Durão Barroso, que é um exemplo de político ‘politicamente correto’, disse surpreendentemente em Lisboa, na semana passada, que devemos ter uma atitude humanitária em relação aos migrantes mas não «de portas escancaradas».
E explicou que a chegada contínua de migrantes à Europa está a provocar «reações de racismo e xenofobia».
Foi a primeira vez que vi um político moderado, que já foi presidente da Comissão Europeia, fugir da cartilha adotada pela maioria dos governos europeus – e dizer o óbvio.
Refira-se que, na semana anterior, discursando em Estrasburgo, o Presidente angolano, João Lourenço, classificara a emigração africana para a Europa «uma vergonha» e apelara aos países da União Europeia para ajudarem África a fixar as pessoas nos seus territórios, evitando o êxodo para Norte.
Num lado e noutro do Mediterrâneo começa a haver vozes coincidentes.
Há anos que digo o mesmo. Esforcei-me por explicar que a corrente contínua de migrantes para a Europa provocaria necessariamente reações, gerando descontentamentos e criando um caldo de cultura favorável ao avanço de partidos de extrema-direita.
Até porque muitos dos migrantes não se integram, criando focos de tensão nos lugares onde se instalam.
Veja-se a Bélgica, onde há bairros de muçulmanos onde os europeus não entram; veja-se a Inglaterra, onde sucede o mesmo; veja-se a Holanda, onde há holandeses que saem do país por já não se sentirem na sua terra; vejam-se os graves distúrbios ocorridos há dois anos na Alemanha; veja-se a França, onde os desacatos nos arredores de Paris (e até no centro) provocados por imigrantes de segunda geração são constantes.
E isto para já não falar dos atentados, que provocam naturalmente reações xenófobas.
Porque, se é verdade que nem todos os muçulmanos são terroristas, quase todos os autores de atentados terroristas são muçulmanos.
Mas a maioria dos líderes europeus teima ainda em tapar o sol com a peneira, e o secretário-geral da ONU, António Guterres, apela à Europa para receber migrantes sem limitações, argumentando estarmos a falar apenas de 1% da população europeia.
Ora, ao dizer isto, Guterres está a fazer de todos parvos.
Ele sabe perfeitamente que, atrás desse 1%, viria mais 1%, e outro, e outro – porque este movimento não tem fim.
Se estivéssemos perante uma situação pontual – uma guerra com fim à vista, um terramoto, terríveis inundações – a Europa teria toda a obrigação de ajudar e receber as populações atingidas.
Mas tratando-se de um movimento contínuo, de uma corrente humana vinda do Sul, do Médio Oriente e até do Extremo Oriente, como pode a Europa escancarar as portas e dispor-se a aceitar por tempo indeterminado toda a gente que quiser vir?
No mundo há 700 milhões de seres humanos em estado de extrema-pobreza.
Podemos pensar em receber todas essas pessoas?
Mas atenção: ao contrário do que a esquerda pretende, não são os mais pobres, os extremamente pobres, os que estão em risco de morrer à fome, que se metem a caminho da Europa.
Não são os que vivem nos musseques de Luanda, nos bairros de lata de todo o mundo, que têm condições para pagar aos traficantes.
Quem vem para a Europa é uma certa classe de gente que já tem alguma coisa de seu e anseia por melhores condições de vida.
E até por isso os responsáveis desses países estão preocupados.
Com a emigração, dá-se uma hemorragia de bens e de massa crítica.
Não é por acaso que João Lourenço fala em «vergonha».
E há outra questão que ainda não foi abordada porque desafia violentamente certas ideias estabelecidas.
Ao longo do século XX muitos países de África e da Ásia quiseram ser independentes e lutaram bravamente contra os colonizadores europeus, libertando-se do seu jugo.
Como entender que, pouco tempo passado, os seus naturais comecem a fugir de lá… querendo instalar-se exatamente na Europa que os colonizou?
Os africanos, os orientais, rumam à Europa para voltarem a estar sob as ordens dos ‘brancos’, desempenhando ainda por cima, em muitos casos, as tarefas mais básicas.
É paradoxal.
Foi para isto que as independências se fizeram?
A atitude do Governo italiano ao não deixar aportar o Aquarius, sendo objetivamente desumana, foi corajosa.
Obrigou a Europa a olhar de frente para o problema.
E a perceber que a questão tem de se resolver nas regiões de origem dos migrantes e não na Europa.
A Europa deve participar na tarefa de promover uma estabilidade política e um desenvolvimento que ajude a fixar as populações, evitando o seu êxodo para o continente europeu (que, além dos problemas referidos, comporta também graves riscos, com naufrágios constantes no Mediterrâneo).
Mas é preciso que as autoridades desses países também colaborem nesse processo e não fiquem à espera que a Europa resolva tudo.
Veja-se a República Centro Africana – que, apesar de todas as ajudas vindas dos quatro cantos do mundo, continua a ser um país inviável, sujeito a golpes constantes, onde as pessoas vivem em permanente sobressalto.
A situação no globo não vai mudar de um dia para o outro.
Por mais esforços que se façam, as migrações não vão parar amanhã… nem daqui a 100 anos.
Assim, para lá da tentativa de fixação das populações nos locais de origem, é preciso criar (como já sugeri) uma espécie de ‘Estados de acolhimento’, situados nas encruzilhadas dos grandes movimentos migratórios, onde as pessoas que vêm a fugir à guerra ou às catástrofes possam encontrar abrigo.
Não vejo outra solução.
Uma política europeia de ‘portas escancaradas’, como a classificou Durão Barroso, só beneficiará os traficantes, promoverá os naufrágios e estimulará os populismos na Europa.