Nuno Magalhães. ‘Quer o PCP, quer o Bloco de Esquerda estão dentro do bolso do PS’

Dirigente do CDS defende que a demissão de Azeredo Lopes já virá tarde e deveria ter ocorrido há um ano. Sobre a ‘geringonça’, diz que a esquerda aprovará o Orçamento de 2019.

No final da sessão legislativa, o líder parlamentar do CDS faz o balanço da atividade do partido, dos temas mais polémicos, mas também da relação institucional com o PSD, agora mais próximo do PS e de um Bloco Central. Nuno Magalhães  não antevê uma crise política à esquerda e não poderia ser mais claro em relação à polémica em torno do furto de material bélico no paiol de Tancos. As suspeitas sobre a discrepância entre o armamento roubado e o recuperado só prova que os centristas tiveram razão há um ano quando pediram a demissão do ministro da Defesa, Azeredo Lopes.  Mais uma vez, o CDS pede a saída do governante e prepara já o pedido de comissão de inquérito sobre o caso na Assembleia da República.

O fim do adicional ao Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) foi chumbado à esquerda. Houve uma mudança na atitude da esquerda – PCP e Bloco – entre a viabilização do projeto do CDS e a versão na especialidade. Este é o sinal de que os acordos à esquerda irão até ao fim da Legislatura?

É e não me surpreende.  E nem precisava deste sinal. Todos nós já percebemos que quer o PCP  quer o  Bloco de Esquerda estão dentro do bolso do Partido Socialista. Farão tudo, inclusivamente manobras de contorcionismo, como fizeram em relação ao ISP,  para manter o  atual Governo socialista em funções. Nunca tive grandes dúvidas e não tenho. Nem precisava do caso do ISP.  Nós temos o estado de uma democracia em que há partidos que fingem estar na Oposição, mas no momento certo ai lá que votam, votam! Para mim não constitui nenhuma surpresa, embora seja uma imagem muito impressiva do que se passa. Sobretudo o Bloco de Esquerda, mas também o PCP mudaram de opinião. Votaram uma coisa e passado 15 dias votam outra. Porquê? Porque quando o PS manda, manda. 

Então considera que o Orçamento do Estado de 2019 vai passar com os votos favoráveis da esquerda, sem o PS precisar, por exemplo, de se virar para o PSD?

Neste momento o PS poderá ter essa dupla opção aparentemente. Mas não tenho dúvidas que não necessitará do apoio do PSD. Mais teatro, menos teatro, como se viu, o Bloco de Esquerda e o PCP e o PEV aprovarão o próximo Orçamento do Estado.

O PSD deu a mão ao Governo no Código Laboral e no pacote de descentralização. Considera que o CDS é a verdadeira Oposição ao governo?

Parece-me que o CDS é o partido com uma Oposição mais clara. De forma clara, a  verdade é que o CDS opõe-se a este Governo e também de uma forma muito clara a presidente do CDS, Assunção Cristas, já disse que um voto no CDS não servirá para viabilizar nenhum Governo deste PS com mais ou menos amigos. Amigos entre aspas, claro está.

Considera que o PSD alterou a sua estratégia e está mais próximo do PS do que dos democratas-cristãos? 

O CDS e o PSD são partidos diferentes, com histórias e ideias diferentes, mas que se entendem de uma forma natural. Isso é evidente  para mim. E acho que para os portugueses também. Tão evidente é – mas isso é uma opção legítima e que eu respeito – que o  PSD, o novo PSD, tem privilegiado as relações com o Bloco Central e com o Partido Socialista. É legítimo, não vou comentar se é bom ou mau, porque não me cabe a mim comentar, sou do CDS. Agora os portugueses sabem que quando existe necessidade de haver uma coligação CDS-PSD não há estas fitas. Não há o fingimento, não existe a ideia de fingir que se está na Oposição. Fazemos das nossas divergências convergências de uma forma clara, transparente e vamos para o Governo. Não fingimos que estamos na Oposição.

Mas acha que o PSD finge que está na Oposição?

Não, não, não. Acho que o PCP e o Bloco de Esquerda fingem que estão na Oposição.  Acho que o PSD está na Oposição, é um partido da Oposição. Agora, legitimamente – e não me cabe a mim comentar -, parece-me evidente que  nos últimos meses tem tido uma aproximação muito clara ao PS em várias matérias e ao Bloco Central, mas isso não quer dizer necessariamente que o CDS e o PSD não  possam, caso sejam chamados pelos portugueses a fazê-lo, entender-se de uma forma sempre muito natural. 

No pacote da descentralização, com a lei de finanças locais, o CDS considerou que houve ali  uma aprovação às três pancadas porque o Parlamento demorou mais tempo a discutir o fim do adicional ao ISP do que a descentralização. Teme que este acordo possa aumentar as assimetrias entre regiões do país ou foi o acordo possível?

Parece mais um processo de desresponsabilização do Governo e essa é nossa  crítica. Não só foi um processo aprovado à pressa, como também atribui competências às autarquias, mas não atribui meios, se conjugarmos com a lei de finanças locais. Parece-nos muito mais um processo de desresponsabilização do que de descentralização.  E, nesse sentido, irá seguramente aumentar as assimetrias. 

Qual é a marca maior  do CDS nesta sessão legislativa? É a questão do fim do adicional ao ISP?

Não só. Felizmente temos muitas marcas. É o ISP, é o estatuto fiscal para o interior. O CDS liderou em várias matérias: na área da demografia, na área da justiça. Hoje o CDS é o único partido – e dando execução ao apelo do senhor Presidente da República do pacto de justiça – que tem propostas e aguarda há mais de dois meses pelas propostas dos outros partidos. Foi o CDS que lançou a proposta do estatuto fiscal do interior. Foi o CDS que, em matérias como a demografia, tomou a dianteira,  alertando que é uma matéria fundamental. É o CDS que tem feito oposição na questão da segurança, na questão da necessidade desregulamentação dos metadados. Foi um ano, eu diria, em que o CDS, em matéria de Saúde, não só apresentou propostas, como liderou a Oposição. O que é hoje evidente para muitos – mas não era há uns meses –  é a falência do Serviço Nacional de Saúde feita por um Governo de esquerda. Foi o CDS que em matéria de educação apresentou uma lei de bases que, finalmente, vai atualizar uma outra com mais de 30 anos. Acho que o  CDS tem feito um trabalho de oposição também construtiva, também com propostas, lançando temas e sobretudo liderando, na minha opinião, a Oposição.

Em relação ao PSD? Considera que é o CDS que lidera a Oposição e não os sociais-democratas.

Pelo menos a Oposição formal.  Existem uns partidos que, estando no Governo, querem afirmar-se como estando na Oposição.

Registo que ignora sistematicamente uma avaliação ao PSD como Oposição e que prefere atacar a esquerda. É estratégia já a pensar nas legislativas de 2019?

Não, repare, eu acho que o PSD, sendo diferente do CDS, é um partido com que o CDS se entende bem e deve manter boas relações. Acho que não devo, não posso e nem quero estar a comentar a vida interna ou as opções do PSD. Eu centro-me, se quiser, naqueles partidos que aprovam tudo que o Governo diz, nomeadamente, o PCP e o Bloco de Esquerda, mas  fingem estar na Oposição. Não é positivo do ponto de vista da democracia, não é transparente.

Mas será mais fácil fazer um acordo pós-legislativas em 2019 com este PSD? 

Não sei. Olhe… primeiro temos que nos concentrar no essencial: termos uma maioria de 116 deputados os dois juntos.  Obviamente que o CDS tem a ambição de ter o maior número de deputados possível. O CDS acredita que é possível o centro-direita ganhar as próximas eleições, é possível derrotar o doutor António Costa. Temos de nos concentrar em ganhar o maior número de deputados – no mínimo 116, para formar a maioria -, porque já percebemos que as velhas definições, como quem ganha eleições, governa, já acabaram. Agora o que interessa não é tanto quem ganha, é saber qual a maioria que é mais estável e tem 116 deputados para formar essa maioria.

O CDS vai claramente sozinho às eleições. Não há volta a dar?

Não. Isso ficou definitivamente resolvido em congresso. E não vejo nenhum motivo para mudar.

O CDS admitiu, pela voz do deputado João Rebelo, avançar com uma comissão de inquérito sobre o caso do furto de material bélico em Tancos.  O CDS vai entregar já este mês a proposta de inquérito? 

O CDS admitiu e admite. Para já, o CDS entregou um requerimento  para ouvir o Chefe do Estado-Maior do Exército e, ao mesmo tempo, pediu ao Governo para que nos  forneça a lista. Vamos fazer essa audição, vamos esperar – e espero que seja muito em breve – pela lista e que esta nos seja fornecida, iremos analisar, iremos  ponderar, iremos comparar, iremos decidir.  Agora, que esta questão põe em causa a segurança interna, põe em causa a palavra do ministro, e não só, e põe em causa a continuidade do próprio ministro, e não só, põe.

Quando diz que põe em causa a continuidade do ministro e não só, está a dizer que o ministro devia colocar o lugar à disposição de António Costa. 

Há muito tempo que o ministro  não tem condições para o ser, aliás desde há um ano, quando esta questão de Tancos surgiu. De resto, o CDS já há um ano tinha pedido a demissão da então ministra da Administração Interna e do ministro da Defesa. Infelizmente os factos vieram-nos dar razão. Tivemos a demissão da ministra da Administração Interna, mas mantemos aquilo que dissemos há um ano sobre o ministro da Defesa.  Estamos adiar aquilo que é cada vez mais inadiável que é a demissão do senhor ministro da Defesa.

A líder do CDS não voltou a falar sobre essa matéria…

Não voltou a falar porque, naturalmente, está a aguardar, mas não mudou de opinião. Agora… as demissões cabem ao senhor primeiro-ministro. Aceitou a demissão tarde e a más horas da ministra da Administração Interna. Na minha opinião, é o que vai acontecer, tarde e a más horas, em relação ao ministro da Defesa, mais dia, menos dia, Isto parece-me evidente e claro.

O Chefe de Estado Maior do Exército, Rovisco Duarte,  também já deveria ter saído?

Vamos ouvir as explicações no Parlamento.

O Presidente da República tem procedido da forma mais correta? O CDS revê-se inteiramente na atuação do Presidente da República nesta matéria?

Pelo menos nas preocupações públicas que tem demonstrado, sim.