Robles, o prédio em Alfama e outros imóveis

O vereador do BE que fez cavalo de batalha da especulação imobiliária e do arrendamento local tem vários imóveis para rendimento, como resulta da sua declaração ao TC, que o SOL consultou.

Afinal, além do prédio em Alfama, Ricardo Robles tem outros dois apartamentos em Lisboa. Um deles, que fica na zona do Saldanha, foi adquirido pelo vereador do Bloco de Esquerda nos últimos meses e é a sua nova morada. 
Trata-se de um apartamento de 85 m2 com cinco divisões, na Avenida Praia da Vitória (zona nobre de Lisboa) cujo valor patrimonial  é de 65.700 euros. No entanto, ao contrário do que acontece com os restantes imóveis declarados por Ricardo Robles, não é declarado ao TC qualquer empréstimo para a compra do apartamento. 

Este imóvel, aliás, foi a razão para que Ricardo Robles tivesse de entregar ao Tribunal Constitucional uma correção à sua declaração de rendimentos. A lei em vigor dita que todos os políticos em funções entreguem a sua declaração de rendimentos no início e no fim dos seus mandatos. Mas se a meio do mandato se verificar uma alteração aos rendimentos acima de 50 salários mínimos, os políticos têm de entregar ao TC uma correção da declaração.  

A data do documento – consultadona sexta-feira pelo SOL – é de 2 de maio de 2018 e deu entrada nos serviços do TC a 28 de junho, pelo que a declaração ainda não foi fiscalizada. Ou seja, o TC pode vir a pedir mais esclarecimentos ao vereador do BE na Câmara de Lisboa, com o pelouro da Educação e dos Direitos Sociais.

O outro apartamento de Robles é na Rua do Conde Redondo, onde morava o vereador. O apartamento tem cinco divisões e o valor patrimonial, em 2014, era de 69.697,43 euros, não tendo havido nova avaliação do imóvel. Na altura, para adquirir este apartamento, Robles contraiu um crédito à habitação no valor de 117 mil euros no Santander Totta, que vence em 2034. De acordo com a declaração entregue no TC em novembro de 2017, por este empréstimo Robles paga mensalmente ao banco 310,65 euros estando ainda em dívida 60.472,91 euros. 

Além deste empréstimo, Robles  contraiu ainda outro crédito, em 2016, na Caixa Geral de Depósitos no valor de 500 mil euros para comprar o prédio em Alfama, que gerou polémica. Mas, a declaração não especifica se foi apenas em nome de Ricardo Robles ou se foi em conjunto com a sua irmã, Lígia Robles, que é também proprietária do imóvel.

Deste empréstimo, que vence em 2041, Ricardo Robles só utilizou 447 mil euros e paga mensalmente 1.102,82 euros, estando ainda em dívida 282 prestações de um total de 300 mensalidades.

Apesar de ter a seu cargo dois empréstimos que totalizam  mensalidade cerca de 1400 euros, Robles declarou apenas rendimentos  brutos anuais de 6.074,22 euros como trabalhador dependente, a que acrescem 9.978,71 euros como trabalhador independente. Em rendimentos prediais Robles aufere ainda 5.079,12 euros anuais. Contas feitas, são 21.132,05 euros por ano que, divididos por 12 meses, não dão mais que 1.761 euros brutos.                 
    
O prédio da polémica

Na Rua Terreiro do Trigo, um prédio azul claro, perto do Museu do Fado, salta à vista de por quem lá passa. Mas o que mais sobressai é o seu aspeto renovado que não combina com o resto dos pequenos prédios que os lisboetas estão habituados a ver nas ruelas de Alfama. 

É exatamente este o prédio que pertence a Ricardo Robles, que tem sido um grande crítico do despejo de inquilinos e da especulação imobiliária na zona de Lisboa, acusando a Câmara de se ter tornado «promotora de especulação imobiliária».

A polémica em torno do bloquista rebentou ontem, quando o Jornal Económico noticiou que Robles, juntamente com a sua irmã, tinha comprado o prédio por 347 mil euros à Segurança Social e, posteriormente, o tinham colocado à venda por 5,7 milhões de euros. O vereador do BE veio a público dizer que a venda não se realizou e que o imóvel apenas esteve no mercado durante seis meses. Caso a venda se tivesse concretizado, os irmãos poderiam vir a receber uma mais-valia de cerca de quatro milhões de euros. «Não há nada de reprovável» na sua conduta relativamente à venda do imóvel, adiantou Robles em conferência de imprensa, dizendo que a sua posição perante a venda do imóvel em nada contraria as posições políticas que defende e que o prédio foi colocado no mercado por «razões familiares».

Ao SOL, no local, comerciantes disseram que apenas uma senhora se encontra a morar no prédio de Robles, estando o resto dos andares desabitados.

Durante o dia de sexta, o PSD emitiu um comunicado a exigir a demissão do bloquista: «O PSD Lisboa exige a demissão do vereador Ricardo Robles por manifestar falta de ética, de seriedade e de credibilidade política para permanecer no cargo de vereador na cidade de Lisboa».  À exigência de demissão do PSD, o vereador revelou, em conferência de impressa, que o pedido do PSD não «tem qualquer base e apenas contribui para intoxicar a opinião pública».

Crítico do carrossel da especulação imobiliária, nos últimos tempos, Robles votou contra dois grandes projetos de habitação: o plano urbanístico apresentado pela autarquia de Lisboa sobre os terrenos da antiga Feira Popular e a votação para colocar Manuel Salgado à frente da SRU.

A história do imóvel de Robles

O prédio de Alfama pertencia à Segurança Social, antes de ser comprado pelo vereador.  Em 2014, é colocado à venda, através de um leilão, tendo sido comprado por Robles e a irmã, Lígia Robles, com ajuda familiar e dois empréstimos, um da Caixa Geral de Depósitos e outro do Montepio (que não surge na declaração do TC), escreve o Jornal Económico.

No ano da compra, como o edifício se encontrava em más condições, a câmara mandou o bloquista fazer obras. As licenças para as obras avançarem são aprovadas em 2015 e ficam concluídas em março de 2016. No total, a reconstrução do imóvel terá custado cerca de 650 mil euros.

Na altura, moravam cinco inquilinos no prédio, mas apenas um casal aceitou fazer um novo contrato de arrendamento – ficando a pagar 170 euros de renda mensal com um contrato de oito anos. Outros três inquilinos, que tinham lojas no imóvel acordaram em sair. Já o dono de um restaurante  colocou os irmãos Robles em tribunal, exigindo uma indemnização de 120 mil euros por causa das obras que fez ao longo do tempo, depois de os proprietários se terem oferecido para pagar cinco mil euros.

Há uns meses, «por razões familiares», Ricardo Robles e a irmã decidiram vender o prédio.  Ontem, aos jornalistas, o bloquista disse que não iria vender a sua parte e que a iria alugar. A imobiliária encarregue da venda avaliou a propriedade em 5,7 milhões de euros. 

Numa nota enviada aos órgãos de comunicação social, o vereador do BE esclarece que «o valor noticiado resulta de uma avaliação efetuada por uma agência imobiliária. Ou seja: o imóvel não foi vendido nem está à venda neste momento».

O documento diz ainda que «nenhum morador saiu da sua habitação», sendo que «a ideia de que ‘a maior parte dos inquilinos saiu’, plasmada na primeira página do jornal, surge descontextualizada e é, por isso, enganadora».