Tancos é uma vergonha nacional

Há mais de um ano que foi roubado material de guerra, a incerteza sobre o que desapareceu permanece e não foram identificados responsáveis nem assumidas responsabilidades ou consequências

Após mais de um ano, Tancos continua sem explicação, sem responsabilização e sem consequências. Trata-se de uma situação insustentável e inadmissível que envergonha o país.

Todo o processo em torno do roubo de material de guerra ocorrido nos paióis nacionais de Tancos e que foi conhecido em junho do ano passado constitui um caso muito grave na autoridade e confiança no Estado, continuando, após mais de um ano, sem esclarecimentos, sem responsáveis, sem consequências ou, sequer, certezas. Uma falha do Estado que coloca em dúvida a segurança nacional e cuja gravidade aumenta pelo facto de ter ocorrido numa instituição que é um pilar da segurança e soberania nacionais.

No final de junho de 2017 o exército revelou o roubo de material de guerra dos paióis nacionais (sem que se saiba há quanto tempo tinha desaparecido). Tal circunstância causou um justificado alarme social pela incerteza do material em questão e pelas consequências que o seu uso criminoso poderiam implicar.

A situação requeria uma intervenção imediata e conclusiva para repor a confiança e serenidade públicas. Infelizmente assistiu-se a uma sucessão de episódios entre o lamentável, o inverosímil e o quase cómico (apenas desadequado face à gravidade da situação). Após mais de um ano a situação continua por resolver.

A intrusão não detetada no perímetro militar com a sensibilidade de armazenar relevante material de guerra é, por si só, a primeira das situações graves. É inadmissível a fragilidade da segurança daquele tipo de instalações. Tal circunstância tornou-se ainda mais grave quando foi admitido o conhecimento desta fragilidade sem que nada de efetivo tivesse sido feito em tempo útil. Responsáveis? Consequências? Nada! A não ser o tradicional ‘casa arrombada – trancas à porta’.

Após o roubo de Tancos verificaram-se várias declarações de responsáveis militares e políticos que primaram pela precipitação e irresponsabilidade, algumas quase patéticas, com o objetivo de repor alguma tranquilidade. Primeiro era material obsoleto, depois a triste afirmação de que até poderia não ter sido nada roubado (ministro dixit), por fim a incerteza sobre o material que desapareceu. Entretanto a possibilidade de ter havido autoria ou cumplicidade de militares no roubo. Toda a sorte de declarações irresponsáveis se têm observado.

Em outubro foi misteriosamente encontrado na Chamusca ‘o’ material de guerra roubado em Tancos. Mas verdadeiramente surreal foi o facto de o material encontrado ser superior ao que tinha sido roubado. Ou seja, havia (há?) mais material de guerra com paradeiro desconhecido sem que, aparentemente, alguém tivesse notado a sua falta. Mais recentemente assistiu-se à contradição entre afirmações de responsáveis militares e políticos de que todo o material tinha sido recuperado, a revelação de que a investigação tinha identificado material que permanecia desaparecido e os mesmos responsáveis militares a darem o dito pelo não dito.

Entretanto, decorre um atribulado processo de investigação que envolve o ministério público, a polícia judiciária e a polícia judiciária militar com episódios de descoordenação, listas do material roubado que não coincidem e que tarda, mais do que é admissível, em chegar a conclusões que permitam esclarecer o que sucedeu.

Em suma, há mais de um ano que foi roubado material de guerra, a incerteza sobre o que desapareceu permanece e não foram identificados responsáveis nem assumidas responsabilidades ou consequências.

O roubo em Tancos revelou um Estado frágil e alguns responsáveis políticos e militares têm revelado não estar à altura das suas responsabilidades, contribuindo para fragilizar o prestígio da Instituição Militar e a confiança nas Forças Armadas.