista principal é apenas um empresário de dimensão interna a construir uma equipa tentando uma classificação tranquila. Ou seja: no Restelo, o coração ainda bateria por camisolas azuis; no Jamor, não acredito.

Volta o Belenenses à dimensão inicial do campo das Salésias, jogando no belo Estádio do Restelo. Também não serão muitos os que lá vão – mas os que forem irão certamente com a paixão de contribuir para a reconstrução de um Clube histórico que, como muito bem disse Rui Pedro Soares, é um Clube de 1.ª divisão! Será um caminho penoso – mas nesse acreditar se irá rever a alma do Restelo.

P.S. – Onde estavam os assessores de António Costa na receção ao príncipe Aga Khan? A comitiva ismaili era imensa, e até parecia desordenada, mas protegia o seu líder. Costa, nosso primeiro-ministro, teve o azar dos Távoras ao aparecer na sua frente um quase gémeo do seu ilustre visitante – e, desamparado como estava, cometeu um erro humano que quase todos cometeriam nas circunstâncias mas que os seus assessores poderiam e deveriam ter evitado.