Robles ao SOL: ‘Não informei o Bloco da intenção de vender o prédio’

Nas obras do prédio de Alfama, a Câmara detetou várias infrações. Robles contestou e até agora não teve de pagar nada. Esta semana ficou a saber-se que teve benefícios fiscais e no financiamento. E que escondeu a venda do BE.

O vereador cessante do Bloco de Esquerda na Câmara de Lisboa, Ricardo Robles, confirmou ao SOL que não avisou o partido da intenção de colocar o prédio em Alfama à venda em 2017. «Não informei», respondeu por e-mail o ex-autarca que renunciou ao cargo na passada segunda-feira, três dias depois de se saber da intenção de venda do imóvel, avaliado em 5,7 milhões de euros.

Ricardo Robles é coproprietário de um prédio em Alfama, comprado em leilão à Segurança Social em 2014. O prédio foi reabilitado depois de uma notificação da Câmara de Lisboa e acabou por integrar a lista de anúncios de uma imobiliária de luxo com a referência «short rental». Tratava-se de uma publicidade para investidores também interessados no alojamento local. O problema é que o autarca sempre se bateu contra a especulação imobiliária e o risco de gentrificação. Terá informado a direção do BE de que possuía o imóvel, conforme avançou a revista Sábado, mas não explicou que tencionava vendê-lo, mesmo que fosse a pedido da irmã, Lígia Robles.

Na primeira reação, Robles sustentou que não cometeu  nenhuma ilegalidade e prometeu que iria colocar a sua parte do imóvel no mercado de arrendamento. Mantém a intenção, mas também não explica porque razão nada disse ao BE sobre a intenção de o vender. Essa pergunta ficou por esclarecer no e-mail enviado. O partido dá o caso como «encerrado», conforme disse ao jornal i o deputado Pedro Soares. 

 

Licença condicionada 

Documentação a que o SOL teve acesso mostra que o processo inicial de licenciamento de obra e utilização concedidos pela autarquia teve uma aprovação condicionada, obrigando Ricardo Robles a pedir a intervenção da Direção-Geral de Património e Cultura por se tratar de uma zona histórica  e por  integrar um troço da Muralha Fernandina, considerado monumento nacional. 

 A DGPC garante ao SOL que fez o acompanhamento de todo o processo entre 1 de julho de 2015 até 12 de janeiro de 2017 e que foram aceites as medidas de intervenção e aprovado «aditamento ao PATA (Pedido de Autorização de Trabalhos Arqueológicos)». Mas a direção-geral de património não divulgou o teor do parecer favorável. Segundo Ricardo Robles foi dada luz verde. «Sim. A licença de obra e a licença de utilização estavam condicionadas a parecer da DGPC. Ambas as licenças estão emitidas porque foram cumpridas todas as regras».

No processo constam também irregularidades detetadas durante as obras. As infrações foram registadas pela Câmara Municipal de Lisboa e estavam relacionadas com a falta de manutenção das redes de proteção dos andaimes, ocupação desconforme da via pública e alvará fora de prazo. 

Questionado sobre se tais infrações tinham tido alguma consequência, o autarca demissionário reconheceu terem existido «desconformidades» e acrescentou que recebeu um ofício da Câmara de Lisboa com data de 9 de abril de 2018, referente a uma fiscalização de 28 de outubro de 2016. 

«Tinha 15 dias para alegar o que tivesse por conveniente, o que fiz. Aguardo resposta por parte da CML», explicou ao SOL.

 

Benefícios fiscais

Ricardo Robles solicitou a redução/isenção da taxa TRIU – taxa pela realização, manutenção e reforço das infraestruturas urbanísticas – por dois motivos, um deles era a «utilização de mecanismo de aproveitamento de energias alternativas», neste caso a colocação de coletores solares. Mas tal não avançou, como explicou ontem ao SOL Ricardo Robles, sem revelar se acabou por beneficiar desta redução/isenção.

 «Inicialmente foi ponderada a possibilidade de instalação de coletores solares. A complexidade técnica da instalação e a dificuldade de integração arquitetónica fizeram com que essa possibilidade fosse abandonada, justificada legalmente ao abrigo do DL 53/2014», afirmou.

Ontem, o Jornal Económico, que revelou a história do prédio de Alfama de Ricardo Robles, avançou que o vereador cessante beneficiou de um programa de financiamento da autarquia e do Montepio para reabilitação urbana com condições mais favoráveis – o Re-9. 

Segundo o jornal, o empréstimo de 329 mil euros, a 20 anos, foi contraído antes do da Caixa Geral de Depósitos, de 400 mil euros. A declaração de rendimentos que Ricardo Robles entregou no Tribunal Constitucional no final do ano passado ia acompanhada por vários documentos, entre os quais um da Caixa Geral de Depósitos relativo a este crédito. Nesse comprovativo bancário ficava claro que, quando contraiu o empréstimo, Robles e a irmã já tinham a intenção de o colocar a render. «Tipo de crédito: habitação. Finalidade: obras em imóvel para rendimento», pode ler-se.